A intimidação faz referência a uma campanha de desinformação mobilizada pelo parlamentar junto a aliados, alegando falsamente que Amado teria causado a prisão de Filipe Martins, ex-assessor do então presidente Jair Bolsonaro. Em 2023, Amado publicou uma matéria com base em um documento da imigração dos EUA que indicava a entrada de Martins no país em dezembro de 2022. A informação foi corrigida após a defesa do ex-assessor demonstrar que ele estava no Brasil no período e a prisão ocorreu a partir de um relatório da Polícia Federal.
Os ataques beiram a violência extrema. O jornalista do Intercept Brasil, Paulo Motoryn, por exemplo, foi ameaçado de morte e de violência física após publicação de uma reportagem sobre um foragido dos atos de 8 de janeiro de 2023. O homem citado na reportagem foi condenado a 16 anos de prisão por incendiar uma viatura e comprar equipamentos militares na tentativa de golpe de Estado. Os agressores usaram as redes sociais, divulgando o endereço do jornalista e citando a família dele.
É importante ressaltar que as instituições brasileiras permanecem em pleno funcionamento democrático, e casos de assédio a jornalistas e de desinformação online têm sido julgados. Em fevereiro, por exemplo, a 43ª Vara Cível da Justiça de São Paulo mandou a deputada federal Carla Zambelli (PL) remover conteúdo de suas redes sociais com referência à jornalista da TV Cultura, Vera Magalhães. A decisão afirma que a parlamentar disseminou informações falsas e ofensivas sobre a jornalista.
Em fevereiro, o repórter fotográfico Bruno Santos, da Folha de S.Paulo, foi agredido por seguranças e dirigentes do Bloco Acadêmicos do Baixo Augusta, em São Paulo (SP). Depois de receber chutes de seguranças que queriam impedi-lo de registrar um conflito com foliões, o jornalista foi destratado pelo presidente do bloco, Alexandre Natacci, que não queria que o episódio fosse noticiado, como informou o jornal paulista.
A agressão ao fotógrafo ocorreu algumas horas depois que o também jornalista e escritor Marcelo Rubens Paiva, porta-estandarte do bloco, foi agredido por dois homens enquanto recebia a homenagem do Baixo Augusta por seu trabalho. Filho de Rubens e Eunice Paiva, Marcelo é autor do livro “Ainda Estou Aqui”, que inspira o filme vencedor de um Oscar.
Em março, o Supremo Tribunal Federal (STF) aperfeiçoou seu entendimento sobre as condições em que empresas jornalísticas estão sujeitas à responsabilização civil, ou seja, ao pagamento de indenização por danos morais, se publicarem entrevista em que o entrevistado atribua falsamente a outra pessoa a prática de um crime (calúnia). Com os ajustes, foram definidos critérios objetivos para a responsabilização e a remoção de conteúdo, que representam avanço significativo em relação ao entendimento anterior, reduzindo a possibilidade de julgamentos equivocados e onerosos em primeira instância, sobretudo.
A decisão foi tomada em recursos (embargos de declaração) apresentados na tese de repercussão geral fixada no Recurso Extraordinário (RE) 1075412 (Tema 995). Nos pedidos analisados pelo Supremo, o Diário de Pernambuco e a Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji) questionaram a tese firmada em 2023 pelo STF por considerar que alguns pontos eram genéricos e poderiam levar a casos de censura. Naquele ano, o Supremo decidiu que os jornais poderiam ser responsabilizados em casos de injúria, difamação ou calúnia proferida por entrevistado.
Agora, em plenário, o colegiado reafirmou o entendimento de que a empresa jornalística só poderá ser responsabilizada civilmente se for comprovada sua má-fé, caracterizada pelo conhecimento prévio da falsidade da declaração ou por evidente negligência na apuração da informação, sem que seja dada a possibilidade de resposta do terceiro ofendido ou, ao menos, de busca do contraditório.
Também ficou estabelecido que o veículo poderá ser responsabilizado caso o conteúdo com a acusação falsa não seja removido de plataformas digitais por iniciativa própria ou após notificação da vítima.
Ficou definido ainda que, em entrevistas ao vivo, o veículo não pode ser responsabilizado por declarações feitas exclusivamente pelo entrevistado. Mas, para isso, deverá assegurar à pessoa a quem for falsamente atribuída a prática de crime o direito de resposta em iguais condições, espaço e destaque.
No caso que motivou o julgamento, o ex-deputado federal Ricardo Zarattini Filho, que morreu em 2017, processou o Diário de Pernambuco após ser acusado por um entrevistado de participar de um atentado a bomba durante a ditadura militar no Aeroporto do Recife-Guararapes. O jornal foi condenado a indenizar o militante.
A Justiça do Rio de Janeiro determinou a remoção de uma reportagem de 2023 do portal Metrópoles que mencionava o nome do ex-procurador-geral de Justiça do estado Marfan Martins Vieira, hoje aposentado, em um suposto esquema de propinas. Ele move uma ação em segredo de justiça contra o veículo e o jornalista Arthur Guimarães, autor da matéria, pedindo indenização de R$ 130 mil por danos morais. O caso ainda aguarda julgamento de mérito.
A reportagem, que foi retirada do ar por decisão liminar, citava a delação premiada do ex-secretário estadual de Saúde do Rio Sérgio Côrtes, que apontou Marfan como um dos destinatários de pagamentos irregulares. A matéria detalhou a operação investigativa que estava em curso.
Sobre a delação premiada de Sérgio Côrtes, o TJ-RJ determinou o arquivamento do procedimento investigatório, uma vez que o Ministério Público Federal informou que não possuía documentos que corroborassem a delação. Essa decisão foi proferida depois da publicação da reportagem do Metrópoles.
Em fevereiro, o Ministério Público Federal (MPF) ajuizou ação civil pública contra a Igreja Universal do Reino de Deus (Iurd) por dano ao sistema de justiça, ao acesso à justiça e à liberdade de expressão e de imprensa, promovidos por meio de assédio judicial contra o jornalista João Paulo Cuenca. Segundo inquérito civil realizado pelo MPF, a instituição organizou a propositura, por pastores da igreja, de mais de uma centena de ações praticamente idênticas contra o jornalista, em 19 unidades da federação, como reação a um tuíte publicado por ele em junho de 2020.
Para os procuradores dos Direitos do Cidadão do MPF no Rio de Janeiro, o ajuizamento de ações em massa representou exercício abusivo do direito de petição e do acesso à justiça, além de violar as liberdades de expressão e de imprensa, por meio da adoção de estratégia para silenciar e constranger o emissor da mensagem e o próprio ofício jornalístico.
A jornalista e apresentadora Luciana Barreto, da TV Brasil, foi alvo de ofensas em português e espanhol depois de criticar a fala do presidente da Confederação Sul-Americana de Futebol (Conmebol), Alejandro Domínguez, de março, de que a Copa Libertadores da América sem o Brasil seria como “Tarzan sem a Chita”. A fala racista repercutiu em todo o mundo.
Âncora e editora-chefe do Repórter Brasil Tarde, Barreto é especialista no tema do qual agora se torna alvo. Escreveu “Discurso de ódio contra negros nas redes sociais”, livro finalista do Prêmio Jabuti Acadêmico.
Em dezembro de 2024, a jornalista da GloboNews Natuza Nery fazia compras em um supermercado de Pinheiros, em São Paulo, quando foi insistentemente ofendida por um policial civil, que afirmou que pessoas como ela deveriam ser “aniquiladas.” Um inquérito foi instaurado pela Corregedoria da Polícia Civil para investigar a conduta de seu agente.
O relator especial para a Liberdade de Expressão (RELE) da Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) da Organização dos Estados Americanos (OEA), Pedro Vaca, esteve no Brasil, a convite do Governo Federal. A agenda, entre 9 e 14 de fevereiro, incluiu reuniões com autoridades dos Três Poderes e com lideranças da sociedade civil e do meio acadêmico.
Nos encontros, o Palácio do Planalto acusou apoiadores do ex-presidente Jair Bolsonaro de promoverem desinformação e ódio nas redes sociais e atacarem o Estado democrático de direito brasileiro. O governo também defendeu a regulamentação das plataformas digitais como forma de evitar “atos concretos de violência” no Brasil.
Do ponto de vista da oposição ao atual Executivo, por outro lado, houve crítica à atuação do Judiciário na condução dos inquéritos relacionados aos atos antidemocráticos no país. Parlamentares acusam o ministro do STF Alexandre de Moraes e a administração do presidente Luiz Inácio Lula da Silva de promoverem uma “perseguição política” e minar a liberdade de pensamento no Brasil com prisões e bloqueios nas redes sociais.