PANAMÁ
Desde a fundação do La Prensa, há dezessete anos, todos os relatórios apresentados à Sociedade Intereramericana de Imprensa sobre a situação da liberdade de imprensa e informação no Panamá têm enfatizado a existência de uma vasta e confusa legislação que afeta seriamente os meios de comunicação
e o exercício de jornalismo.
Algumas dessas normas permitem que o ministério da Justiça imponha sanções por via administrativa, sem nenhuma garantia dos devidos processos legais. Outras autorizam funcionários municipais ou das províncias a impedir a circulação de qualquer meio se considerarem que podem perturbar a ordem pública. Existem disposições que exigem a "idoneidade" certificada pelas autoridades para o exercício do jornalismo e leis ambíguas de caráter penal sobre crimes contra a honra, contra funcionários
do Estado e contra a economia nacional.
Todas essas normas foram aplicadas em diversas ocasiões e muitas foram usadas pela ditadura como pretexto para fechar jornais e para outros atos de hostilização contra os meios de comunicação que se opusessem ao governo.
Conforme relatado na reunião anterior de Meio de Ano, o presidente da República, Ernesto Pérez Balladares, prometeu voltar a propor à Assembléia Legislativa a anulação dessas normas.
Entretanto, uma dessas leis, a lei 67 de 1978, foi invocada para justificar a revogação do visto de trabalho de Gustavo Gorriti e possibilitar sua extradição.
Cronologia do caso Gorriti:
Em 3 de julho de 1996, o ministro do Trabalho emite o visto de trabalho para o jornalista Gustavo Gorriti, "na qualidade de empregado estrangeiro", para trabalhar como editor adjunto no La Prensa.
Em 31 de julho de 1997, o ministro do Trabalho, Mitchel Doens, baseando-se no Código de Trabalho de 1972, negou a renovação do visto de trabalho de Goritti, alegando que havia suficientes panamenhos formados pela Faculdade de Comunicação Social da Universidade do Panamá capazes de desempenhar suas funções.
Em 6 de agosto de 1997, os advogados do La Prensa entram com um recurso contra a decisão do ministério do Trabalho, que nega a renovação do visto de trabalho a Gustavo Gorriti.
Em 7 de agosto de 1997, o ministério do Interior declara que Gustavo Gorriti deverá "abandonar o território nacional até o dia 28 de agosto".
Em 8 de agosto, o governo do Panamá utiliza pela primeira vez o argumento da lei 67 de 1978, em comunicado do Diretor Nacional de Meios de Comunicação Social do ministério do Interior, no qual indica que o cargo que ocupa Gustavo Gorriti no La Prensa somente podem ser preenchidos por panamenhos.
Em 8 de agosto, a presidência da República emite um comunicado declarando que o Departamento de Imigração "cancelará o visto"de Gorriti, e "convidando-o a se mudar para o país de sua preferência", Se o convite não fosse aceito, GarriU seria lIentão extraditadoli,
Entre 10 e 10 de agosto, várias organizações profissionais, de defesa da liberdade de imprensa e dos direitos humanos protestam contra a decisão do governo. Entre elas a Associação de Correspondentes da Imprensa Estrangeira no Panamá; a Comissão de Liberdade de Imprensa da SIP; o Fórum de Jornalistas
pela Liberdade de Expressão do Panamá; o Centro Latino-americano de Jornalismo (CELAP); o Comitê para a Proteção a Jornalistas; o Instituto Interamericano de Direitos Humanos; Human Rights Watch/ Americas; Repórteres sem Fronteiras; a Federação Internacional de Jornalistas; a Associação Nacional de Jornalistas do Peru.
Quase todos os partidos de oposição do Panamá protestaram contra a atitude do governo e ofereceram seu apoio ao La Prensa e a Gustavo Gorriti. O mesmo fizeram os escritores John Le Carré e Mario Vargas Llosa.
Em 15 de agosto de 1997, a Human Rights Watch/Americas e o Center for Justice and International Law apresentam, representando Gustavo Gorriti, uma denúncia perante a Comissão Interamericana de Direitos Humanos da OEA, em Washington.
Em 18 de agosto, a Comissão adota medidas cautelares a favor de Gustavo Gorriti e pede ao governo panamenho que suspenda a extradição até que a Comissão estude o caso.
Em 26 de agosto de 1997, os advogados do La Prensa entram com um recurso litigioso-administrativo de direitos humanos no Terceiro Tribunal do Supremo Tribunal de Justiça, contra a decisão do ministério do Trabalho.
Em 27 de agosto, os advogados entram com um recurso de habeas corpus preventivo no Supremo Tribunal de Justiça, pedindo ao Tribunal que garanta o cumprimento do devido processo no caso de
Gustavo Gorriti. O recurso foi declarado inviável apenas depois de o Departamento de Imigração declarar que seguirá todas as etapas apropriadas no processo de extradição. O ministro de Trabalho rejeita o recurso apresentado pelos advogados do La Prensa. A SIP pede a Pérez Balladares que não extradite Gorriti. A SIP se dirige, também, ao presidente do Supremo Tribunal de Justiça do Panamá, pedindo-lhe que suspenda os efeitos da recusa do ministro do Trabalho.
Entre 10 de agosto e o início de setembro, o caso tem ampla cobertura em vários meios internacionais como o The Wall Street Journal, The New York Times, The Washington Post, The Economist, The Miami Herald, Los Angeles Times, EI País, EI Mundo.
Em 14 de agosto, o The Miami Herald revela que a "decisão de expulsar o jornalista peruano foi tomada depois de um primo do presidente ter reclamado que seus artigos criavam obstáculos a seu desejo de criar um monopólio virtual sobre a televisão panamenha". O artigo mencionara que Pérez Balladares havia dito a seus ministros que o verdadeiro motivo por detrás da possível extradição de Gorriti era o fato de este saber que havia uma conspiração para assassiná-lo. A conspiração seria organizada
pelos serviços de inteligência peruanos.
Pérez Balladares declarou diante de seus ministros que Gorriti ia ser assassinado de qualquer modo, e que isso não devia ocorrer no Panamá. No mesmo dia, Roberto Eisenmann, fundador do La Prensa, revelou as mesmas informações no Panamá.
Em 25 de agosto, uma comissão de congressistas peruanos em missão oficial chega ao Panamá. Seu objetivo era interceder por Gorriti junto a Pérez Balladares. A Comissão retorna ao Peru sem ter sido recebida pelo presidente.
Em 26 de agosto, a esposa e duas filhas de Gustavo Gorriti saem do país por motivos de segurança.
Em 27 de agosto, Gustavo Gorriti se muda para os escritórios do La Prensa, onde espera o desenlace do caso. Partidos políticos e personalidades se reúnem no La Prensa para manifestar sua solidariedade.
A extradição não ocorre.
Em 6 de setembro, assim que o governo afirma que dará prosseguimento ao processo de extradição, Gorriti abandona o La Prensa e volta para sua casa.
Em 19 de setembo, funcionários da Imigração entregam a Gorriti a ordem de extradição. O jornalista entra com um recurso que é recusado no dia seguinte. Dentro do prazo legal, Gorriti apela junto ao ministério do Interior.
Os advogados do La Prensa advertem sobre a inconstitucionalidade da norma que o ministro de
Governo e Justiça pretendia aplicar para resolver negativamente a apelação, cujo efeito imediato foi suspender a jurisdição do ministério sobre o caso, até que o Supremo Tribunal de Justiça desse a sentença sobre a advertência.
Em 15 de outubro, o ministro do Trabalho expede um visto de trabalho para que Gustavo Gorriti trabalhe no La Prensa como jornalista, e começa o processo de regularização de sua situação. O La Prensa e Human Rights Watch/ Americas aplaudem imediatamente a medida do governo, que solucionou
o tortuoso conflito.
Madrid, Espanha