Em ano de eleição para presidente, deputados estadual e federal, senador e governador, acirraram-se as ameaças à liberdade de imprensa em diversos Estados do Brasil com proibições da Justiça para veicular notícias e ameaças de políticos contra jornalistas. No segundo semestre de 2006 chamou a atenção o grande número de agressões físicas contra os profissionais no exercício do jornalismo.
Em 26 de julho, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva vetou o Projeto de Lei Complementar 79/2004, de autoria do deputado Pastor Amarildo, que trata da atuação de jornalistas e suas funções. O texto retomava propostas que haviam sido vetadas dois anos antes pelo Governo. Entre elas, o aumento de 11 para 23 no número de funções relativas às profissões de informação e comunicação que exigiriam a obtenção de um diploma prévio de jornalismo para o exercício. A nova legislação também previa a criação do Conselho Federal de Jornalismo para disciplinar, orientar e controlar a profissão e aplicar sanções administrativas.
A liberdade de expressão ficou em perigo quando, em agosto, um jornalista e um auxiliar técnico da TV Globo em São Paulo foram feitos reféns de uma organização criminosa, o Primeiro Comando da Capital (PCC), para exigir a veiculação de uma mensagem do grupo em um dos programais de maior audiência da televisão brasileira. A SIP denunciou o clima crescente de descontrole e violência causado pela impunidade e pela falta de articulação entre as autoridades estadual e federal evidenciados pela situação.
A impunidade aparece também em outras situações, como o arquivamento, em janeiro, do inquérito que investiga o assassinato do apresentador de televisão Edgar Lopes de Faria, conhecido como Escaramuça. Faria foi morto em 29 de outubro de 1997, em Campo Grande, Mato Grosso do Sul. Da mesma forma ainda não foi concluído o inquérito que apura quem colaborou com a fuga de Célio Alves de Souza, ex-soldado da Polícia Militar, condenado em junho de 2005 a 17 anos e seis meses de prisão por participação no assassinato do empresário Domingos Sávio Brandão Lima Júnior. Ele fugiu da Penitenciária Pascoal Ramos em 24 de julho de 2005, repetindo uma situação ocorrida com outro acusado pelo mesmo crime.
Além disso, continuam sem punição os mandantes de vários crimes contra radialistas e jornalistas. No máximo, foram presos e condenados alguns pistoleiros e intermediários. E mesmo estes conseguem, com algumas brechas da Justiça, driblar a punição. No caso do assassinato do jornalista Samuel Román, ocorrido em abril de 2004, em Coronel Sapucaia, Mato Grosso do Sul, o Tribunal de Justiça manteve a pronúncia (indicação para ir a julgamento) de Cleyton de Andrade Segovia, mas ele conseguiu um habeas corpus e fugiu.
Situações de agressão à liberdade de imprensa:
Em 2 de maio, o radialista Camelo Luis de Sá, da Rádio Comunitária de Quiterianópolis, Ceará, foi ferido com dois tiros no braço direito quando estava na sede da rádio. Antônio Valceni Vieira, filho do prefeito da cidade, Francisco Vieira da Costa, apresentou-se à delegacia de Tauá, e disse que disparou contra o radialista porque ele havia ofendido sua família com seus comentários na rádio.
Em 5 de maio, o delegado Edson Costa, do 4º Distrito Policial de Curitiba, Paraná, invadiu o prédio da TV Iguaçu, armado, exigindo direito de resposta no programa jornalístico Tribuna na TV. Aparentemente Costa sentiu-se atingido por uma série de reportagens que o programa havia veiculado ao longo da semana. Bastante nervoso, foi acalmado pela equipe de jornalismo e concordou em deixar a arma numa gaveta da redação antes de entrar no estúdio. As matérias do Tribuna na TV acompanhavam uma investigação da Corregedoria da Polícia Civil, do Núcleo de Proteção a Crianças e Adolescentes Vítimas de Crime (Nucria) e da Promotoria da Infância e da Juventude sobre o envolvimento de policiais civis em um esquema de pedofilia, aliciamento de menores e extorsão.
Em 5 de maio, o jornalista Lucio Flavio Pereira Vaz, repórter especial do Correio Braziliense, em Brasília, foi surpreendido por uma informação publicada no jornal O Globo. Em reportagem sobre a Operação Sanguessuga realizada pela Polícia Federal (PF), o jornal reproduziu um diálogo interceptado pela PF em 23 de dezembro de 2005 entre o empresário Luiz Antônio Trevisan Vedoin e Francisco Machado Filho, assessor do deputado Nilton Capixaba (PTB-Rondônia), em que os dois planejavam a morte de Vaz. O delegado da Polícia Federal Tardelli Boaventura, da Delegacia Regional de Combate ao Crime Organizado de Mato Grosso, afirmou que o diálogo foi uma conversa isolada.
Em 11 de maio, o jornalista Ricardo Ojedo, que é diretor da sucursal do jornal Diário MS e do site de notícias Perfil News em Três Lagoas, Mato Grosso do Sul, recebeu ameaças por telefone. Ele registrou queixa na Delegacia Regional da Polícia Civil. Ojedo acredita que foi ameaçado em resposta à cobertura sobre a prisão de cinco vereadores da cidade de Santa Rita do Pardo acusados de concussão e formação de quadrilha.
Em 12 de maio de 2006, seguranças do ex-governador do Rio de Janeiro Anthony Garotinho agrediram a fotógrafa Marizilda Cruppe, do jornal O Globo, quando o político, em greve de fome, era transferido da sede do partido PMDB no Rio de Janeiro para um hospital. Na saída de Garotinho, os seguranças agiram com violência contra vários profissionais de jornalismo e chegaram a aplicar uma gravata em Marizilda, que foi puxada com força e empurrada.
Em maio, a repórter Maria Mazzei, do jornal O DIA, do Rio de Janeiro, recebeu ameaças de morte após a publicação de uma série de matérias denominada "A Máfia dos Corpos" sobre a fraude contra empresas de seguros de vida. A primeira reportagem foi publicada no dia 13 e resultou na prisão de duas pessoas envolvidas no golpe. Na semana seguinte, Maria Mazzei foi ameaçada pela primeira vez. Quando ela denunciou um ex-oficial da Marinha Mercante, George Sarkis, no golpe, um carro passou a rondar a casa da jornalista e seus parentes receberam telefonemas anônimos com novas ameaças. A empresa removeu a jornalista e sua família para um lugar seguro.
Na madrugada de 18 de maio, três homens armados e encapuzados invadiram a sede do jornal Imprensa Livre, em São Sebastião, cidade no litoral norte paulista. Eles se dirigiram à gráfica, na parte de trás do prédio, mandaram os funcionários deitarem no chão, espalharam gasolina nas máquinas impressoras, na guilhotina e nos exemplares que já haviam sido impressos, e atearam fogo. Durante a invasão, os homens gritavam que o jornal não deveria mais publicar informações sobre o PCC (Primeiro Comando da Capital), organização criminosa responsabilizada por uma série de atentados em São Paulo. Mas o diretor do jornal acredita que a causa do atentado é mais política. Há cerca de um ano, o jornal estava publicando denúncias sobre irregularidades cometidas pela administração municipal de São Sebastião.
No dia 28 de maio, o jornalista e ambientalista Vilmar Sidnei Demamam Berna, editor do Jornal, da Revista e do Portal do Meio Ambiente, recebeu um telefonema anônimo em sua casa em Niterói, Rio de Janeiro. Quando a esposa de Berna atendeu o telefone, uma voz de mulher disse que ele não passaria daquela noite.
Em 20 de junho, na Paraíba, índios potiguaras destruíram um carro de reportagem da TV Cabo Branco, afiliada da Rede Globo, e mantiveram dois reféns em Rio Tinto (60 km de João Pessoa), além um policial florestal e o segurança de uma usina da região. Segundo a polícia, a ação foi uma resposta à prisão de quatro índios presos por desmatamento ilegal no Parque Estadual da Mata do Rio Vermelho.
Em 11 de julho, o repórter Alexandre Araújo, do Estadão do Norte, em Rondônia, registrou queixa de ameaças recebidas do prefeito de Ouro Preto do Oeste, Irandi Oliveira, por ter publicado a notícia sobre a cassação do seu mandato. Logo após a queixa, no dia seguinte, houve uma nova ligação com ameaças, que foram ouvidas num telefone viva-voz pelo próprio delegado de polícia.
Em 18 de julho o jornalista José Ursílio, diretor de jornalismo do jornal Diário de Marília e das rádios Dirceu AM e Diário FM, em Marília, São Paulo, pediu proteção para ele e sua família e solicitou que as autoridades policiais e judiciárias tomassem medidas contra a escalada de violência e atentados iniciada com o incêndio criminoso no Diário, em setembro do ano passado. No dia anterior, havia sido preso em flagrante um montador de móveis que fez dois disparos contra o motorista Almir Adauto Marcelo. O motorista teria sido confundido com o jornalista.
Em 25 de julho, Rafael Luís, repórter da Editoria de Esportes do jornal O Povo, de Fortaleza, Ceará, levou um soco no peito de um assessor da presidência do Ceará Sporting Club. Ele havia publicado uma reportagem sobre a disputa entre dirigentes do clube e o atraso dos salários de jogadores e funcionários. Em junho, o repórter-fotográfico Mauri Melo já havia sido agredido por seguranças da Companhia Energética do Ceará (Coelce).
Em agosto, Mauri Martinelli, colunista do semanário O Minuano, de Estância Velha, Rio Grande do Sul, foi alvejado com cinco tiros. Martinelli acredita que se trata de um atentado político, porque ele vinha fazendo críticas à administração municipal em seu jornal. A diretora do jornal, Claudete Rihl, e a jornalista Vera Fernandes também receberam ameaças.
Em 12 de agosto, o repórter Guilherme Portanova e o auxiliar técnico Alexandre Coelho Calado, da Rede Globo, foram seqüestrados em São Paulo por supostos integrantes da organização criminosa Primeiro Comando da Capital (PCC). Os seqüestradores exigiram que a emissora transmitisse uma mensagem gravada do grupo, que foi protagonista de atos violentos em grande escala naquele Estado. O PCC libertou primeiro Coelho Calado com o vídeo. Depois da transmissão dessa fita pela TV Globo no programa dominical Fantástico, Portanova foi libertado.
Em 24 de agosto, o repórter-fotográfico Wagner Santos, do Jornal Diário do Povo, de Teresina, Piauí, foi detido pela polícia que fazia a segurança no Hospital Getúlio Vargas quando fotografava para uma reportagem sobre a greve dos médicos residentes. Um policial o colocou atrás das grades do portão do hospital e disse que ia chamar uma viatura para levá-lo até a delegacia. Os médicos pediram que ele fosse solto e populares começaram a empurrar o portão. No meio da confusão, o jornalista conseguiu escapar do local.
Em 30 de agosto, o cinegrafista José Antonio Aparecido Marciano, colaborador do Departamento de Jornalismo da Band, foi agredido dentro de um carro da reportagem, na região da avenida Paulista, em São Paulo. O agressor arrebentou o vidro do carro e atacou Marciano com uma barra de ferro. O cinegrafista foi socorrido pelo Resgate do Corpo de Bombeiros e levado para o Hospital São Paulo.
Em 7 de setembro, a Afropress Agência Afroétnica de Notícias- ficou fora do ar por ataques de rackers racistas. A Afropress passou a ser alvo sistemático dos ataques desde que revelou o nome do primeiro acusado da prática de crime de racismo na Rede. Além disso, os jornalistas de Afropress vêm sendo alvo de ameaças à sua integridade física e pessoal.
En materia de censura se registraron los siguientes hechos
Em 19 de maio o semanário Folha do Amapá circulou com uma edição de protesto contra o Partido Democrático Trabalhista (PDT). Isso porque uma decisão do Tribunal Regional Eleitoral do Estado determinou, a pedido do PDT, a suspensão da edição eletrônica número 571, veiculada na semana de 12 de maio. A censura foi uma represália à reportagem: Sólida demite, dá calote e some, publicada naquela edição, em que o jornal divulgava a demissão em massa da empresa Sólida Mineração e fazia críticas ao governador, que é do PDT, por promessas não cumpridas. A Folha é ligada ao ex-governador João Capibaribe (PSB). O juiz auxiliar Anselmo Gonçalves da Silva ordenou que a edição online fosse retirada do ar e estimulou uma multa de R$ 5.000,00 caso o jornal descumprisse a ordem.
Em agosto, a juíza Lúcia de Fátima Magalhães Albuquerque Silva, da Comarca de Ouro Preto, Minas Gerais, determinou a apreensão da edição nove da revista Observatório Social, atendendo a uma ação do Ministério Público do Estado. A revista trazia a reportagem "A Idade da Pedra, com denúncias sobre empresas mineradoras da região da Mata dos Palmitos que usariam mão-de-obra infantil na coleta de rochas de talco. A reportagem foi publicada em março e, segundo os jornalistas do Observatório, teve uma repercussão muito forte no exterior.
Em 27 de agosto de 2006, o juiz Roberval Casemiro Belinati, do Tribunal Regional Eleitoral do Distrito Federal, Brasília, proibiu os meios de comunicação de revelar o conteúdo e a existência da gravação de uma conversa entre dois políticos.
Em 30 de agosto, agentes da Polícia Federal invadiram a sede do semanário Hoje, em Belo Horizonte, Minas Gerais, e a gráfica Verdade, em Ribeirão Preto (SP), onde o jornal é impresso, para apreender computadores. A jornalista Joseti Alves, diretora do jornal, disse que promotores do Ministério Público a acusam de crime eleitoral por veicular informações sobre irregularidades na utilização de recursos públicos envolvendo um deputado federal, um ex-ministro e promotores locais.
Em 23 de maio de 2006, o jornal Correio do Estado, de Campo Grande, no Mato Grosso do Sul, foi punido por duas decisões da Justiça local em função de noticiário divulgado no final de 2005. As notícias falavam da ação movida pelo Ministério Público Federal contra o ex-prefeito da cidade, André Puccinelli, candidato do PMDB ao governo do Estado. Segundo o Ministério Público, Puccinelli havia cometido crime eleitoral na época em que foi prefeito de Campo Grande. Puccinelli tentou obter Direito de Resposta em relação a quatro matérias. O pedido foi inicialmente indeferido, mas numa segunda tentativa foi concedido pela 3ª Vara Criminal de Campo Grande. A juíza Cíntia Letteriello determinou que o jornal publicasse num só dia 23 de maio de 2006 quatro textos de Direito de Resposta.
Em 29 de maio de 2006, o jornal O Globo, do Rio de Janeiro, foi punido pela Justiça do Estado por publicar matéria sobre o escândalo das ONGs que receberam verbas oficiais e apoiaram a pré-campanha presidencial do ex-governador Anthony Garotinho. Em decisão liminar, antes de julgar o mérito da ação, a Justiça determinou que o jornal publicasse Direito de Resposta, mas o texto que O Globo foi obrigado a divulgar, em 29 de maio, foi cerca de dez vezes maior do que o da suposta ofensa.
Em 25 de setembro de 2006, o jornal Gazeta do Povo, de Curitiba, Paraná, publicou em sua manchete uma denúncia sobre o pedido de quebra de sigilo telefônico de jornalistas feito pelo governador licenciado Roberto Requião (PMDB), candidato à reeleição em outubro. O pedido teria sido encaminhado pela assessoria jurídica da coligação Paraná Forte (da qual faz parte o governador) à Corregedoria Geral do Ministério Público do Paraná e inclui a quebra de sigilo telefônico dos jornalistas Caio Castro Lima, Karlos Kohlbach e Celso Nascimento, da Gazeta do Povo, e Mari Tortato, da Folha de S. Paulo. O motivo foi uma série de reportagens publicadas nos dois jornais sobre a prisão do policial civil Délcio Rasera, que se apresentava como assessor de Requião e estaria ligado à Casa Civil, e foi acusado de fazer escutas telefônicas ilegais.
Madrid, Espanha