O clima de tensão em que a imprensa realiza o seu trabalho não diminuiu neste período.
Muito pelo contrário, tivemos um aumento das tensões, com casos como o fechamento da rádio La Voz de Bagua, a prisão arbitrária do diretor do semanário Noz Oriente de Bagua Grande ou o risco de que o assassinato do jornalista Alberto Rivera fique na impunidade.
Um dos incidentes mais graves ocorreu, porém, em meados de março, quando membros do alto escalão do poder Executivo alertaram sobre uma suposta, e hoje relativamente clara intenção do governo do presidente Alan García Pérez de interferir nos assuntos privados de um grupo de meios de comunicação.
A tentativa de intervenção na Panamericana Televisión pela Superintendência Nacional de Administração Tributária (SUNAT), em junho de 2009, foi revertida, mas no caso da América Televisión a advertência veio do Poder Executivo.
Em 10 de março, ao encerrar uma sessão do Conselho Ministerial e com o apoio do primeiro-ministro, Javier Velásquez Quesquén, o ministro da Justiça, Aurelio Pastor, exigiu, em nome do governo, que o Congresso e o Ministério Público deveriam investigar a reabertura independente em 2001 da America Televisión em 2001.
Essa declaração foi rejeitada por instituições e pela opinião pública.
O presidente do conselho de administração da América TV, Luis Miró Quesada, criticou as declarações do ministro Pastor e as tentativas de intervenção do poder político.
A declaração do ministro Pastor parecia indicar que havia por parte do governo um apoio tático para as medidas legais do ex-proprietário da América TV, José Enrique Crousillat, condenado a oito anos de prisão por receber 69 milhões de sóis de Vladimiro Montesinos, ex-assessor do ex-presidente Alberto Fujimori, em pagamento pela compra e venda da linha editorial do canal.
Coincidentemente, José Enrique Crousillat havia sido beneficiado por um indulto presidencial em dezembro por razões humanitárias, o que foi considerado um retrocesso no processo de luta contra a corrupção, que teve início depois do governo de Fujimori.
Em 13 de março, o presidente Alan García revogou o indulto, diante das revelações da imprensa que deixavam claro que os motivos de saúde pelos quais ele havia concedido o indulto a José Enrique Crousillat eram fraudulentos.
Em 17 de março, o ministro Pastor, envolvido no escândalo por ser o responsável político pelo indulto a Crousillat, reagiu diante dos fatos e acusou o grupo El Comercio de prejudicar a estabilidade democrática do país, defendendo seus próprios interesses comerciais até mesmo às custas de desinformar o público, e encorajou os cidadãos a se colocarem contra os meios de comunicação. Isso aconteceu porque a mídia e políticos do seu próprio partido pediram que renunciasse.
O presidente do Conselho Ministerial, Javier Velásquez Quesquén, disse que o gabinete que ele preside não concordava com as declarações do ministro Pastor e que o governo respeitava a liberdade de expressão. Autoridades de alto escalão do governo reagiram também contrariamente às declarações do então ministro.
Em 17 de março, o ministro da Justiça foi afastado do cargo e substituído por Víctor García Toma.
Em 12 de janeiro, foi preso Alejandro Carrascal Carrasco, diretor do semanário Nor Oriente, da cidade de Bagua Grande, província de Utcubamba, departamento Amazonas. Carrascal foi detido por ordem do juiz Francisco Miranda, da Primeira Vara Penal, que o havia condenado a um ano de privação de liberdade por crime de difamação contra Víctor Feria, ex-diretor do Instituto Superior Tecnológico que havia movido ação contra ele em 2005.
Existem vários indícios de que se trata de perseguição política em represália pela cobertura que o semanário fez do violento confronto entre policiais e a população nativa conhecida como Baguazo e que resultou na morte de 24 policiais e 10 civis em 5 de junho de 2009.
O Conselho de Imprensa Peruano está interferindo nesse caso junto ao presidente do poder Judiciário, Javier Villa Stein, já que o Tribunal Misto de Recursos de Utcubamana, apesar de já terem vencido os prazos, continua adiando seu pronunciamento quanto à sentença e o recurso de anulação por irregularidades no processo.
Neste contexto, ocorreu o fechamento da rádio La Voz de Bagua em junho de 2009. A suspensão da licença da rádio ocorreu três dias mais tarde, em 5 de junho. O primeiro-ministro, a ministra do Interior e o presidente do Congresso continuam acusando a rádio pela morte de mais de 20 policiais.
Em 16 de fevereiro, a promotora da Primeira Promotoria Provincial de Utcubamba, região Amazonas, Olga Bobadilla, arquivou o processo criminal contra Aurora Burgos de Flores, proprietária da rádio, e os jornalistas José Flores Burgos, Leiter Flores Burgos, e Alberto Pintado Villaverde, pelo suposto crime contra a ordem pública na forma de apologia do crime e da sedição. Apesar dessa medida, o Ministério de Transportes e Comunicações (MTC) se nega a autorizar que a rádio reinicie suas transmissões e inclusive embargou suas contas bancárias por supostas multas não pagas, o que impediu que seus programas fossem transmitidos em outras estações locais.
O diretor da rádio Oriente e Canal 8 TV, Geovanni Acate, responde a processo criminal no Primeiro Tribunal Misto do Alto Amazonas, por instigar o povo contra a ordem democrática. O Ministério dos Transportes e Comunicações, mediante resolução vice-ministerial Nº 025-2010-MTC/03, cancelou a licença de funcionamento da referida emissora alegando que a estação não havia cumprido, em 2005, o prazo concedido para iniciar suas operações. Porém, esse vice-ministério havia concedido um certificado de aprovação dos seus equipamentos, o que confirmou que a Televisión Oriente cumpria as exigências técnicas de operação. A estação havia apoiado as queixas das comunidades indígenas.
Em contraste a essa atitude do MTC, em janeiro, como resultado de medidas tomadas pelo Conselho da Imprensa, o Decreto Supremo Nº 003-2010-MTC, publicado no diário oficial El Peruano, modificou o artigo 68 da Lei de Rádio e Televisão que regula os pedidos de renovação de autorizações para licenças de radiodifusão. Essa norma inclui uma Disposição Complementar Temporária que estabelece que se continue com a tramitação da renovação de licenças para evitar o fechamento de 400 emissoras de rádio nas províncias.
Em 9 de fevereiro a SIP e o Conselho de Imprensa Peruano consideraram como uma mensagem gravíssima a sentença emitida. A decisão, por minoria, pela Terceira Vara Criminal de réus na prisão do Supremo Tirbunal de Lima, absolveu o ex-prefeito de Coronel Portillo, Luís Valdez Villacorta e o ex-juiz do Tribunal Superior de Ucayali, Solio Ramírez Garay. Os dois haviam sido acusados como autores intelectuais do assassinato do jornalista Alberto Rivera Fernández, ocorrido na cidade de Pucallpa, em 2004.
O julgamento havia sido reiniciado no final de janeiro, na penitenciária de alta segurança de Castro, onde Valdez Villacorta está preso e responde a processo por lavagem de dinheiro e narcotráfico. O processo transcorreu em meio a denúncias de irregularidades e intervenções peculiares, tais como as do presidente do tribunal, Jorge Aguinaga, que apesar de não ter admitido evidências da existência de um motivo, sustentou a decisão, alegando que não existiam provas suficientes do crime. O Gabinete de Controle da Magistratura iniciou uma investigação sobre a conduta do tribunal. Está pendente a decisão da Corte Suprema sobre o pedido do juiz Mateo Castañeda, que havia pedido 20 anos de prisão pelo crime de homicídio para os que haviam sido absolvidos, e um recurso para anulação da sentença .
Preocupa também a modificação do Artigo 139 do Código Penal que proíbe a publicação dos autos do processo na sua etapa de investigação preparatória ou da etapa intermediária e impõe multas àqueles que violarem o artigo, inclusive aos meios de comunicação.
Também no âmbito judicial, a congressista do partido nacionalista, Elsa Malpartida, processou o diretor do jornal El Comercio, Francisco Miró Quesada Rada, e o jornalsita Óscar Castilla perante a Promotoria 21 Provincial Penal de Lima pelo suposto crime de revelação indevida de identidade por causa de uma reportagem publicada em novembro de 2009 que revelou que entre 1984 e 1994 a parlamentar andina Malpartida trabalhava em assuntos de logística para o Sendero Luminoso na região do Alto Huallaga, que era então o principal centro de operações dessa organização terrorista e do narcotráfico. Malpartida deixou de pertencer ao grupo em 1994 quando recorreu à Lei do Arrependimento. O artigo se baseava nos documentos que Malpartida apresentou como parte desse processo. Três dias depois da publicação, em 4 de novembro, em uma coletiva de imprensa, acompanhada por Ollanta Humala, líder do seu partido político, Malpartida, em vez de esclarecer sua situação, afirmou, sem apresentar provas, que o jornal havia cobrado para divulgar essas informações. As investigações judiciais já programadas foram adiadas até nova orden.
Registramos também um aumento da intolerância das autoridades frente a questionamentos legítimos da imprensa. Um claro exemplo disso é a agressividade utilizada por algumas autoridades do governo, inclusive o ministro de defesa, Rafael Rey, e o próprio presidente da República, contra o jornal La Primera que também denuncia que seus jornalistas são impedidos de participar ou acompanhar membros do gabinete em coletivas das quais participam vários meios de comunicação, como aconteceu em fevereiro quando Velázques Quesquen visitou populações atingidas pelas chuvas na região de Huanavelica.
Por último, organizações de imprensa expressaram sua total condenação ao incidente protagonizado pelo juiz Raúl Rosales Mora, que depois de chamar a atenção do fotógrafo Carlos Saavedra da revista Caretas, que realizava seu trabalho de informar, apontou uma arma de fogo para ele e o ameaçou. O juiz, que havia sido questionado por tentar substituir um polêmico juiz do Tribunal Constitucional, apareceu na capa da revista apontando sua arma contra o repórter gráfico.
Outros fatos destacados deste período:
Em 1º de março, o jornalista Mario Espinoza Ruiz, condutor do noticiário da Rádio Panorama, da região Apurimac, informou que a esposa e a filha de um capitão a quem atribuiu atos de corrupção irromperam na cabine de transmissão enquanto conduzia seu programa, ameaçando-o e golpeando-o em represália por sua cobertura do caso.
Em 23 de fevereiro, o jornalista Carlos Vásquez Rodas, do programa Fama Noticia transmitido pela Rádio Fama, no distrito de Guadalupe, região La Libertad, denunciou que o prefeito da localidade de Pueblo Nuevo o ameaçou que enquanto seu pessoal de segurança agredia, em represália por suas denúncias.
Em 27 de fevereiro José Puga, jornalista do diário El Comercio e o repórter gráfico independente Jean Marco Córdova, denunciaram que foram golpeados por efetivos policiais quando cobriam um operativo para dispersar um grupo de vizinhos no distrito de Barranco, departamento de Lima.
Em 22 de fevereiro, Otilio Ríos Valdivieso, diretor do programa Horizonte en la Noticia, correspondente do diário Ya e da ATV Canal 9, na região Ancash, denunciou que foi agredido pelo chefe polícia local da municipalidade de Pomabamba e seus subalternos por difundir informação sobre a reposição de um prefeito destituído por corrupção.
Em 6 de fevereiro, Amancio del Águila, correspondente de Panamericana Televisión e Condutor do programa Voz y Ritmo en la Noticia que transmite a Rádio 90.1 F.M, na cidade de Tingo María, região Huánuco, denunciou que um ex-prefeito do distrito Padre Felipe Luyando-Naranjillo o ameaçou de morte em presença de suas duas filhas.
Em 5 de fevereiro, Juan Carlos Lobato proprietário da Rádio Campesina, na região de Cajamarca, denunciou que o presidente da Associação de Bairros de Cajamarca irrompeu no prédio da rádio e ao encontrá-lo ameaçou de morte um grupo de jornalistas por críticas contra sua gestão.
Em 4 de fevereiro, Karla Gómez Otoya, jornalista do diário Correo Edición La Libertad, informou que o proprietário de um albergue a insultou e agrediu quando se negou a revelar a fonte de informação utilizada como sustento de um artigo no qual denunciou que delinquentes se alojavam na referida hospedagem na cidade de Trujillo.
Em 22 de janeiro, Segundo Matta Colunche, repórter da Rádio Ilucán e do Canal 4 de Cutervo, correspondente da Rádio Marañón de Jaén, da Rádio Líder de Cajamarca e do jornal El Clarín, denunciou que um empregado da gerência sub-regional da região de Cajamarca, ameaçou-o de morte e advertiu que ele seria assassinado antes do mês de maio por suas denúncias de corrupção pública.
Em 14 de janeiro, Henry Lovera, condutor do noticiário Punto de Vista transmitido pela Rádio La Achirana, na região Ica, denunciou que o prefeito do distrito Pachacamac irrompeu na cabine da rádio, agrediu-o e quebrou um microfone, justo quando o jornalista difundia uma denúncia contra o prefeito por mal uso de fundos públicos.
Em 2 de janeiro os vogais da Primeira Sala Penal Transitória da Corte Suprema ratificaram, por maioria, a sentença ditada em 7 de abril de 2009, condenando o ex-presidente Alberto Fujimori a 25 anos de prisão efetiva, pela autoria mediata dos crimes de Barrios Altos e La Cantuta, e pelo sequestro do jornalista Gustavo Gorriti em 5 de abril de 1992.
Em 31 de dezembro, Rodolfo Lobo Tello, condutor do programa Contamaná al Día, transmitido pela Rádio Feroz, da região de Loreto, denunciou que foi agredido e ameaçado na cabine de condução pelo diretor da Unidade de Gestão Educativa Local (UGEL), que exigiu ser entrevistado para esclarecer as denúncias de irregularidades durante sua gestão.
Em 13 de dezembro, o cinegrafista Leocadio Madera do programa Prensa al Día, transmitido pelo Canal 47 UHF na região de Cusco, denunciou que foi detido e trasladado a uma cela do Palácio de Justiça, por uma ordem de captura ante um juízo por agressão física apresentada por um ex-funcionário da Prefeitura de Cusco, a quem gravou em estado de embriaguez. Madera, que assegura não haver recebido citação judicial, foi liberado no dia seguinte.
Em 20 de novembro, Miguel Bellido Almeida, correspondente do jornal El Comercio, Winston Callalli Campana da TV Canal 15, Jesús Camacho Quispe do Canal 11 TV Amistad, Carlos Peña Costillo da Andina Radiodifusión, Paúl Pilco Dorregaray correspondente do jornal Correo e Marcelo Santana do Canal 29, denunciaram que foram agredidos e ameaçados por efetivos policiais enquanto cobriam uma manifestação contra o presidente da região Apurimac. O jornalista Pilco informou que foi interceptado por três policiais armados e encapuchados que lhe confiscaram seu equipamento fotográfico, devolvendo-lhe horas depois com a memória vazia.
Madrid, Espanha