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BRASIL O fato mais importante a registrar é que persiste a impunidade nos crimes contra a imprensa no Brasil. Oito assassinatos cometidos entre 1995 e 1998 continuam sem punição, com os processos seguindo o caminho burocrático e lento. Os acusados estão livres ou os casos não foram elucidados. A ANJ Brasil, a vice-presidência regional da Comissão de Liberdade de Imprensa e Informação da SIP para aquele país têm cobrado sistematicamente providências ao Poder Judiciário, considerando que a impunidade é um estímulo ao cometimento de novos delitos. O primeiro resultado pode ser anunciado nesta Assembléia em Houston: acaba de ser marcado o julgamento do acusado de assassinar o jornalista Zaqueu de Oliveira, na cidade de Barroso, Estado de Minas Gerais, em 1995. O acusado, José Carlos de Souza, será submetido a júri popular, fixado pelo Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais para o dia 17 de novembro de 1999, às 9 horas da manhã. No que se refere às leis, os jornals brasileiros têm insistido junto ao Congresso Nacional, desde 1991, para que seja extinta a atual Lei de Imprensa, de 1967, editada sob a égide do regime militar. Atualmente, o texto que tramita na Câmara dos Deputados é o substitutivo do deputado Vilmar Rocha, do Partido da Frente Liberal do Estado de Goiás, aprovado pela Comissão de Constituição e Justiça em agosto de 1997 e, regimentalmente, em condições de ser levado à votação pelo Plenário. O ponto crítico ocorrerá caso o Projeto de Lei não acolha a sugestão de se estabelecerem critérios para cálculo de valores máximos de indenizações por danos morais. Esta posição já foi apresentada ao presidente da Câmara, deputado Michel Temer. A ameaça de condenações absurdas, despropositadas em relação ao eventual dano causado, pode provocar o fechamento de periódicos e induzir ao nefasto exercício da autocensura, tanto por parte de jornalistas quanto de órgãos de imprensa. Por otro lado, tramita no Congresso Nacional o Projeto de Lei nº 2.961/97, originário do Poder Executivo, que se constitui numa iniciativa de cerceamento da liberdade de imprensa ao proibir a divulgação de declarações, por qualquer meio de comunicação, de autoridades policiais, administrativas ou judiciárias, sobre inquéritos e processos em andamento, na Polícia ou na Justiça, até o seu julgamento final. Se aprovado, representará uma verdadeira "mordaça" para a imprensa, já que os fatos só poderão ser divulgados após a tramitação do processo na Justiça e a sentença do juiz. Além disso, proibir que autoridades informem sobre ocorrências que não estão sob segredo de Justiça fere a Constituição Federal, restringe as informações à sociedade e impede denúncias sobre casos de relevante interesse público, inibindo o jornalismo investigativo. O projeto de uma nova Lei Geral do Sistema Nacional de Correios também preocupa a Associação Nacional de Jornais - ANJ Brasil. Dependendo da interpretação do texto, a distribuição de jornais e revistas passaria a ser feita obrigatoriamente pela empresa estatal ou então mediante registro em repartição pública específica. Tal fato se configuraria como inaceitável perante a liberdade de imprensa. Por isso, a entidade encaminhou ao Governo Federal, através da Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos, sugestão de inclusão de um parágrafo com a seguinte redação: "Ficam excluídas do Serviço Postal as atividades de distribuição e entrega domiciliar de revistas, livros e jornais". Entretanto, há uma boa notícia com relação às leis. Por solicitação da ANJ, o Ministério da Justiça retirou do anteprojeto de reforma do Código Penal Brasileiro o artigo que estabelecia o conceito de "publicidade opressiva". Esse artigo proibia a divulgação de notícias sobre processos em andamento, alegando a possibilidade de interferência na decisão dos juízes e jurados, admitindo a possibilidade de um veículo de comunicação desenvolver "campanha" com o objetivo de "constranger" os juízes, testemunhas, ou qualquer outra pessoa envolvida em processo judicial. A alegação mostra uma visão completamente distorcida do trabalho da imprensa. Um dos fatos mais relevantes no campo da liberdade de imprensa no Brasil, nos últimos seis meses, foi a visita da missão da SIP, no início de agosto último. O objetivo foi tratar de crimes impunes praticados contra jornalistas e manter contato com autoridades dos poderes Judiciário, Executivo e Legislativo. Integraram a missão, chefiada pelo presidente Jorge Fascetto: Alberto Ibargüen (The Miami Herald), Diana Daniels (Washington Post), Scott Schurz (The Indiana Times), Carlos Molina, coordenador de liberdade de imprensa da SIP, Paulo Cabral, vice-presidente para o Brasil da Comissão de Liberdade de Imprensa e Informação, e Deusdedith Aquino, do jornal Estado de Minas. Ao presidente da República, a Missão da SIP solicitou ajuda para a punição dos responsáveis pelos assassinatos dos jornalistas Zaqueu de Oliveira, em Minas Gerais, e Aristeu Guida da Silva, no Estado do Rio de Janeiro, ambos em 1995 e até agora impunes. O presidente Fernando Henrique Cardoso prometeu agilizar os processos, através de seu Ministro da Justiça. Foi proposto, na ocasião, que os crimes contra jornalistas e órgãos de imprensa sejam considerados atentados aos direitos humanos. Também no encontro com O presidente do Supremo Tribunal Federal, ministro Carlos Mário Velloso, a Missão da SIP pediu apoio para a rápida elucidação e punição dos responsáveis por oito crimes contra jornalistas no Brasil, entre 1995 e 1998. O presidente da Suprema Corte brasileira decidiu enviar correspondência aos presidentes dos Tribunals de Justiça dos Estados onde ocorreram os crimes, afirmando que "a apuração e punição dos culpados é assunto da maior relevância para ajustiça brasileira". O presidente do Supremo Tribunal Federal também se declarou favorável à federalização dos crimes contra a imprensa, dentro da reforma do Judiciário, e disse que defenderia essa posição. Com o presidente da Câmara dos Deputados, Michel Temer, a conversa foi sobre a nova lei de imprensa brasileira. O presidente da SIP informou que a entidade considera que "a melhor lei de imprensa é a que não existe", defendendo a revogação, pura e simples, da legislação atual, de 1967. O presidente da Câmara disse acreditar que o Congresso Nacional não revogará a lei de 1967 sem colocar outra Lei de Imprensa. Chamou a atenção para um ponto importante, que seria a oportunidade de inclusão, na nova lei, de critérios para cálculo de valores de indenizações por danos morais contra veículos de comunicação. Afirmou que, em sua opinião, falta apenas acertar esse ponto para que o substitutivo do deputado Vilmar Rocha possa ser levado à votação em plenário. A Missão da SIP esteve, ainda, na cidade de Belo Horizonte. Durante audiência com o presidente do Tribunal de justiça do Estado de Minas Gerais, foi solicitada a marcação da data do julgamento do assassino do jornalista Zaqueu de Oliveira, morto em 1995, no Município de Barroso, a 100 km da capital do Estado. O processo estava em condições de ser levado a júri popular, dependendo apenas de ato do procurador-geral de justiça de Minas Gerais, Epaminondas Fulgêncio, indicando o promotor. Há poucos dias, recebemos a informação do presidente do Tribunal de justiça de Minas Gerais de que o julgamento foi marcado para o próximo dia 17 de novembro, às 9 horas da manhã, no fórum da cidade de Barbacena, a 200 km da capital do Estado. Este resultado objetivo da Missão da SIP certamente demonstrou a importante contribuição que a entidade prestou à causa da liberdade de imprensa no Brasil neste momento. Em 1999, houve outros episódios relativos à censura e agressões, apresentados a seguir: - Em 2 de março, dois jornalistas de Andradina, Antônio Crispim (Jornal da Região) e Marco Aurélio de Souza Santos (Debate), foram processados criminalmente porque presenciaram um flagrante e noticiaram a ocorrência nos jornais em que trabalham. - Em 2 de abril, o juiz Cléber Lúcio de Almeida, da 29' junta de Conciliação e julgamento da justiça do Trabalho de Belo Horizonte, capital do Estado de Minas Gerais, conseguiu reeditar a censura aos meios de comunicação para impedir que seu nome fosse envolvido no escândalo da venda de carteiras de habilitação por funcionários do Departamento Estadual de Trânsito - Detran de Minas Gerais. A repórter do Diário da Região, Cecília Demian, foi absolvida, no dia 13 de maio de 1999, no processo movido pelo promotor Odival Cicote, da 3' Promotoria de São José do Rio Preto. Cicote pediu a condenação da jornalista por injúria, crime previsto no artigo 22 da Lei de Imprensa. O juiz Osni Assis Pereira, da 3' Vara Criminal, considerou a queixa-crime improcedente. - Em 26 de maio, a jornalista Maria Elena Covre e o fotógrafo junior Vignola, ambos do jornal Diário da Região, de São José do Rio Preto, Estado de São Paulo, foram impedidos de continuar a apuração de denúncia de expulsão de alunos e violência escolar na Escola Estadual Galante Nora. - Em 31 de maio, a jornalista Tânia Martins e o repórter-fotográfico Paulo Ricardo Rocha, ambos do jornal Meio Norte, de Teresina, capital do Estado do Piauí, presenciaram e fotografaram o policial militar Carlos Alberto Pires da Silva, do 1 Q Batalhão de Polícia Militar, praticando atitudes truculentas contra um menino de rua. O flagrante da violência provocou a ira do soldado que, além de agressões verbais, apontou o revólver para a cabeça do repórter-fotográfico, ameaçou-o de morte e desferiu-lhe um soco no estômago. - Em 6 de julho, o coronel josias Quintal, secretário de Segurança Pública do Estado do Rio de janeiro, proibiu entrevistas de policiais aos veículos de comunicação. O presidente da ANj, Paulo Cabral, e o vice-presidente responsável pelo Comitê de Liberdade de Expressão, Renato Simões, enviaram correspondência ao governador do Estado, Anthony Garotinho, manifestando estranheza com o procedimento do secretário que, para os dirigentes da entidade, "decorreu de uma orientação equivocada da autoridade responsável pelo setor de Segurança Pública desse Estado". - Em 23 de julho, um grupo de manifestantes da "Marcha dos Sem", da qual participavam trabalhadores sem terra, desempregados e outros chamados "excluídos", invadiu o saguão do prédio que sedia o jornal Zero Hora, na cidade de Porto Alegre, Estado do Rio Grande do Sul, mas não chegou até a Redação, localizada no terceiro andar, porque os seguranças da empresa fecharam as portas. - Em 28 de julho, o jornal Folha de S.Paulo denunciou que um grupo de seis soldados do Batalhão de Choque da Polícia Militar que atuava na repressão a protesto de caminhoneiros na Rodovia Anhanguera, no Estado de São Paulo, confiscou nove filmes do repórter-fotográfico Marcos Peron. Segundo publicação do jornal, os filmes já haviam sido utilizados pelo fotógrafo e mostravam o momento em que cerca de 50 policiais invadiam um posto de combustíveis perto do pedágio de Nova Odessa, localizado no Km 117 da rodovia, quebrando vidros de pelo menos cinco caminhões na área de abastecimento e obrigando os motoristas a deixarem o local. - Em 9 de agosto, o prefeito de Recife, Roberto Magalhães, compareceu na redação do Jornal do Commercio portando arma de fogo e proferindo ameaças ao colunista Orismar Rodrigues por ter publicado notas que ele considerou ofensivas. Magalhães, que já foi governador do Estado e deputado federal, irritou-se com a insinuação de que seria o autor de suposta censura a urna obra do artista plástico Francisco Brennand em comemoração aos 500 anos de descoberta do Brasil. -- Em 16 de agosto, o jornalista Nelson Gonçalves, da editoria de Política do Jornal da Cidade, sofreu um atentado a tiros em Bauru, interior de São Paulo. Ele havia deixado a redação do jornal por volta de 23h e, ao chegar em casa, quando se preparava para guardar o carro na garagem, ainda do lado de fora, foi abordado por dois homens em urna motocicleta que atiraram quatro vezes. -- Em 20 de agosto, a l' Câmara do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo condenou o jornal Debate a pagar indenização de mil salários mínimos (cerca de R$136 mil) ao juiz Antonio José Magdalena. O Tribunal de Justiça derrubou o argumento da defesa de que o caso deveria obedecer requisitos da Lei de Imprensa corno limites para indenização. O juiz alegou danos morais pelas reportagens publicadas pelo jornal. -- Em 15 de setembro, o governador do Distrito Federal, Joaquim Roriz, objetivando o cerceamento da liberdade de imprensa, fez ameaças públicas contra o jornal Correio Braziliense, de Brasília. Demonstrando evidente incompreensão do papel da imprensa de informar e opinar livremente, o governador reagiu à matéria do jornal, julgando-a contrária à política do governo local de distribuição gratuita de lotes urbanos, afirmando que "eu quero estabelecer um confronto com o jornal" e convocando a população a não ler o Correio Braziliense.

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