Cuba

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A liberdade de expressão vive momentos deploráveis, situação agravada pela crise econômica que se agudizou depois da passagem de três furacões no final de 2008, da reduzida capacidade financeira do governo e da recente purga política na cúpula do governo. As perdas de 10 bilhões de dólares causadas pelos desastres naturais, a destruição de 30% dos cultivos e o aumento do preço dos alimentos e combustíveis no mercado mundial delineiam um panorama pouco alentador para um governo que acaba de cumprir 50 anos sem ouvir as queixas da comunidade internacional para que se instaure uma democracia. O governo do general Raúl Castro completou um ano, e as expectativas de mudança e as promessas de “transformações estruturais profundas” recuaram diante do imobilismo, da recentralização do poder nas mãos dos militares e personalidades que fazem parte há muito tempo da burocracia de Cuba, e dos controles sobre os meios de comunicação e o acesso à informação. Fidel Castro, aposentado, continua sendo um ponto de referência através das suas “reflexões” publicadas pela imprensa. O governo assinou no ano passado acordos internacionais sobre direitos humanos nas Nações Unidas – o Convênio Internacional para os Direitos Econômicos, Sociais e Culturais e o Convênio para os Direitos Civis e Políticos. Mas além do compromisso retórico, não se notou até agora nenhum avanço em benefício da circulação de informações, liberdade de associação e no tratamento dos jornalistas presos. Continuam sendo 26 os jornalistas presos, e suas sentenças vão de um ano a vinte e oito anos de prisão. O país se debate entre a necessidade de se abrir para o mundo exterior e a relutância em liberar as comportas internas. O Tribunal Supremo Popular promulgou a Instrução 88/2008 para recrudescer as sentenças judiciais e agir com rapidez máxima no combate ao crime. Em alguns locais no interior, aplicou-se a chamada Operação Vitória, um tipo de estado de sítio para controlar vendedores ilegais e especuladores. Continuam-se aplicando os controles de mobilidade dos cidadãos para impedir os deslocamentos não autorizados até Havana de pessoas que morem em outras províncias, segundo estipulado pelo decreto-lei 217 de abril de 1997, e essa vigilância afeta particularmente dissidentes e jornalistas independentes. Em Havana, mais de 1.000 policiais foram contratados esse ano para reforçar a vigilância e impedir infrações. Foram documentadas 85 ações repressivas desde o final de outubro contra o exercício do jornalismo independente em Cuba, inclusive multas, confiscos de dinheiro e materiais de trabalho, intimidações, apreensão de imóveis, detenções temporárias, demissões, deportações para a província de origem, interrupções de serviço telefônico, violações de correspondência e bloqueios de acesso à Internet. Os números superam a quantidade de medidas de perseguição registradas no semestre anterior. A perseguição do governo não afeta apenas os mais de 60 jornalistas independentes no país, mas também o incipiente movimento de blogueiros, que é ativo apesar do controle do governo sobre a Internet. Existem cerca de vinte blogs autônomos – vários escritos sob pseudônimo –, além dos mais de 300 blogs que pertencem a publicações do governo ou aprovados pelas autoridades. No início de dezembro, a polícia impediu a realização de um workshop de blogueiros na província de Pinar del Río, convocado pela revista alternativa Convivencia. Pelo menos cinco blogueiros, entre eles a internacionalmente conhecida Yoani Sánchez (Generación Y), foram intimados por agentes da Segurança do Estado que os avisaram que não tolerariam a realização do evento por considerá-lo uma “ação contrarrevolucionária”. A maioria dos blogs independentes não podem ser acessados de Cuba porque o governo bloqueia o sinal. As autoridades cubanas restringem o acesso da população à Internet, alegando a necessidade de se fazer um “uso social” da rede por causa do embargo dos Estados Unidos, que não permite que se faça a conexão por cabos submarinos de fibra ótica, e que obriga que esta seja feita por satélite. Foi promulgada em novembro a Resolução 179/2008 do Ministério de Informática e Telecomunicações (MINTEL), que estabelece regras rígidas para os provedores de serviços de Internet dentro de Cuba. Uma das cláusulas do decreto obriga os provedores a “adotar as medidas necessárias para impedir o acesso a sites cujos conteúdos sejam contrários ao interesse social, à moral e aos bons costumes; assim como o uso de aplicações que afetam a integridade ou a segurança do Estado”. O não cumprimento está sujeito à aplicação de medidas severas, tais como o cancelamento das licenças de operação. O governo prevê para 2010 a conexão com cabo de fibra ótica a partir da Venezuela, mas isso não significa que as autoridades vão permitir o acesso irrestrito à Internet, segundo declarou a MINTEL. Existem oficialmente em Cuba 1,4 milhão de usuários nacionais de redes de computador, mas apenas 30.000 pessoas têm acesso total à Internet. As tarifas públicas por uma hora de conexão à Internet em cibercafés e hotéis variam entre 6 e 8 dólares, mas o serviço é reservado principalmente aos estrangeiros. No início de março, um grupo de jornalistas independentes e ativistas dissidentes iniciou uma campanha maciça de coleta de assinaturas em âmbito nacional para pedir a abertura do serviço de Internet a toda a população. Em dezembro, ativistas e jornalistas cubanos exilados anunciaram que vão reeditar na Espanha a revista bimestral De Cuba, financiada com fundos privados e dedicada à produção jornalística da ilha. A publicação, que surgiu como um esforço editorial alternativo em 2002 publicou apenas três edições dentro de Cuba e foi utilizada como “evidência criminosa” contra seus organizadores nos julgamentos da chamada “Causa de los 75”, em 2003. A iniciativa pretende fornecer uma ajuda econômica aos jornalistas independentes, pagando-lhes por suas colaborações. O governo não aceitou os pedidos de órgãos internacionais e de familiares dos 26 jornalistas submetidos a condições cruéis na prisão, para que fossem libertados por razões humanitárias; vários deles sofrem de doenças crônicas. Algumas das situações mais alarmantes são: Normando Hernández, condenado a 25 anos, transferido em 25 de fevereiro para a prisão provincial Kilo 7, depois de passar um mês no hospital da penitenciária Combinado del Este, em Havana. Sofre de síndrome de má absorção intestinal, pólipos vesiculares e hipertensão arterial. Está também sob tratamento psiquiátrico. O governo cubano nega-se a considerar sua libertação mediante um visto humanitário concedido pelo governo de Costa Rica em abril de 2007, e além disso ele desde 2001 possui visto norte-americano para emigrar com sua esposa. José Luis García Paneque, condenado a 24 anos, preso em Las Mangas, na província de Granma. Sofre de anemia e desnutrição como resultado de má absorção intestinal. Diagnosticou-se também um cisto renal e ele sofre sérios distúrbios nervosos. Sua esposa e quatro filhos menores emigraram para os Estados Unidos no início de 2007. Alfredo Pulido López, condenado a 14 anos, na prisão de Kilo 7, em Camagüey. Sua situação piorou esse ano. Sofre de neuralgia occipital, osteoporose, problemas de coluna, gastrite crônica, hemorróidas intestinais, problemas respiratórios crônicos e transtornos mentais. Sua esposa, Rebeca Rodríguez, pediu apoio a instituições como a Cruz Vermelha Internacional para que intercedam a favor da sua libertação. Pedro Argüelles Morán, condenado a 20 anos, tem cataratas nos dois olhos e perdeu quase completamente a visão. Argüelles, de 60 anos, foi levado a uma solitária em 1º de março por se negar a vestir uniforme de réu comum. Pablo Pacheco, condenado a 20 anos, foi transferido para a prisão de segurança máxima de Canaleta, Ciego de Ávila. Pacheco tem de tratar diariamente de uma ferida na perna esquerda, que piorou por causa das condições de insalubridade da prisão. Negou-se em várias ocasiões a ir algemado da sua cela até a enfermaria, onde sua ferida é tratada. Entre os jornalistas presos encontra-se um deficiente: Miguel Galván Gutiérrez, engenheiro de profissão, sentenciado a 26 anos. O trabalho da imprensa estrangeira na ilha enfrenta também pressões governamentais. As autoridades aumentaram os controles para a concessão de vistos a correspondentes estrangeiros que tentam entrar na ilha para fazer coberturas temporariamente e limitaram as opções dos jornalistas credenciados como correspondentes permanentes. Em novembro, o Centro Internacional de Imprensa (CIP - Centro Internacional de Prensa - CIP), que supervisiona o trabalho da imprensa estrangeira, advertiu os correspondentes credenciados que não podiam viajar para as zonas afetadas pelos furacões sem a devida autorização das autoridades cubanas. Para a cobertura de atividades do governo, o CIP impôs regras rígidas, desde a chegada pontual para a “inspeção técnica” dos jornalistas estrangeiros até o uso de “roupas apropriadas”. A imprensa oficial publicou cartas de leitores com ataques aos correspondentes estrangeiros que supostamente distorcem a realidade nacional ou são incapazes de avaliar o “sentimento popular” em relação ao seu líder Fidel Castro. O próprio Fidel Castro queixou-se em uma das suas recentes “reflexões” (12 de fevereiro de 2009) dizendo que “algumas agências e publicações” o haviam chamado de velho, dito que está convalescendo de uma doença grave ou usado “algum outro adjetivo para diminuir o modesto valor” das suas declarações. Em comemoração aos 50 anos do triunfo revolucionário de 1959, a imprensa oficial tem dedicado desde o ano passado grandes espaços a discursos e episódios históricos na vida de Fidel Castro, a quem chamam de “guia e estímulo permanente para o jornalismo”. Em fevereiro, o governo cubano apresentou um relatório ao Conselho de Direitos Humanos da ONU no qual afirma na seção dedicada a direitos civis e políticos: “Em Cuba existe um amplo debate sobre os mais variados temas da vida política, econômica, social e cultural, tanto da nação quanto do resto do planeta (...) se propicia a mais livre criação, o que produz uma imensa atividade intelectual, refletida em diversas publicações que circulam de forma habitual por todo o país, e nas diferentes obras geradas pela grande diversidade do nosso movimento artístico. Existem no país 723 publicações periódicas, 406 impressas e 317 digitais, e 91 emissoras de rádio”.

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