Registrou-se um preocupante crescimento do cerceamento judicial à imprensa durante este período, assim como agressões contra jornalistas e meios de comunicação, especialmente durante o processo das eleições municipais programadas para outubro. Continuam a preocupar as agressões, ameaças e intimidações estigmatizantes nas redes sociais contra mulheres jornalistas. Também os incidentes causados pelo autoritarismo ou pela falta de preparação de funcionários públicos.
O Supremo Tribunal Federal (STF) tem um histórico de decisões favoráveis a esses dois direitos constitucionais. No entanto, o ministro do STF Alexandre de Moraes suspendeu, em 30 de agosto, a rede social X (antigo Twitter), proibindo o acesso, inclusive por meio de VPN (rede privada virtual), e impôs uma multa diária de R$ 50.000 a qualquer pessoa ou empresa que se conectasse à plataforma. A determinação do magistrado, uma reação a repetidos descumprimentos legais (ordens de bloqueio de perfis), à falta de um representante da empresa no país e ao não pagamento de multas no valor de quase R$ 20 milhões, impactou negativamente o trabalho dos jornalistas.
A Associação Nacional de Jornais (ANJ) expressou sua "profunda preocupação" com as restrições ao trabalho da imprensa após a proibição do STF, que inviabiliza e ameaça com multas os meios de comunicação e profissionais que, "pela natureza de sua missão, precisam monitorar o que ocorre dentro da plataforma". A entidade ressaltou ter recebido uma série de relatos de meios de comunicação e jornalistas que já não têm acesso a opiniões, relatos e pensamentos de diversas fontes de notícias, tanto dentro como fora do país.
Em outro caso, em 2023, determinou-se que os veículos de comunicação podem ser responsabilizados por injúrias, difamações ou calúnias proferidas por um entrevistado. Em 8 de março, o STF publicou o acordo com o texto final da Tese Jurídica aprovada pela Corte. Segundo as principais entidades defensoras das liberdades de imprensa e de expressão do país, entre elas a ANJ, amicus curiae no caso original — julgamento do Recurso Extraordinário (RE 1075412) da denúncia do ex-deputado federal Ricardo Zarattini, já falecido, contra o Diário de Pernambuco —, o agora Tema de Repercussão Geral 995 afeta a liberdade de imprensa. Pode levar a um estado crescente de autocensura e a uma maior restrição da divulgação de conteúdos jornalísticos de interesse público, sem mencionar a possibilidade de eliminação de textos, vídeos e fotos produzidos pelo jornalismo profissional brasileiro.
Em 15 de abril, a ANJ solicitou uma modificação na Tese, para que os meios de comunicação sejam responsáveis apenas quando não houver dúvida sobre a falsidade da informação e se comprovar a má-fé do meio na publicação da acusação.
Em agosto, o plenário do STF começou a analisar as manifestações das partes e, posteriormente, o ministro Fachin, relator do caso, apresentou uma nova redação para o Tema 995, considerada positiva pelas entidades brasileiras ligadas ao jornalismo. Segundo ele, a responsabilidade da imprensa deve ocorrer em casos de negligência, e concluiu que o meio de comunicação não deve ser sancionado por acusações falsas feitas durante entrevistas ao vivo.
Uma terceira situação de assédio judicial que havia restringido a imprensa por muito tempo teve um desfecho positivo. Em 22 de maio, o plenário do STF reconheceu como assédio judicial a apresentação de numerosas ações simultâneas sobre os mesmos fatos, em diferentes lugares, com o objetivo de coagir jornalistas ou órgãos de imprensa e dificultar ou encarecer sua defesa. Para o tribunal, essa prática é abusiva e compromete a liberdade de expressão.
O plenário do STF concluiu que "constitui assédio judicial, comprometedor da liberdade de expressão, a apresentação de inúmeras ações sobre os mesmos fatos, em diferentes jurisdições, com o propósito ou efeito de coagir um jornalista ou um meio de comunicação, dificultar sua defesa ou torná-la excessivamente onerosa". Os magistrados também reafirmaram que a responsabilidade dos jornalistas ou meios de comunicação só ocorre em caso de dolo inequívoco ou negligência grave.
O STF esteve envolvido em outros casos de censura judicial. Em 22 de agosto, o ministro Alexandre de Moraes proibiu o ex-assessor da Presidência da República, Filipe Garcia Martins, de dar uma entrevista ao jornal Folha de S.Paulo. Suspeito de ter participado de um complô golpista liderado pelo ex-presidente Jair Bolsonaro, Martins esteve preso por seis meses sob o argumento de que poderia fugir do país.
Moraes alegou que a reportagem violaria uma das condições impostas para a liberação de Martins, que estipula que ele não deve se comunicar com outros investigados na suposta trama golpista, como Bolsonaro, os ex-ministros Walter Braga Netto e Augusto Heleno, e o ex-comandante da Marinha Almir Garnier.
Também por decisão do ministro Moraes, em 18 de junho, o STF ordenou a retirada de dois vídeos e dois artigos jornalísticos que continham declarações de Jullyene Lins, ex-esposa do presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), nas quais ela afirmava ter sido agredida pelo parlamentar. A medida respondia a um pedido da defesa de Lira e incluía um vídeo de uma entrevista com Jullyene realizada pela Folha de S.Paulo em 2021, outro da Mídia Ninja, uma reportagem do portal Terra e outra do Brasil de Fato sobre o caso. No entanto, no dia seguinte, Moraes revogou a sentença.
Nos tribunais de primeira instância, o Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) condenou, em 6 de junho, o jornalista Luan Araújo por difamação, após ele publicar um artigo na internet com críticas à deputada Carla Zambelli (PL-SP), segundo o acompanhamento realizado pela ABERT. Pouco antes das eleições de 2022, Zambelli perseguiu o jornalista com uma arma em punho em São Paulo (SP). Após o episódio, Araújo publicou no DCM (Diário do Centro do Mundo) um texto em que afirmava que a deputada "segue cometendo atrocidades após atrocidades". A pena de oito meses de prisão foi convertida em serviços comunitários.
Em 5 de junho, o Juizado Civil nº 1 da Comarca de Brusque (SC) censurou o site Metrópoles e ordenou a eliminação de uma reportagem da coluna que revelava, em agosto de 2022, mensagens trocadas em um grupo de WhatsApp por empresários bolsonaristas que defendiam um golpe de Estado em caso de derrota de Jair Bolsonaro nas eleições daquele ano, e que atacavam diversas instituições.
O primeiro relatório da Coalizão em Defesa do Jornalismo (CDJor), baseado nas duas primeiras semanas da campanha eleitoral e no monitoramento das redes sociais, mostra "um quadro de difusão e banalização de ataques a jornalistas e meios de comunicação em todo o país".
Também foram registradas agressões presenciais. Em 1º de setembro, Marçal (PRTB) atacou o jornalista da TV Gazeta/UOL, Josias de Souza, e a imprensa durante um debate promovido pela Gazeta/MyNews.
As práticas de desvalorização da imprensa já eram vistas antes das eleições. Na cobertura feita pelo jornalismo profissional sobre os impactos das inundações de maio no Rio Grande do Sul, as hostilidades foram acompanhadas por uma grande quantidade de desinformação propagada nas redes sociais. A Rede Globo, que deslocou vários de seus profissionais para o estado, foi o principal alvo.
Em 8 de maio, o repórter Arildo Palermo, da RBS, afiliada da TV Globo no Rio Grande do Sul, foi hostilizado por um homem enquanto realizava uma transmissão ao vivo sobre as inundações no estado.
O jornalista William Bonner, do Jornal Nacional, da TV Globo, também foi hostilizado enquanto gravava um anúncio. O agressor questionou o atraso da emissora em chegar ao estado. "Por que vocês não estavam conosco neste resgate?", disse o homem, gravando a cena. Mais adiante, o agressor gritou: "A Globo estava transmitindo Madonna enquanto os gaúchos estavam debaixo d'água, Canoas estava debaixo d'água, pessoas morreram. Vergonha da Globo, vergonha de vocês."
Também, de acordo com o Poder360, durante uma entrevista ao vivo na CNN, em 9 de maio, um homem usando um colete de voluntário de resgate gritou "Globo lixo" e "Fora Lula". A emissora estava cobrindo as buscas por sobreviventes na cidade de Canoas quando o repórter Pedro Teixeira foi surpreendido pelos gritos.
O jornal Correio Braziliense informou que o jornalista Eduardo Paganella, da RBS, foi hostilizado ao vivo enquanto mostrava um abrigo montado para receber animais resgatados.
O Coletiva.net, especializado em comunicação, informou que o Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Rio Grande do Sul (Sindjors) recebeu pelo menos oito relatos de profissionais que foram hostilizados durante seu trabalho na cobertura das inundações.
Além disso, segundo o Coletiva.net, meses depois, no contexto da recuperação do Rio Grande do Sul após os danos causados pelas inundações, os ataques à imprensa continuaram. Em 3 de julho, a jornalista Maria Eduarda Romagna, da Band-RS, foi hostilizada pelo público enquanto cobria um evento oficial do governo federal no Mercado Público de Porto Alegre.
No contexto das eleições municipais, em 29 de agosto, em Manaus (AM), foi registrado um episódio de agressão física contra o repórter Adriano Santos, do Radar Amazônia. O jornalista tentava questionar o prefeito da cidade, David Almeida (Avante), sobre um possível delito eleitoral cometido no local, quando foi agredido por seu segurança.
Em 9 de setembro, segundo a CDJor, uma equipe da TV Norte Amazonas – SBT Manaus, composta pelo repórter Gabriel de Abreu Lima e o cinegrafista Alan Glesseir, foi hostilizada e ameaçada pelos seguranças da candidata à reeleição, Patrícia Lopes, no município de Presidente Figueiredo (AM).
Os abusos autoritários atingiram seu extremo em Mato Grosso. Desde 2021, o governador Mauro Mendes (União) iniciou investigações policiais ou ações judiciais contra 18 jornalistas que produziram reportagens críticas sobre seu governo. As inúmeras investigações chegaram ao ponto de a Polícia Civil de Mato Grosso criar a Operação Fake News para investigar uma suposta rede de disseminação de informações falsas contra a gestão de Mendes. Em uma das fases da investigação, três jornalistas que reproduziram conteúdos críticos ao governo foram considerados suspeitos de crimes de calúnia agravada, perseguição e associação criminosa. Os profissionais tiveram seus equipamentos confiscados por agentes, e suas defesas recorreram ao STF alegando violação constitucional do direito ao sigilo da fonte jornalística.
O governo nega perseguição e afirma que está apenas exercendo seu direito de "processar quem mentiu".
No início deste ano, entidades representativas de jornalistas denunciaram às autoridades federais a existência de uma suposta "polícia paralela" do governo de Mato Grosso que perseguia os jornalistas. Após as denúncias, a Secretaria Nacional de Justiça (Senajus) do Ministério da Justiça e Segurança Pública criou uma comissão para acompanhar os casos e elaborar um relatório. No STF, a ministra Cármen Lúcia suspendeu, por meio de uma liminar, a Operação Fake News.
As agressões a mulheres jornalistas são outra vertente recorrente de violência contra a imprensa no Brasil. Segundo um monitoramento da ABERT, em 24 de agosto, a repórter Alinne Fanelli, da BandNews FM, foi vítima de machismo por parte do treinador do Palmeiras, Abel Ferreira, durante uma coletiva de imprensa no estádio Brinco de Ouro, em Campinas (SP).
Em 8 de julho, a repórter Isadora Aires, da CNN Brasil, foi hostilizada durante a cobertura da Conferência de Ação Política Conservadora (CPAC), em Balneário Camboriú (SC). A profissional se preparava para uma transmissão ao vivo, no Centro de Convenções, quando foi cercada pelos participantes do evento, que a intimidaram com gritos de "lixo" e "fora".