Nesse período, evidenciou-se uma maior liberdade de imprensa e pluralidade de opiniões no Peru. Alguns setores do governo reclamaram da falta de apoio dos meios de comunicação ao governo do presidente Alejandro Toledo e também foram registradas denúncias de meios de imprensa da oposição sobre incidentes considerados restritivos à liberdade de expressão.
Deve-se observar, também, que ocorreram importantes progressos em termos de legislação sobre liberdade de expressão, especialmente no que se refere à reforma constitucional e à recém-promulgada Lei de Transparência e Acesso às Informações Públicas. Em agosto, a SIP uniu-se à campanha iniciada pelo Conselho da Imprensa Peruana pronunciando-se sobre as omissões da Lei de Transparência e Acesso às Informações Públicas, e aos riscos para o direito do público de ser informado levantados pelo artigo que prevê exceções à lei. As exceções autorizam o Poder Executivo, eminentemente político e conjuntural, a selecionar informações como segredo de Estado. A modificação da referida lei figura na agenda pendente da atual legislatura e por isso se espera uma versão definitiva desta antes do final do ano.
Outros pontos importantes são a obrigação de toda agencia do governo de identificar o funcionário público responsável por receber os pedidos de informação de cidadãos; a incorporação de sanções administrativas e penais para obstrução do acesso a informações públicas; a proibição de destruição de informações e mecanismos de promoção de uma política de transparência econômica e fiscal do Estado.
Quanto à reforma constitucional, cabe destacar que o Congresso aprovou vários artigos para proteger a liberdade de imprensa e de expressão no país. O princípio das "responsabilidades ulteriores fixadas por lei", por exemplo, foi incorporado ao artigo 13 da Convenção Americana de Direitos Humanos. O direito de "buscar informações" foi incluído no direito de informar, emitir opiniões e se expresar. O "direito de exercer as liberdades inerentes à empresa jornalística" e o direito já reconhecido de fundar meios de comunicação foram acrescentados. O Congresso incorporou várias recomendações do Conselho Peruano de Imprensa em seu constante debate de emendas constitucionais, incluindo os descritos acima e o direito de fazer correções, mas não o direito de resposta.
Vários projetos de lei foram apresentados por congressistas de diversas bancadas políticas. Entre eles, o anteprojeto da Lei Trabalhista do Jornalista, o projeto de lei que propõe a anulação do artigo 374 do Código Penal sobre o crime de desacato e o projeto de lei que propõe reorganizar a empresa Editora Perú, que publica o diário oficial El Peruano. A controversa e amplamente debatida Lei de Rádio e Televisão apresentada pela Comissão de Transportes, Habitação e Construção foi excluída da agenda e por isso não se vislumbra um debate próximo a respeito.
Em setembro, o Tribunal Constitucional criou jurisprudência em matéria de liberdade de expressão ao considerar improcedente o processo de amparo apresentado pela Caja Rural de Ahorro y Crédito de San Martín contra a empresa de Comunicación y Servicios S.R. Ltda.., proprietária da emissora Radio Imagen e os jornalistas Ramón Alfonso Amaringo e Hildebrando García Moncada por terem divulgado informações sobre a relação entre os membros da diretoria da Caja Rural e Vladimiro Montesinos, ex-assessor de Fujimori . O Tribunal considerou que, segundo a Constituição, quando outros direitos constitucionais, tais como o direito a honra e reputação, são infringidos no exercício da liberdade de imprensa, não podem ser protegidos de modo que impeçam o meio de divulgar informações.
Apesar dos progressos, foram apresentadas denúncias relacionadas ao livre exercício da liberdade de imprensa no Peru que apresentamos a seguir:
A juíza anti-corrupção, Juana Meza, iniciou uma investigação contra Luis Agios Banchero e Enrique Agios Paulsen por terem supostamente recebido dinheiro de Montesinos através do então embaixador do Peru, Gabriel García Pike, para a publicação de artigos favoráveis ao regime de Fujimori no jornal Ojo. Esta denúncia foi feita a partir do relatório, baseado em testemunhos, de uma comissão investigadora do Congresso sobre Montesinos presidida pela congressista Anel Townsend. Os proprietários do jornal Ojo e o ex embaixador negam veementemente tal acusação e denunciam irregularidades no processo de investigação. Apesar do tempo transcorrido, o tribunal anti-corrupção ainda não se pronunciou sobre os resultados da investigação.
O congressista Jorge Mufarech, do partido Peru Possível, processou o jornal El Comercio por suposta difamação e calúnia por causa de um artigo publicado no jornal sobre a importação de um automóvel Jaguar, sugerindo que o congressista havia declarado um valor muito mais baixo pelo carro importado do Chile. Mufarech pede uma indenização de 50 milhões de dólares. Essa quantia astronômica é considerada uma intimidação. No processo, ainda em andamento, a defesa do El Comercio pediu a exceptio veritatis (demonstração da verdade do que foi publicado) sobre o que foi publicado.
Em 21 de outubro, o promotor José Vargas Valdivia pediu ao Tribunal Superior Anti-corrupção a prisão do presidente da Empresa Editora de Publicaciones Gente, Enrique Escardó. Esse pedido é contrário à decisão da juíza Sara Mayta que o considerou inocente nos crimes de associação ilícita e peculato, apesar de ela ter aberto investigação e ordenado que não saísse do país com base em alegações de associação ilícita e peculato. Escardó afirma que é vítima de perseguição econômica e política como conseqüência da linha editorial da revista Gente durante o governo de Fujimori, mesmo reconhecendo que o então diretor da sua revista, Víctor Rivero, recebeu fundos que, sabe-se agora, eram do Serviço de Inteligência para desacreditar proprietários e diretores de meios de comunicação contrários ao regime e criar uma campanha contra o principal acionista do Canal 2 de televisão, Baruch Ivcher Bronstein, para justificar a decisão do governo de suspender sua nacionalidade peruana.
Quanto ao caso do diretor do jornal Expreso, Eduardo Calmell del Solar, preso durante o andamento do processo por corrupção, um juiz atendeu o pedido de habeas corpus determinando sua libertação. Calmell del Solar saiu do país logo depois e há atualmente um mandado de busca e prisão internacional. O habeas corpus ainda está em vigor.
A Comissão Fiscalizadora do Congresso recomendou que o Ministerio Público investigasse alegações de tráfico de influências contra Salomón Lerner Ghitis, ex-presidente da Cooperación Financiera de Desarrollo (COFIDE). A fonte é uma gravação na qual Salomón Lerner Ghitis supostamente pressiona os irmãos Moisés e Alex Wolfenson, proprietários dos jornais La Razón e El Chino, para que parem de atacar o governo do presidente Alejandro Toledo. Horas depois da divulgação da fita, Lerner Ghitis apresentou sua renúncia à presidência do COFIDE. Em um comunicado de imprensa, Lerner Ghitis informou que o que disse no vídeo era de caráter pessoal. Atualmente, Moisés Wolfenson está sob prisão domiciliar por suposta participação em atos de corrupção.
No início do ano, o juiz Guido Vera, do 11o tribunal de Lima, ordenou que o jornalista Alvaro Vargas Llosa se apresentasse ou fosse levado à força, se necessário, a depor, depois que ele não compareceu para responder à acusação de difamação e atentado à honra feita pelo empresário Adam Pollack, amigo íntimo do presidente Alejandro Toledo. Vargas Llosa havia denunciado supostas irregularidades nas negociações do governo peruano em um contrato de aquisições militares. Em 25 de julho, emitiu-se ordem de prisão contra o jornalista Álvaro Vargas Llosa, que tinha sido declarado réu contumaz. Em sua defesa, Vargas Llosa, que está na clandestinidade, afirma ser vítima de perseguição política e denuncia sérias irregularidades nos processos judiciais contra ele.
No mês de junho, foi detido em Miami o ex-secretário de imprensa Vladimiro Montesinos, Augusto Bresani, acusado de receber do Serviço de Inteligência Nacional 100 mil dólares mensais durante a campanha de reeleição de Fujimori para distribuição entre meia dúzia de jornais em troca da publicação de matérias que caluniaram ou insultaram deliberadamente políticos de oposição, jornalistas e meios de comunicação independentes. Desde então, Bresani, considerado também executor da campanha de desinformação do governo de Fujimori na chamada imprensa "pequena", tenta escapar do pedido de extradição apresentado contra ele pela justiça peruana, alegando ser vítima de perseguição política perante o Departamento de Imigração dos Estados Unidos. Em outubro, a juíza anti-corrupção Magaly Báscones recusou o pedido do advogado de Bresani para trocar o mandado de prisão pelo de comparecimento.
A seguir, em ordem cronológica, outros fatos relevantes relacionados à liberdade de imprensa durante o último período.
O jornalista Luis Alberto Cuellar Alanoca, correspondente da Radio Programas del Peru e comentarista do noticiário "Atico en la Noticia" que é transmitido pela emissora APQ, foi agredido verbalmente em 26 de março pelo prefeito de Atico, Milton Medina Urday, na província de Caravelí de Arequipa, em represália às críticas à sua gestão como prefeito.
Em 26 de março, a diretora da publicação quinzenal El Búho, Mabel Cáceres Calderón, recebeu uma caixa que continha vísceras de animais e uma ameaça que dizia: "chegou a sua hora, maldita". Cáceres disse que não é a primeira vez que é ameaçada de morte e atribuiu as agressões a denúncias publicadas pelo El Búhode Arequipa sobre supostos casos de nepotismo na Universidade de San Agustín, de Arequipa.
O diretor da Unidade de Serviços Educativos de Huanta, em Ayacucho, Homero Trejo González, ameaçou e agrediu verbalmente em 4 de abril os jornalistas Eduardo Pinela do programa "Testigo de la Noticia" e Carlos Buendía, de "Radioperiódico 2000" da rádio Huanta 2000, em represália pela divulgação de informações críticas à sua gestão pública.
O jornalista Hugo González Hinostroza, do jornal Liberación, foi ameaçado pelo telefone em 11 de abril por uma pessoa que não se identificou, enquanto cobria informações na cidade de Huaraz, sobre a contaminação ambiental em Atupa.
Três jornalistas do jornal El Tiempo¸ da cidade de Piura, María Irina Mauricio Trelles, Genaro Guerrero Zurita e a diretora do jornal, Luz María Helguero, foram processadas em 31 de abril por meio milhão de dólares por suposta difamação, depois de publicarem uma denúncia sobre assédio sexual que envolvia Manuel Eduardo Cevallos Flores, ex-presidente da Comissão do governo da Faculdade de direito da Universidade Nacional de Piura.
Membros da Frente Patriótica de Loreto agrediram em 14 de maio o repórter Darwin Paniagua, da Radio La Voz de la Selva, de Iquitos, quando cobria o encontro nacional convocado por diversos sindicatos do país. O jornalista foi levado para o hospital da cidade.
Yorka Poémape e Edwin Tarazona, repórteres da Panamericana Televisión, foram agredidos por um grupo de moradores da Vila Militar de Chorrillos, ao entrarem sem autorização, em 21 de maio, no conjunto habitacional em busca do recém-libertado general do exército Augusto Jaime Patiño, que havia sido detido por sua participação na operação Chavín de Huantar para libertar os reféns das forças MRTA na residência do embaixador em 1997.
Em meados de junho, cinco jornalistas da Radio Líder e três da Radio Melodía de Arequipa foram denunciados por Luis Gutiérrez Cuadros, que deixava o cargo de prefeito de Arequipa, por suposta apologia do terrorismo. O ex-prefeito acusou os jornalistas de utilizar as emissoras de rádio para incitar o povo a cometer atos violentos durante as ações de protesto ocorridas nessa cidade contra a privatização das empresas Egasa e Egesur. Os jornalistas que ele criticou são Robert Silva Fernández, Walter Castillo Chávez, Federico Rosado Zavala, do programa "Melodía en la Noticia", e Eduardo Coahuila Ortiz, Benjamín García Sucila, Jorge Velásquez González, Hugo Rucano Paúcar e José Urrea Ríos, da Radio Melodía.
O repórter gráfico do jornal La República, José Abanto Cerdán, foi atingido por uma bomba molotov na cabeça enquanto cobria o conflito entre os manifestantes e a polícia na cidade de Arequipa. Os manifestantes também atacaram o escritório da Editora Perú que publica o diário oficial El Peruano naquela cidade.
Em 17 de junho, a correspondente em Chimbote do jornal Liberación, Marilú Gambini, foi ameaçada e perseguida por desconhecidos por investigar atos de corrupção supostamente cometidos por membros do Poder Judiciário de Chimbote e pessoas ligadas ao ex-Banco da República. Meses antes, desconhecidos assaltaram e raptaram o filho da correspondente em suposta represália por denúncias jornalísticas feitas por ela.
Bernabé Calderón, enviado especial do jornal El Comercio a Madre de Dios, foi agredido em 5 de julho por um grupo de manifestantes que levaram sua máquina fotográfica.
A Procuradoria especial solicitou, em 11 de julho, à juíza anti-corrupção Magali Báscones que declarasse a Editora Sport S.A. como terceira parte civilmente responsável no caso contra seu proprietário, Moisés Wolfenson. Segundo o pedido, parte do dinheiro que Wolfenson teria recebido do SIN "em troca de difamar através dos seus jornais os opositores ao regime fujimorista", teria ido para a empresa que edita os jornais El Chino e El Men. Por isso, disse, a empresa deve assumir solidariamente o pagamento da indenização civil que será fixada caso o empresário seja condenado.
O Primeiro Tribunal Anti-corrupção decidiu, em 11 de julho, que o Laboratorio de Grafotécnica realizasse uma perícia do contrato de compra e venda da nova gráfica onde é impresso o jornal El Tío. Segundo o contrato, a máquina teria custado 180 mil dólares. Entretanto, segundo José Olaya, dono do jornal, a assinatura que aparece no referido contrato é falsa. Segundo sua versão, a máquina custou 80 mil dólares. Olaya nega as acusações.
Os jornalistas Henry Ramírez, da Televisión Nacional de Perú; Luz Martínez, da Frecuencia Latina, e Perla Villanueva, do Canal N, foram agredidos em 5 de agosto por funcionários da empresa agroindustrial Casagrande na cidade de Trujillo quando exigiam o pagamento de seu salário. Os repórteres que cobriam o protesto foram agredidos por um grupo de manifestantes que tentaram confiscar seus equipamentos de trabalho.
Em 11 de agosto, seis anos depois do incidente, o Conselho Nacional da Magistratura destituiu quatro vogais por má conduta no processo movido por Francisco Diez Canseco Távara contra o jornalista César Hildebrant. A decisão diz que os vogais estenderam injustificadamente o processo até sua prescrição. Hildebrant havia apresentado em seu programa uma reportagem na qual informava que Diez Canseco Távara organizava festas barulhentas até altas horas da noite, perturbando o sossego dos vizinhos.
As repórteres Ximena Pinto e Milagros Aro, do programa dominical "Cuarto Poder", da América Televisión, foram agredidas em 14 de agosto por membros do grupo evangélico Iglesia Comunidad del Espíritu Santo "Pare de Sufrir", quando tentavam obter informações para uma reportagem sobre os ritos realizados na congregação. Quando as jornalistas tentaram retirar-se do lugar, foram cercadas por um grupo de cerca de 10 pessoas que as agrediram e as levaram a um quarto escuro onde deram continuidade às agressões. O objetivo era retirar sua mochila que continha um câmara de vídeo. A polícia interveio depois que as duas conseguiram escapar. Ninguém foi preso.
A jornalista Mary Espinoza Santiago, diretora e apresentadora do programa jornalístico "El Regional Informa", da Radio Studio 99, de Sátipo, foi ameaçada de morte em 22 de agosto por Williams Perka Chamba, depois que a jornalista denunciou em seu programa que veículos do Projeto Especial Pichis-Palcazu estavam sendo utilizados para levar militantes do Peru Possível à cidade de La Merced para registrar candidatos às próximas eleições regionais e municipais.
Três membros do Partido Ação Popular agrediram, em 26 de agosto, o repórter gráfico do jornal La Industria, Josué Ibarra Julca, quando este colhia informações na sede do referido grupo político em Chimbote.
Um grupo de terroristas do autodemoninado Partido Comunista do Peru ameaçou, em 26 de setembro, um grupo de jornalistas e obrigou-os a transmitir suas mensagens políticas. Os subversivos enviaram duas mensagens amedrontando os jornalistas Gudelia Machaca, Dósito Marmanillo e Pedro Yarasca, da Radio Estación Wari, e Johnny Medrano e Héctor Oré, da Radio Melody. A primeira mensagem dizia "conhecemos seus familiares, temos mil olhos e mil ouvidos". A segunda mensagem exigia que o governo peruano fechasse a prisão onde se encontram Abimael Guzmán Reynoso e Elena Iparraguirre, líderes do Sendero Luminoso. Diante do ocorrido, a polícia entrou na estação de rádio para confiscar os documentos e intimou os jornalistas a prestar depoimento sobre o ocorrido.
Segundo um relatório do Departamento de Controle da Magistratura (OCMA), divulgado no início do mês de outubro, a juíza Carmen Escalante cometeu sérias irregularidades que comprometem o processo judicial entre os advogados da Panamericana Televisión e Genaro Delgado Parker pela administração do Canal 5 de televisão. Segundo a OCMA, a irregularidade ocorreu na forma de lidar com a medida cautelar apresentada por Delgado Parker, pois o juiz havia recebido esse documento em um disquete fora do tribunal.
Doris Aguirre, jornalista do jornal El Popular, foi agredida verbalmente em 7 de outubro pelo coronel Luis Valencia Hirano quando estava no prédio da Divisão de Investigação Criminal (DININCRI). Aguirre foi abordada pelo coronel no elevador do prédio e ele lhe disse que o elevador era de uso exclusivo de oficiais. O Coronel Valencia manteve por 15 minutos o elevador no subsolo do prédio enquanto insultava a jornalista.
A apresentadora de televisão Laura Bozzo Rotondo, da cadeia norte-americana Telemundo¸ foi presa na sua residência no Peru e acusada de irregularidades por ter vínculos com Montesinos. Enviou uma denúncia dizendo que é "vítima de uma prática jornalística irresponsável e difamatória".
Madrid, Espanha