Paraguai

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A liberdade de imprensa está sendo afetada pela ação da justiça, que mais uma vez demonstrou sua tendência a favorecer os homens fortes do governo em vez de consagrar o direito inalienável do povo à liberdade de expressão e de imprensa. Um Tribunal de Apelações aplicou uma multa de 120.000 dólares ao diretor do jornal ABC Color, Aldo Zuccolillo, em um processo por difamação, calúnia e injúrias movido contra ele pelo influente político e senador do Partido Colorado (do governo), Juan Carlos Galaverna, violador confesso da Constituição e freqüentemente mencionado como suposto protagonista de atos de corrupção ou como protetor de funcionários, políticos ou pessoas supostamente envolvidas em suborno, nepotismo ou negócios duvidosos. A sentença do tribunal foi considerada um atentado à liberdade de expressão e de imprensa por conhecidos homens públicos e juristas, que destacaram o perigo que representa o fato de a justiça proteger funcionários cujos nomes estão envolvidos em fatos obscuros em vez de investigá-los. Abundaram novamente as ameaças contra jornalistas feitas por policiais ou homens públicos, afetados por denúncias e críticas de vários meios por corrupção. Em 18 de outubro, Esteban Samaniego, senador do Partido Colorado, saiu em defesa de seu colega Juan Carlos Galaverna, cujo nome é freqüentemente relacionado a supostos atos de corrupção. Samaniego protestou "pelas intrigas constantes que sofreu (Galaverna) por parte de um jornal", em alusão ao ABC Color, e perguntou "qual era o poder de Aldo Zuccolillo". Samaniego perguntou também por que o Senado nunca se preocupou em investigar Zuccolillo, a quem atribuiu "infrações ao poder Judiciário, ao poder Legislativo e também ao poder Executivo". Vicenta Risso, correspondente do jornal ABC Color, no departamento de Presidente Hayes, a oeste de Assunção, denunciou uma ameaça de morte por parte de Eusebio Vergara, assessor político do governador do citado departamento, Eugenio Escobar Cattebeke. Durante as eleições municipais realizadas em 18 de novembro, Risso fotografou um veículo estatal sendo utilizado em favor do Partido Colorado, ao qual o governador é afiliado. Aborrecido com a atividade da correspondente, Vergara disse-lhe: "Continue tirando fotos para levar de lembrança para sua tumba", ameaça que repetiu duas vezes. Nos dias seguintes, Risso recebeu ameaças telefônicas semelhantes anônimas e apresentou queixa na polícia e perante a procuradora do departamento. Em 20 de novembro, o diretor do ABC Color prestou depoimento em um processo movido por Abel Florentín Mendoza, militante do Partido Colorado que foi nomeado para o departamento comercial do Banco Nacional de Desenvolvimento. O ABC Color publicou que o referido funcionário havia sido processado anteriormente por supostos crimes de fraude e lavagem de dinheiro, o que o desqualificaria para ocupar o cargo mencionado. Florentín Mendoza moveu processo observando que recebeu ameaças anônimas depois da publicação. Zuccolillo foi chamado a depor pelo juiz Juan Carlos Paredes e, na ocasião, defendeu o direito da imprensa de formular críticas aos homens públicos e de manter o sigilo de suas fontes. Entretanto, em 7 de fevereiro, Florentín Mendoza moveu processo por calúnia contra o diretor do jornal ABC Color. O demandante afirmou que se sentiu ofendido pela publicação e que devido a esta viu-se obrigado a renunciar a seu cargo. Garantiu ter recebido uma mensagem anônima na sua secretária eletrônica que dizia: "Não se esqueça de ler a página 12 do ABC. Isso é apenas o começo do que lhe espera". O processo continua em trâmite. O ministro Juan Ernesto Villamayor, responsável pela Secretaria da Reforma do Estado, responsável pela privatização das empresas estatais, acusou, em declarações feitas à Radio Uno em 6 de dezembro, o diretor do jornal Noticias, Eduardo Nicolás Bo, de ter pedido que manipulasse a política de comunicações de sua instituição para salvar seu jornal, que estava supostamente à beira da falência. O funcionário acrescentou que depois da negativa do governo, começaram os ataques contra ele e o projeto de privatização. "O senhor Bo pediu-me diretamente que manipulasse a política de comunicação da Secretaria porque seu jornal estava a ponto de quebrar", disse Villamayor. O diretor do Noticias negou a acusação e observou que uma vez em que Villamayor lhe fez uma reclamação em relação a um artigo, colocou à sua disposição as páginas do jornal para uma réplica. Garantiu nunca ter pedido que manipulasse a política de comunicação do órgão em que trabalhava. Em 4 de janeiro de 2002, o jornalista Hernando Sevilla recorreu à procuradoria-geral para solicitar indenização do Estado por ter sido preso e torturado durante a ditadura de Alfredo Stroessner, que terminou em 1989. Sevilla relatou que em 6 de fevereiro de 1981 foi seqüestrado na sede do desaparecido jornal Hoy, onde trabalhava, e foi levado para uma pequena cela onde sofreu todo tipo de vexames até ser libertado, em 29 de setembro de 1982. O jornalista explicou que, por ter nacionalidade argentina, a polícia o acusou de ser um dos chefes do grupo que matou, em Assunção, o ex-ditador nicaragüense Anastasio Somoza, em setembro de 1980. Depois de ser libertado, o jornalista viveu seis anos na Suécia. Em 9 de janeiro, uma delegacia da cidade de San Juan Bautista, 300 km a sul de Assunção, advertiu o correspondente do ABC Color nesse local, Rafael Marcial Montiel, de que uma chamada anônima para a delegacia havia informado que a vida do jornalista corria perigo. O delegado Aníbal Rojas perguntou-lhe se tinha problemas pessoais com alguém ou se algum artigo seu poderia ter motivado a ameaça e lhe ofereceu proteção. O correspondente escreveu vários artigos denunciando irregularidades administrativas no governo de Missiones (departamento cuja capital é San Juan Bautista), o que provocou reações do povo que culminaram com a destituição do governador Egidio Ruiz Pérez. Esse havia movido, antes de sua destituição, um processo contra Montiel por difamação, calúnia e injúria, e houve dois outros processos movidos por funcionários do governo. Montiel denunciou a existência de policiais que eram membros de bandos de assaltantes de bancos e caminhões transportadores de valores. Em 13 de janeiro, o senador Juan Carlos Galaverna, do Partido Colorado, qualificou de "ignorantes" os jornalistas que cobrem as informações da Câmara e acusou a jornalista Francisca Pereira, do jornal La Nación, de ser "colaboradora do oviedismo" (em referência ao ex-general Lino Oviedo, refugiado no Brasil e acusado de ser mentor do assassinato do vice-presidente Luis María Argaña, em 1999). Galaverna ataca freqüentemente a imprensa devido às constantes publicações que afirmam que, aproveitando sua influência no atual governo, está supostamente envolvido em atos de corrupção. Em 15 de janeiro, o Sindicato de Jornalistas do Paraguai (SPP) fez uma manifestação em frente ao Parlamento para expressar sua preocupação pelos conflitos trabalhistas, com freqüentes recusas ou abandonos de processos, que afetam os profissionais da imprensa local devido às políticas de ajuste aplicadas pelas empresas jornalísticas por causa da má situação no país. Em 25 de janeiro, o diretor executivo do jornal Noticias, Marco Nicolás Bo Pastori, denunciou ter recebido ameaça de morte e ter tido uma arma roubada. Segundo a denúncia, em 21 de janeiro, ao meio-dia, ao sair de um restaurante, encontrou uma mensagem no pára-brisas de seu carro que dizia: "Amigo Bo: cuide-se porque escutei da boca do capitão Néstor Melgarejo em uma reunião de amigos do UNACE (movimento político do ex-general Lino Oviedo) que estariam oferecendo 200.000 dólares pela sua cabeça. Ninguém aceitou, mas se oferecerem mais dinheiro haverá pessoas que vão se animar a fazer o trabalho. Não vou me identificar para garantir minha segurança e porque tenho medo desse pessoal, que sei que vai se animar. Cuide-se". A denúncia acresenta que na noite do mesmo dia Pastori visitou sua mãe em sua casa e ao sair encontrou a janela traseira do seu carro quebrada e percebeu que faltavam no carro uma pistola e uma maleta na qual guardava sua agenda. O roubo foi denunciado em uma delegacia e em 24 de janeiro Pastori recebeu outra ameaça em seu telefone celular, em guarani, que traduzida seria: "Você vai morrer por sua própria arma". Em 12 de fevereiro, o Tribunal de Apelações composto pelos juízes Tomás Damián Cárdenas, Gustavo Ocampos e Carlos Bray, condenou o diretor do jornal ABC Color, Aldo Zuccolillo, a pagar uma multa de 541 milhões de guaranis (120.000 dólares), em um processo movido contra ele no final de 1998 pelo senador do Partido Colorado, Juan Carlos Galaverna, alegando crimes de difamação, calúnia e injúria, e solicitando um ressarcimento de 1,1 milhão de guaranis. Galaverna é um senador que se vangloriou publicamente por ter violado a Constituição, sem que suas palavras tenham tido efeitos negativos para sua pessoa nem por parte da justiça nem de seus pares parlamentares. O ABC Color publicou artigos que vinculavam Galaverna à fraude no Banco Nacional de Trabalhadores (BNT), o qual posteriormente faliu. Em primeira instância, o juiz Hugo López condenou Zuccolillo a pagar uma multa de 470 milhões de guaranis, soma que foi aumentada agora por um tribunal de apelações. Esse Tribunal de Apelações atribuiu a Zuccolillo frases que, ainda que publicadas no ABC Color, correspondem a outras pessoas, como o assassinado vice-presidente Luis Argaña, que classificou Galaverna de "ladrão de galinhas". Com respeito a outro adjetivo utilizado pelo jornal ao se referir ao legislador, o de ser protetor político do ex-presidente do BNT, Edgar Cataldi, o mesmo Tribunal de Apelações admitiu em sua sentença, em que condenou esse funcionário a 10 anos de prisão, a figura da "associação ilícita", com a qual abriu a possibilidade de incluir no processo pessoas influentes. O senador Diógenes Martínez, do Partido Colorado (o mesmo de Galaverna), disse que há denúncias contra Galaverna que a justiça deveria investigar antes de condenar a imprensa. Galaverna solicitou a inconstitucionalidade da sentença do tribunal porque pretende que se dite pena carcerária para Zuccolillo. O Tribunal de Apelações havia admitido apenas a figura da difamação (não a de calúnia e injúria) e estabeleceu a multa mencionada, que deve ser recebida pelo Estado e não por Galaverna. Por isso, este pede também para mudar a figura jurídica pela da "composição", que permitirá que ele pessoalmente receba a indenização. Fiel à linguagem grosseira que gosta de usar, Galaverna acusou os juízes do Tribunal de serem "cúmplices" de Zuccolillo e de estarem ligados a ele por dinheiro, homossexualidade ou por extorsão. Zuccolillo solicitou, através do jurista Alejandro Encina Marín, a inconstitucionalidade da sentença, reiterando os princípios jurídicos que regem universalmente o direito da imprensa de investigar os funcionários e esclarecer suas ações. Ambos os pedidos encontram-se na Suprema Corte. Em 13 de fevereiro, o Sindicato de Jornalistas do Paraguai (SPP) denunciou que alguns jornalistas que participaram da cobertura de um conhecido caso de seqüestro e torturas de dois militantes políticos de esquerda receberam ameaças por parte de policiais acusados de participar desses atos. Entre esses casos, citou-se o do jornalista Aníbal Emery, da rádio Nandutí. Em 20 de fevereiro, o Tribunal de Apelações de Ciudad del Este, a 330 km a leste de Assunção, rejeitou um processo movido contra o diretor do ABC Color, Aldo Zuccolillo, pelo comerciante árabe Ahmad Khalil Chams, residente nessa cidade, que se sentiu ofendido por artigos publicados no jornal sobre seus antecedentes criminais. Chams negou esses antecedentes, mas o ABC Color publicou uma ordem de prisão emitida contra ele pela Interpol do Panamá devido a um processo por suposta fraude, reproduzindo o fax da referida ordem policial. O juiz Víctor Benítez Rodas já havia rejeitado o processo em primeira instância. Em 1o de março, a Suprema Corte colocou um ponto final no processo movido pelo conhecido dirigente sindical Alan Flores contra o jornalista Jorge Villalba Digalo, chefe da seção de economia do jornal Ultima Hora, por supostos crimes de difamação e calúnia. Flores está atualmente na penitenciária de Assunção depois de ter sido condenado por um juiz a cumprir dez anos de prisão por sua participação na fraude do Banco Nacional de Trabalhadores (BNT), que faliu. O jornalista Villalba Digado publicou vários artigos nos quais denunciou a participação de Flores e outros dirigentes sindicais na contratação de empréstimos multimilionários sem consentimento da comissão diretora de suas centrais trabalhadoras, que contribuíram para a falência do BNT. Em 6 de março, um tribunal de recursos anulou uma sentença ditada pelo juiz Jorge Bogarín González em 27 de agosto de 2001, que havia absolvido o diretor do jornal Noticias, Eduardo Nicolás Bó Peña, em um processo por calúnia, difamação e injúrias que o empresário Reinaldo Domínguez Dibb ingressou contra ele. O Noticias havia publicado que em uma fazenda do mencionado empresário encontravam-se máquinas do estado que eram utilizadas para fins particulares, quando este exercia o cargo de presidente do Conselho Nacional de Esportes. O juiz Bogarín González, em uma sentença que foi considerada uma batalha ganha para a liberdade de imprensa, disse que o diretor do Noticias não tinha por que provar sua inocência, que não se comprovaram os elementos para que os fatos configurassem crimes e que o objetivo da publicação jornalística era a defesa do interesse público. O tribunal de recursos, entretanto, por decisão de dois dos seus três membros, Emiliano Rolón e Arnulfo Arias, afirmou que "... existe comprovação da realização de crime", enquanto o terceiro integrante, Luis María Benítez, votou contra e declarou que "não se comprovou a existência de calúnia, difamação e injúria".

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