Continua sem resolução o recurso de inconstitucionalidade apresentado perante o Supremo Tribunal de Justiça contra a lei No 372, que criaria o Colégio de Jornalistas na Nicarágua. Em 17 de dezembro de 2001, o Supremo Tribunal pediu aos autores da ação que fornecessem mais informações sobre os danos materiais que a referida lei poderia lhes causar. Esse requisito, segundo os advogados e alguns magistrados do Tribunal, já havia sido rejeitado em uma reforma da Lei de Amparo. Como o recurso foi apresentado no período e formas apropriados por algumas pessoas que entraram com o recurso de inconstitucionalidade e como os querelantes não se apresentaram, o recurso tem validade.
Entretanto, a afiliação obrigatória ainda não entrou em vigor por causa de discordâncias entre as duas associações profissionais de jornalistas que devem compor o Colégio.
O presidente Enrique Bolaños, que assumiu o cargo em 10 de janeiro de 2002, distanciou-se do ex-presidente Arnoldo Alemán antes de tomar posse e prometeu que "ninguém ficará acima da lei". Disse que lutaria contra a corrupção sem considerar quem poderia estar envolvido.
O primeiro escândalo de corrupção que foi divulgado foi a perda de US$ 1,8 milhão que várias agências do governo designaram ao Canal 6 de Televisión, do governo, sob ordens de Alemán, supostamente para pagar dívidas de mais de US$ 2 milhões. Como conseqüência, o novo governo decidiu fechar, em 9 de abril, a emissora do Estado com a intenção de reabri-la como um canal educativo.
A polícia prendeu, em 23 de abril, Byron Jerez, ex-diretor-geral de Receitas e vice-ministro da Fazenda do governo de Alemán, quando ia para o aeroporto rumo ao Panamá. As investigações que se seguiram à sua prisão implicaram altos funcionários do governo de Alemán e até o ex-presidente.
Entre as acusações feitas a Jerez, que se encontra agora na prisão, está a de adquirir veículos de luxo com notas de crédito do governo, e de vendê-los em seguida em benefício próprio ou dar os veículos do Estado de presente para particulares. As listas das pessoas que receberam 23 carros de Jerez incluem um bispo católico ligado ao ex-presidente Alemán. Esse fato, e as constantes reportagens em alguns meios que mencionam membros da Igreja Católica ligados ao governo de Alemán, provocaram uma resposta da Conferência Episcopal da Nicarágua, realizada em 11 de maio, que acusou os meios de comunicação de praticarem uma "manipulação dominante", de assolar a população com manchetes sensacionalistas, de desinformação e falta de verdade.
Uma denúncia que envolvia supostos crimes graves, como lavagem de dinheiro e narcotráfico, supostamente cometidos por um general do Exército da Nicarágua, publicada no La Prensa em 18 de julho, fez com que o general pedisse à Polícia Nacional que iniciasse uma investigação. A polícia obrigou o jornalista do La Prensa, Luis Felipe Palacios, a se apresentar no Departamento de Investigações Criminais (DIC) onde foi pressionado para que revelasse a fonte de sua informação. A polícia disse que tem o direito de atuar em casos de lavagem de dinheiro e narcotráfico sem o envolvimento de um tribunal. Palacios pediu a seu chefe de redação e a uma equipe de repórteres do jornal que o acompanhassem, mas o chefe do DIC quis impedi-los de entrar. Irritou-se com as tentativas de fotografá-lo e ameaçou o fotógrafo de tirar o filme de sua máquina à força.
Os jornalistas que fizeram a cobertura nas instalações do Partido Liberal da reunião em que se anunciou o boicote à Assembléia Nacional por parte dos legisladores que apóiam Alemán e o anúncio da expulsão de sete deputados desse partido que votaram pela destituição da diretoria anterior foram alvo de agressões verbais de acalorados simpatizantes liberais e alguns repórteres foram inclusive agredidos fisicamente durante vários minutos.
A nova liderança da Assembléia Nacional decidiu revisar todos os projetos de lei que estavam engavetados e encontrou, entre eles, dois que são ameaças nítidas à liberdade de imprensa:
O primeiro é a "Lei que regula o crime de desacato a órgãos do Estado", com penas de até 5 anos de prisão para os ofensores condenados. Essa iniciativa não era dirigida especificamente contra os meios de comunicação, entretanto aqueles que publicassem o desacato, alvo da condenação, teriam de publicar a sentença de condenação na íntegra.
O deputado liberal Fernando Avellán, que apresentou esse projeto de lei que provocou um protesto generalizado dos meios, declarou que "a diabólica iniciativa era obra de Arnoldo Alemán". Explicou que o ex-presidente pediu-lhe que a apresentasse, o que ele fez sem lê-la, mas que a retiraria imediatamente. Avellán é agora um dos deputados dissidentes de Alemán que votaram para mudar a liderança da Assembléia Nacional.
O segundo é a "Lei de proteção civil do direito à vida privada e família, honra, reputação e imagem". Quando esse projeto de lei foi divulgado, seu autor, o também deputado liberal Vladimir Pineda, explicou que havia cometido um erro e pediu desculpas aos jornalistas. A maioria dos supostos crimes tipificados nessa iniciativa de lei já estão incluídos no Código Penal.
Em 23 de setembro, o jornal La Noticia, que era patrocinado e mantido com anúncios do governo durante o governo de Alemán, foi fechado depois que o novo governo aplicou a política de distribuir os anúncios de acordo com sua circulação. O La Noticia, que tinha apenas 2,5% da circulação dos jornais, não recebia publicidade de empresas privadas.
A rádio La Poderosa foi fechada em 11 de outubro por ordem do Telcor, órgão do governo encarregado de conceder e retirar as freqüências de rádio do país. La Poderosa é praticamente a porta-voz de Alemán e transmite seu programa pessoal "El diputado habla con su pueblo" ("O deputado fala com seu povo") e foi denunciada por atacar o presidente Bolaños, a primeira-dama e membros do governo com expressões vulgares e de transmitir ameaças de morte ao presidente.
Segundo o Telcor, a freqüência da La Poderosa havia sido concedida à COPROSA, uma entidade da Igreja Católica que a cedeu ao grupo político e empresarial que a estava operando. Mas a COPROSA estava em situação de ilegalidade. De acordo com a lei, a concessão da freqüência era nula e por isso era preciso fechá-la. O Telcor deu às autoridades da Igreja Católica a oportunidade de legalizar a situação para que pudessem continuar usando a freqüência, mas até agora não houve resposta. Em declarações públicas, o cardeal Miguel Obando Bravo informou que a Igreja não tem recursos para instalar uma rádio e aproveitar a referida freqüência.
Os donos da La Poderosa, Arnoldo Alemán e o Partido Liberal denunciaram o fechamento da rádio como uma represália política e uma agressão à liberdade de expressão.
Praticamente toda a sociedade deplorou o fechamento da La Poderosa, não por estar de acordo com a rádio, mas por considerar que nenhum meio de comunicação deve ser fechado pelo governo.
Na tarde de 22 de outubro, um conhecido ex-comandante da Resistência Nicaragüense (Contras), Tirso Moreno, apelidado Comandante Rigoberto, invadiu as instalações do La Prensa armado, e, depois de desferir vários disparos, manteve como reféns 12 repórteres e fotógrafos do jornal. Moreno, que estava bêbado, tentou justificar seu crime culpando o La Prensa pela morte, naquela tarde, em um lamentável acidente, do filho mais velho do ex-presidente Alemán. Moreno disse que as reportagens do jornal haviam criado uma situação de guerra no país. "Se querem guerra, irão tê-la", gritou, ao entrar violentamente nas instalações do La Prensa.
O incidente foi resolvido pouco depois com a intervenção da polícia e Moreno se entregou pacificamente às autoridades e foi encaminhado para o juiz pertinente. O La Prensa moveu processo contra ele. O presidente Bolaños declarou na sexta-feira, 25 de outubro, que não intercederia por Tirso Moreno como lhe haviam solicitado alguns membros da Resistência, "já que nada pode estar acima da lei", disse o presidente.
Um tribunal de recursos de Manágua decidiu em 25 de outubro emitir decisão em favor da COPROSA, a concessionária da licença 560, para que não seja afetada, mas mantém firme o fechamento da rádio até que o Supremo Tribunal decida o recurso de amparo. Por isso, o TELCOR não poderá fazer a licitação da freqüência. O cardeal Obando declarou que a arquidiocese ainda não tomou nenhuma decisão sobre a freqüência. O porta-voz do Partido Liberal (arnoldista), Eliseo Núñez, declarou que seriam reiniciadas as programações da rádio e desafiou o TELCOR a tentar fechá-la novamente.
Madrid, Espanha