Houve uma relativa calma na relação entre os meios de comunicação e o Governo neste semestre. O presidente Fernando Lugo e outros funcionários mantêm o compromisso de não incentivar legislação que regule ou restrinja a liberdade de imprensa e o exercício do jornalismo.
Em sua mensagem anual no Congresso Nacional, em 1° de julho, Lugo enfatizou que o governo não dará um passo atrás na defesa de um jornalismo livre que promova uma verdade sem mordaças. Dias mais tarde, em visita ao jornal ABC Color, ratificou que não será levantado um dedo contra a liberdade de imprensa. Depois, em 18 de agosto, o ministro de Comunicações, Augusto dos Santos, desmentiu o rumor de que uma lei de imprensa estava sendo estudada, ainda que tenha defendido a auto-regulamentação dos meios.
Outra notícia positiva foi a instauração pelo Poder Executivo do Prêmio Santiago Leguizamón à melhor investigação jornalística sobre corrupção, cuja intenção é reconhecer o trabalho de Leguizamón, jornalista assassinado em uma localidade de fronteira há 20 anos.
Preocupa, entretanto, o plano do Governo com cerca de 700 rádios chamadas comunitárias e mais de 1.200 operadores disseminados por todo o país. Ainda não ficou claro qual é o propósito deste programa que mobiliza enormes recursos e que se assemelha mais a uma rede de propaganda governamental bem estruturada e financiada do que um plano de comunicação social.
O avultado orçamento de publicidade oficial e, sobretudo, os critérios de designação aos diferentes meios de comunicação também geram dúvidas, tendo sido divulgados em 20 de agosto grandes gastos em publicidade estatal.
Em governos anteriores, os fundos dirigidos à publicidade de entidades e campanhas oficiais eram usados abertamente para silenciar a imprensa ou ganhar favores de jornalistas e meios.
Há apenas duas semanas, o presidente da República agitou o país com um forte discurso em que criticava com dureza as classes altas, acusando-as de frear a mudança no país. O mandatário disse que aqueles que aparecem nas páginas sociais dos jornais e as pessoas endinheiradas eram um obstáculo para as transformações. As palavras de Lugo desataram uma tormenta de críticas, da qual tentou sair apelando a um recurso que todos conhecemos: culpar a imprensa. Lugo declarou dias depois que a imprensa tinha destorcido suas palavras e que tinha tirado muitas frases de contexto. Acrescentou que os meios tinham carregado na tinta com motivações não muito claras.
O crime organizado continua sendo o maior perigo para a imprensa. Zonas rurais de fronteira com o Brasil são territórios sem lei onde florescem e se consolidam máfias, narcotraficantes e contrabandistas que se infiltram e são confundidos com os organismos de segurança, por sua vez protegidos por políticos locais. A falta de defesa de meios e jornalistas é tal que a autocensura é prática comum.
Em 21 de junho, a casa do jornalista Santiago Benítez da rádio Mburucuyá de Pedro Juan Caballero, cidade de fronteira com o Brasil, foi atacada a balas por desconhecidos. Certas informações divulgadas por Benítez sobre a atividade de narcotraficantes teriam motivado o atentado. Santiago Leguizamón foi diretor dessa rádio.
O amedrontamento de jornalistas por meio de chamadas ou mensagens de texto é comum nos departamentos de Amambay, Canindeyú, Alto Paraná e San Pedro.
Estes locais acolhem contrabandistas de madeira e cigarros e produtores de maconha, servindo de trânsito ao tráfico de cocaína para o mercado brasileiro. A Anistia Internacional, capítulo Paraguai, reclamou garantias para os jornalistas aos governos central e locais.
Algumas restrições à liberdade de imprensa vêm de alguns juízes cujas sentenças terminam impondo penas absurdas a jornalistas ou restringindo o acesso à informação. Cirilo Ibarra, correspondente de um jornal na cidade de Limpio, na área metropolitana de Assunção, deverá enfrentar um processo por publicar as opiniões de outras pessoas com referência a um político do partido Colorado, Gustavo Bello. No aviso do processo apresentado por Bello se deduz que sua participação (a de Ibarra) foi fundamental para a difusão de calúnias contra meu bom nome.
O juiz Manuel Aguirre aceitou este argumento e levou a causa a voto oral.
Um caso mais complexo teve a ver com a jornalista de rádio Mina Feliciángelli, que recorreu à Justiça perante a negação do Governo de permitir uma entrevista com a dirigente de esquerda Carmen Villalba, condenada a 18 anos de prisão pelo sequestro de Edith de Debernardi.
Villalba é porta-voz do Exército do Povo Paraguaio (EPP), grupo armado que reivindicou a autoria de vários assaltos e sequestros, um deles ainda em curso no momento da redação deste relatório. Ela se encontra reclusa na penitenciária de Buen Pastor, em Assunção, local para onde foi Feliciángelli para realizar a entrevista. O Ministério de Justiça e Trabalho, organismo responsável pelas penitenciárias do país, negou a permissão alegando que as instituições públicas não podem ser usadas para a difusão do terror, para o chamado à rebelião ou a geração de motins. Feliciángelli apelou com o argumento de que se estava cerceando princípios constitucionais da liberdade de acesso à informação. Finalmente, em 19 de maio, o juiz Miguel Fernández rejeitou o amparo promovido pela jornalista porque, segundo sua resolução, ainda não se havia esgotado a via administrativa.
Principais fatos do período:
- Em 24 de abril, ainda que a agência informativa do Governo tenha sido lançada com o propósito de apresentar um país real, objetivo segundo palavras do ministro de Comunicações, o escândalo pela paternidade do Presidente não mereceu comentário algum no portal da Internet.
- Em setembro, manifestantes que apóiam a desapropriação de grandes extensões de terra em Puerto Casado, em Chaco, apedrejaram e ameaçaram jornalistas que cobriam a marcha. A fúria dos manifestantes deveu-se ao fato de que vários meios de imprensa se declararam contrários à desapropriação destas terras.
Madrid, Espanha