Miami (1o de junho 2011) .- O Brasil não precisa de uma nova lei de imprensa para regular a mídia. Essa foi a conclusão de vários juristas, advogados e jornalistas em resposta às tentativas do Congresso de promulgar novas leis em substituição à lei de 1967, revogada em 2009.
A opinião da maioria, que também concluiu que o direito de resposta deve ser tema de autorregulação e não imposto por leis, foi emitida em um fórum realizado pela Sociedade Interamericana de Imprensa (SIP) e a Associação Nacional de Jornais (ANJ) do Brasil na sexta-feira passada em Brasília, na sede do Supremo Tribunal Federal (STF).
O evento foi inaugurado pelo presidente do STF, Cezar Peluso, que enfatizou que “seria impossível subestimar o papel que a liberdade de imprensa desempenhou na consolidação da democracia”.
O juiz Carlos Ayres Britto, vice-presidente do STF, afirmou que a Lei de Imprensa de 1967 e a Constituição de 1988 eram incompatíveis porque a lei era restritiva por natureza e a Constituição se concentra na abertura. Disse que o aumento da liberdade de imprensa que se verifica hoje ajudou a redirecionar o Judiciário, o qual, no passado, tomou decisões constrangedoras a favor da censura.
No painel que foi moderado por Ayres Britto, chamado “Brasil depois da Lei de Imprensa”, Manuel Alceu Affonso Ferreira, advogado do jornal O Estado de S. Paulo, e o deputado federal Miro Teixeira, Rio de Janeiro, que em 2009 defendeu a abolição da Lei de Imprensa pelo STF, concordaram que não devem existir regulamentações que restrinjam a prática do jornalismo. Teixeira disse que “não precisamos de uma lei de imprensa, mas sim de uma lei que permita o acesso do público às informações”.
Esse critério de avaliação para qualquer legislação nova foi defendido por Gustavo Binenbojm, especialista em direito civil, que acrescentou que “toda lei deve ser limitada pelo que dita a Constituição – deve expandir as liberdades que ela estabelece e não restringi-las”.
Durante a cerimônia de abertura, a presidente da ANJ, Judith Brito, observou que o fórum estava sendo realizado “no local perfeito para refletir sobre o exercício da democracia, já que o Supremo Tribunal era o guardião da Constituição, da democracia e das suas liberdades”. Julio E. Muñoz, diretor executivo da SIP, explicou o significado da Declaração de Chapultepec e como ela defende a eliminação de todas as barreiras legais e judiciais que restringem a liberdade de imprensa.
O programa faz parte do Programa Chapultepec da SIP, e o fórum foi patrocinado pela MacArthur Foundation, dos Estados Unidos.
Judith Brito recordou que com a eliminação da lei de imprensa antidemocrática, o Supremo Tribunal encorajou os meios de comunicação a atuarem com autorregulação, o que motivou um painel sobre o direito de resposta. O advogado peruano e ex-“defensor do povo”, Jorge Santistevan de Noriega, disse que “não é necessário ter uma lei específica que trate do direito de resposta, já que na opinião de 1986 da Corte Interamericana de Direitos Humanos basta que o Estado tenha assinado a Convenção Americana, a qual prevê tal direito na sua seção 14, ou se este estiver incluído na Constituição nacional”.
Citando a filosofia de que “a melhor lei de imprensa é aquela que não existe”, Santistevan sugeriu que antes de se levar os casos ao tribunal, se utilize o direito de resposta de acordo com a ética jornalística, por meio de conselhos de imprensa, uso de ombudsman ou mecanismos de defesa do leitor.
Paulo Sotero, diretor para o Brasil do Woodrow Wilson International Center for Scholars, dos Estados Unidos, concordou com um mecanismo de autorregulação para aumentar a qualidade das informações e do debate público, um ponto destacado pela ministra Ellen Gracie, do STF, que acrescentou que “o jornalismo deveria ser a consciência crítica da sociedade”.
Em um outro painel sobre a jurisprudência interamericana, o jurista venezuelano Pedro Nikken examinou as opiniões e os julgamentos da Corte Interamericana de Direitos Humanos sobre liberdade de imprensa desde que o tema foi abordado pela primeira vez, em 1985, com uma opinião consultiva sobre a exigência de diploma para jornalistas.
Nikken criticou especialmente alguns países em que ainda se defende a honra dos funcionários públicos por meio da figura antiquada do desacato, explicando que as figuras públicas têm um limite menor de privacidade e devem ser submetidas a um nível maior de escrutínio.
No encerramento do fórum e após apresentações de Taís Gasparian, advogada da Folha de S. Paulo, e do advogado da ANJ, Alexandre Jobim, Paulo Camargo Tonet, coordenador de relações governamentais da ANJ, enfatizou a importância das diretrizes indicadas pelo Supremo Tribunal para a autorregulação, “sugerindo que essa é a melhor forma de solucionar os problemas relacionados com o direito de resposta”.
Participaram também do fórum o diretor de Liberdade de Imprensa, Ricardo Trotti, e a coordenadora do Projeto Chapultepec, Sally Zamudio, ambos da SIP.
Clarínrecebe prêmio
O jornal Clarín recebeu o Prêmio de Liberdade de Imprensa da ANJ. A presidente da entidade, Judith Brito, disse que o Clarín simboliza os problemas enfrentados pela imprensa na Argentina para oferecer um jornalismo independente e de qualidade, sem a interferência do governo.
Hector Magnetto, presidente do Grupo Clarín, recebeu o prêmio e citou a retaliação que sofre a mídia independente pelo governo argentino. Acrescentou que “toda democracia exige um parlamento forte, um tribunal com capacidade de emitir sentenças de forma independente e uma imprensa que seja capaz de trabalhar com liberdade”.
Durante o fórum, a ANJ homenageou também Sidnei Basile, que faleceu no dia 16 de março, por sua contribuição à defesa da liberdade de imprensa no Brasil e no continente. Basile foi vice-presidente do Grupo Abril, diretor da ANJ e secretário da SIP.
A SIP é uma organização sem fins lucrativos que se dedica a defender e promover a liberdade de imprensa e a liberdade de expressão em todas as Américas. É formada por mais de 1.300 publicações no hemisfério ocidental e tem sede em Miami, Estados Unidos. Para mais informações, visite: http://www.sipiapa.org