Chile

Aa
$.-
CHILE A liberdade de informação e de opinião enfrenta horas incertas pelo fato de que o Congresso Nacional estuda urna nova e mais complexa lei de imprensa, cujo conteúdo preocupa os proprietários e editores de meios de comunicação, assim corno jornalistas e a opinião pública em geral. Atualmente, o projeto de lei de imprensa que foi enviado ao Congresso pelo Governo em 1993, está na Comissão de Constituição, Legislação e Justiça do Senado, em segundo trâmite legislativo. Diversos fatos permitem afirmar, sem dúvida alguma, que subsistem vários perigos para a liberdade de expressão. Um deles é a intervenção do senador Miguel Otero, que preside a comissão senatorial e que colocou o terna de incorporar ao projeto em discussão o delito de difamação que, diz-se, aparece, mesmo sem ser mencionado, na Constituição de 1980 ao assinalar que na imputação de um fato ou ato falso, o que causa injustificadamente dano ou descrédito a urna pessoa, será considerada um delito e terá a sanção que determine a lei". Os meios de comunicação pronunciaram-se dura e unanimente contra esta possível disposição, assim corno autoridades governamentais e parlamentares, tanto que seu próprio autor voltou atrás e assinalou que o seu foi somente um documento de trabalho para que seja discutido no Senado, que ele não considerou incorporar o delito de difamação ao texto do projeto e que, inclusive, votaria contra se chegasse a ser incluído, ratificando seu interesse em que se estabeleça a indenização civil por danos morais. Recentemente o senador institucional Sergio Fernández apresentou um projeto que, simples e diretamente, abole a ambígua disposição constitucional que contempla o delito de difamação, sobre a qual se tinha levantado a tão recusada idéia do senador Otero. Outras das ameaças do projeto é a manutenção da disposição segundo a qual os jornalistas universitários formados serão aqueles que poderão "preferencialmente" exercer a profissão de jornalista. O Colégio de Jornalistas pretendeu estabelecer o direito exclusivo da prática profissional para os jornalistas formados. Entretanto, no projeto original estabeleceu-se a função preferencial, que foi aprovada pela Câmara de Deputados. Parlamentares oposicionistas e alguns da esfera oficial estimam que esta disposição vulnera a Constituição, que garante a todos os chilenos a liberdade de trabalho e reconhece a liberdade de informar e de opinar. Ainda que tenha sido declarada inconstitucional a pretensão de constituir ao Estado a garantia do pluralismo informativo, continuam os empenhos em tal sentido. A Comissão de Constituição, Legislação e Justiça do Senado aprovou destinar recursos, através da Lei de Orçamentos, para que um organismo especial comece a estudar sobre o pluralismo no sistema informativo, o que constitui uma variante perigosa do texto já recusado pelo Tribunal Constitucional. A Comissão do Senado - por três votos contra dois - eliminou a faculdade dos juízes proibirem, sem limite de tempo, a informação ao público sobre processos que conheçam. Este tem sido um recurso bastante utilizado pelos tribunais, sendo o caso mais dramático o que se produziu pelo assassinato do jornalistaJosé Carrasco Tapia, onde se manteve uma proibição de informar desde 1991 até há algumas semanas, e que foi levantada depois de uma intensa campanha dos meios de comunicação e do Colégio de Jornalistas. Ainda que a Comissão tenha eliminado esta faculdade, o perigo subsiste. O senador socialista Carlos Ominami, junto a parlamentares de outras tendências políticas, está redigindo urna indicação para limitar, "de uma maneira razoável", as faculdades dos juízes para estabelecer a proibição de informar. Uma situação semelhante, de perigo latente, vive-se com relação à propriedade dos meios de comunicação e sua participação no mercado de vendas. O Tribunal declarou inconstitucional a tentativa de fixar cotas de propriedade e de participação de mercado aos meios informativos. Entretanto, senadores socialistas, também segundo declarações de Carlos Ominami, querem incorporar no Senado "regulamentações razoáveis" quanto a esta concentração de propriedade e a participação de mercado, tudo expresso de maneira vaga, o que a torna ainda mals perigosa. Aqueles que defendem estas regulamentações dizem fazê-lo para evitar os monopólios. Entretanto, esquecem que a situação do Chile é exemplar em matéria de número de meios de comunicação e de ausência de travas para criá-los: cinco cadeias de televisão a cabo, mais de 550 estações de rádio, 45 jornais e 15 revistas de informação geral. Finalmente, cabe assinalar que na discussão parlamentar da nova lei, a Câmara de Deputados não somente aumentou as multas, mas também agregou numerosas penas para privação de liberdade, o que implica também em uma ameaça para a livre expressão, assim como uma flagrante desfiguração do projeto original inicialmente acordado entre o Governo, as associações de imprensa e de rádio e o Colégio de Jornalistas. No momento de redigir este informe, a Comissão de Constituição, Legislação e Justiça do Senado já havia aprovado vinte entre mais de 60 artigos do projeto. É muito difícil prognosticar quando poderia terminar o trâmite legislativo. Mais difícil é prever quantas ameaças atualmente latentes serão aprovadas em definitivo. Deve-se ressaltar que, se algumas delas forem sancionadas pelo Congresso, o Executivo pode considerar um veto presidencial, o qual já foi insinuado em privado por altas autoridades do governo. Em resumo, a Lei de Abusos de Publicidade, o Código Penal, o Código de Justiça Militar, a Lei de Segurança do Estado e a própria Constituição Politica do Estado contêm disposições restritivas e limitações à liberdade de imprensa. A estes, soma-se a lei número 19.423, sobre respeito e proteção da vida pública e privada. Atá agora, a prudência de legisladores e juízes impediu a ativação desta norma. Neste país existem, além disso, um excesso de leis que limitam e ameaçam a liberdade de imprensa. Lei número 16.643, de Abusos de Publicidade . Data de 1967, com múltiplas modificações feitas com objetivos restritivos durante o regime militar, eliminados em boa parte pela lei 19.048 de 13 de fevereiro de 1991, um ano depois do restabelecimento da democracia. Mas é igualmente drástica quanto aos delitos de injúria e calúnia, o direito de resposta e outros aspectos. Além disso, consagra a faculdade dos tribunais de justiça de estabelecer a proibição de informar sobre determinados julgamentos, sem limite de prazo, quando o juiz achar que tal difusão pode atrapalhar o êxito da investigação. Esta legislação, mesmo depois da última reforma, continua sendo demasiado ampla e penalizadora em suas atribuições, considerações que o Governo levou em conta para enviar ao Congresso em 1993 um projeto de nova legislação, que hoje está em trâmite parlamentar. Código Penal. Nos artigos 416 ao 422 há referência aos delitos de calúnia e injúria. Estabelece: "É calúnia a imputação de um delito determinado, mas falso. É injúria toda expressão proferida ou ação executada em desonra, descrédito ou menosprezo de outra pessoa". Para os dois delitos estabelece penas de reclusão menor, em diferentes graus, e multas, quando são cometidos por escrito e com publicidade. Código de Justiça Militar . O artigo 274 refere-se ao delito de perturbação da ordem pública e o número 284 às ofensas ou injúrias às instituições armadas ou a suas autoridades. Fixa penas de prisão e multas. Precisamente, em virtude da faculdade que ainda têm os tribunais de submeter a processo os jornalistas, está em vigor uma ordem de detenção contra o profissional Manuel Cabieses, diretor da revista Punto Final., por pressuposta incitação à perturbação da ordem. Lei número 19.297, de Segurança do Estado . Contém disposições amplas e compulsivas, dirigidas a quem cometa delitos contra a segurança interior do Estado. Mas a definição dos mesmos é tão ampla que permite ser utilizada como uma ferramenta eficaz contra a liberdade de imprensa. O exemplo mais claro ocorre no Artigo sexto. Assinala que cometem delitos contra a ordem pública todos os que difamem, injuriem ou caluniem o Presidente da República e as principais autoridades do país. Esta lei também castiga os proprietários e diretores de meios e os autores de urna publicação que seja considerada delituosa contra a segurança do Estado. Lei número 19.423, de 1995 . Modificou o Código Penal, no que se refere a delitos contra o respeito e proteção à vida privada e pública da pessoa e sua família. Castiga com reclusão e multa aquele que, em recintos particulares ou lugares que não sejam de livre acesso ao público, sem autorização do afetado e por qualquer meio, capte, grave ou difunda fatos, conversas ou documentos, correspondentes a lugares restritivos. Sua amplitude é um perigo tão sério e grave contra a liberdade de expressão, que até seu próprio autor - o senador direitista Miguel Otero - e outros parlamentares anunciaram sua intenção de reformá-Ia, excetuando a imprensa de suas disposições. Outros fatos que violentaram a liberdade de imprensa neste período são: Março. O jornalista Patricio Amigo, do canal de televisão Megavisión, foi agredido por indivíduos que disseram ser dos serviços de segurança da Direção de Aeronáutica Civil, quando realizava uma reportagem no interior do aeroporto internacional de Santiago. Abril. A autoridade de investigação Alfredo Pfeiffer, que investiga o crime do senador Jaime Guzmán, ocorrido em 1991, decreta a proibição de informar depois de se reabrir a causa. A proibição foi levantada depois de algumas semanas. Junho/Julho. A seleção chilena de futebol boicota trabalho de jornalistas especializados por considerar que críticas da imprensa eram injustificadas. Setembro. Durante manifestações de rua, desconhecidos apedrejam veículo da Televisión Nacional , resultando feridos os jornalistas Mario Aguilera e Verónica Flores. Também durante manifestações de rua, desconhecidos agridem os jornalistas Cristián Riffo e Ricardo Rojas do diário La Tercera .. Jornalistas de La Tercera se veêm impedidos de realizar suas funções por pessoal da polícia uniformizada durante uma explosão ocorrida em uma indústria da capital. A câmara fotográfica é requisitada pelos Carabineros e o rolo velado pelo proprietário da empresa onde a explosão se produziu. Um grupo de Carabineros invade os escritórios da revista Punto Final e exibe uma ordem de detenção contra o diretor, o jornalista Manuel Cabieses, que é também conselheiro nacional do Colégio de Jornalistas. A ordem de detenção emanou de um tribunal militar por um processo contra Cabieses, acusado de incitação a perturbação da ordem depois de publicar uma reportagem referente ao comandante em chefe, fato ocorrido em setembro de 1991. Sem esclarecimento continua o desaparecimento do jornalista Guillermo Gálvez, ocorrido em 1973 e documentado na recompilação de casos de detidos-desaparecidos pela Comissão da Verdade e Reconciliação.

Compartilhar

0