Bolivia

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A liberdade de imprensa e de expressão foi profundamente afetada pelas frequentes agressões a jornalistas e meios de comunicação. A situação piorou por causa das agressões verbais cada vez mais frequentes do governo, principalmente do presidente Evo Morales, contra a imprensa, jornalistas e donos de meios de comunicação. Os ataques aumentaram conforme a situação política, econômica e social se agravava, e a relação entre o governo e seus oponentes deteriorou-se em vários departamentos do país. O governo fez progressos significativos nos seus esforços para controlar as informações, especialmente nos setores rurais e às vésperas dos referendos sobre autonomia, realizados desde 4 de maio, em Santa Cruz, até 22 de junho, em Tarija. Seu objetivo, que não foi alcançado, era evitar que os departamentos de Santa Cruz, Beni, Pando e Tarija aprovassem as leis de autonomia. Em um referendo anterior, já haviam aprovado essas leis. Para os referendos de revogação dos mandatos de presidente, vice-presidente e prefeitos de departamentos, o canal de TV do governo instalou 20 repetidoras em todo o país para difundir, a todos os locais possíveis, a publicidade favorável ao governo e contra os prefeitos de oposição . O governo colocou a serviço do partido do governo Movimento para o Socialismo (MAS) a Televisón Boliviana e a rede de rádio Patria Nueva, o que configura uma irregularidade. Decretou-se que a diretoria do canal será composta apenas por cinco ministros de Estado, presidida pelo ministro da Presidência, o que elimina a participação de representantes da sociedade civil. As campanhas anteriores aos referendos e durante os mesmos intensificaram os ataques à mídia e aos jornalistas. No começo, foram grupos do governo que atacaram os meios privados e agrediram em diversas ocasiões os jornalistas da imprensa independente. Depois, grupos radicais de oposição atacaram meios estatais e seus jornalistas em vários pontos do país. Os ataques verbais do governo à imprensa, que resultam quase sempre em agressões dos seus seguidores a jornalistas e meios, são conseqüência de uma suposta estratégia de desprestigiar a imprensa para que perca a credibilidade junto à sociedade. O presidente Morales afirmou em discurso que a imprensa mente e que por isso o povo “não tem que acreditar nela”. Esse é um tema frequente e tem um forte impacto nos setores sociais pró-governo que recebem basicamente informações do governo. Associações de profissionais de imprensa fizeram passeatas em Santa Cruz, Oruro e Chuquisaca em defesa da liberdade de expressão e instituições jornalísticas emitiram comunicados condenando as agressões. O governo resistiu a aceitar a crítica da mídia e disse que a imprensa é sua inimiga. A imprensa independente publicou matérias criticando declarações do presidente como a que diz que “não sei se é legal ou ilegal. Eu crio as normas e depois meus advogados dão um jeito porque foi para isso que estudaram”. Na Assembléia Constituinte, a maioria do governo decidiu arbitrariamente mudar o sistema de aprovação dos artigos do projeto da Constituição, passando de dois terços para maioria absoluta, de forma arbitrária e contrária à Lei de Convocação que estabelecia sua aprovação por dois terços. Os jornais criticaram a decisão da Assembléia, o que foi interpretado em relatórios governamentais como uma oposição da imprensa. A posição editorial da imprensa contra a aprovação pela Assembléia Constituinte do projeto da Constituição foi classificada também como oposição ao governo. O mesmo aconteceu com a decisão do governo de modificar por decreto as porcentagens de distribuição do Imposto Direto sobre os Hidrocarburetos (IDH), conforme estabelecido por lei. Os editoriais pediram que a lei fosse respeitada e não anulada por decreto, o que foi interpretado pelo governo como um apoio da imprensa à oposição. Esses dois tópicos – aprovação irregular do projeto da Constituição e distribuição ilegal dos impostos sobre o hidrocarbureto – são a base do conflito entre o governo e os cinco departamentos. Isso trouxe mais violência do que a que já ocorreu no começo de setembro, quando os confrontos resultaram em um número desconhecido de mortos, feridos e desaparecidos em Pando, no norte do país, fronteira com o Brasil. Os meios independentes que enviaram jornalistas a Cobija para cobrir os eventos de 11 de setembro, quando os militares ocuparam o aeroporto durante o estado de sítio, foram censurados. Os jornalistas foram obrigados pelos militares a voltar a seus locais de origem em um avião militar. Desde então, precisam entrar em território brasileiro para voltar a Cobija. Os jornalistas devem ficar a 200 metros de distância do aeroporto. Os soldados disparam suas armas contra os que tentam se aproximar dos chefes militares. Só os jornalistas dos meios do governo gozam de facilidades para realizar seu trabalho em Pando. Os episódios de violência no país se caracterizaram por ocupações de instituições públicas em Santa Cruz, Beni, Pando e Tarija, bloqueio de estradas e confrontos entre setores civis pró e contra o governo, o que afetou os meios e jornalistas. Em 27 de março, em Pucarani, povoado do altiplano boliviano, o jornalista Carlos Quispe foi brutalmente agredido por camponeses contrários ao prefeito do local que entraram nas instalações da Rádio Municipal de Pucarani. Dois dias depois, Quispe morreu como consequência das lesões causadas pelos golpes. As autoridades policiais e judiciais não tomaram as medidas necessárias para descobrir os autores do crime. A partir de então e até 19 de setembro, pelo menos cem jornalistas, de meios privados de imprensa, rádio e televisão foram alvo de vários tipos de ataques no país por militares ou simpatizantes do governo e da oposição, segundo estatísticas da ANP (Associação Nacional de Imprensa). Os ferimentos mais graves ocorreram quando Claudia Méndez, da rede de TV PAT, foi ferida por um tiro disparado por um soldado, quando os militares ocuparam o aeroporto de Cobija na capital de Pando, em 13 de setembro, e com a surra que sofreu Angel Farell, fotógrafo do jornal El Deber, de Santa Cruz, também em 13 de setembro em Tiquipaya. Fazendeiros pró-governo que enfrentavam jovens de Santa Cruz o agrediram a pauladas e ele fingiu-se de morto para poder salvar sua vida. Pelo menos cinco jornalistas da Televisión Boliviana e da rede de rádio Patria Nueva, do governo, foram agredidos. As estatísticas da ANP revelam que ocorreram pelo menos 43 ataques a meios de comunicação privados entre abril e setembro deste ano, e nove contra meios do governo em várias partes do país. Na área de auto-regulação, cinco instituições criaram o Tribunal Nacional de Ética Jornalística, composto por um ex-presidente do Supremo Tribunal da Justiça, um ex-presidente do Tribunal Constitucional da Nação e três jornalistas que já receberam o Prêmio Nacional de Jornalismo. Existe ainda a ameaça do projeto da Constituição Política do Estado (CPE), o qual foi aprovado pelo governo. O parágrafo II do Artigo 108 afirma que “As informações e opiniões emitidas através dos meios de comunicação social devem respeitar os princípios de veracidade e responsabilidade”, o que constitui uma violação da liberdade de expressão e dos acordos internacionais assinados pelo governo.

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