Brasil

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Os alicerces de uma imprensa democrática têm por base dois pilares: a livre iniciativa e a liberdade de expressão. As empresas jornalísticas brasileiras não enfrentam problemas nesses dois sentidos, mas o segundo quesito vive sob constante ameaça. Neste período, os fatos extrapolaram as ameaças, que tentam calar a imprensa. Se as recomendações do Plano Nacional dos Direitos Humanos (PNDH) e da Confecom forem aprovadas no Parlamento brasileiro e sancionadas pelo futuro presidente do país, haverá uma lista de instituições estatais dispostas a controlar a imprensa. Em dezembro do ano passado foi realizada uma Conferência Nacional de Comunicação que teve centenas de recomendações centradas no controle social da mídia e na mudança do marco regulatório das comunicações. As empresas ligadas ao mercado editorial e de comunicações – notadamente ABERT, ANJ e Aner – saíram da comissão organizadora quando não tiveram atendidas suas reivindicações sobre os princípios constitucionais da liberdade de imprensa e da livre iniciativa. Várias conclusões liberticidas podem se transformar em anteprojetos de lei. Recentemente, o presidente Lula da Silva nomeou uma comissão de cinco ministros para que, sob a coordenação do ministro da Comunicação Social, Franklyn Martins, incluam nesse anteprojeto as recomendações dessa conferência. Este anteprojeto convoca para este mês de novembro um seminário sobre o marco regulatório, em Brasília, sob patrocínio da Secom. Sob a justificativa de atualizar o marco regulatório, as autoridades federais tentam cancelar licenças de radiodifusão, como ocorreu em outros países. O passo seguinte será o de incluir medidas restritivas à liberdade de expressão e ao direito de informação. No final de outubro foi aprovado, pela Assembléia Legislativa do Ceará, um projeto de autoria da deputada petista Rachel Marques que cria, no estado, um Conselho de Comunicação Social, conforme sugeriu a Confecom. Para entrar em vigor, essa proposta ainda depende da sanção do governador socialista Cid Gomes. O projeto antecipa que o Conselho ficará vinculado à Secretaria da Casa Civil do Ceará, que vai elaborar uma política estadual de comunicação e “monitorar, receber denúncias e encaminhar parecer aos órgãos competentes sobre abusos e violações de direitos humanos nos veículos de comunicação no Estado do Ceará". O texto não explicita quais são os órgãos competentes para julgar as denúncias, nem especifica que punições poderão ser impostas, mas, ainda assim, já recebeu o apoio do Sindicato dos Jornalistas do Ceará. Quanto à sua composição, o texto reza que o Conselho de 25 membros terá sete representantes dos poderes Executivo e Legislativo do Ceará e das faculdades de Comunicação, oito representantes dos meios de comunicação e dez da sociedade civil, aí incluídos sindicatos e movimento estudantil. Em São Paulo, o líder do PT na Assembléia Legislativa, deputado Antonio Mentor, apresentou projeto que estabelece mecanismos regionais de controle da mídia. A exemplo da proposta cearense, o do PT paulista também prevê a criação de um conselho para monitorar os meios de comunicação. Embalados pelo continuísmo e por maioria tanto na Câmara dos Deputados como no Senado Federal, a esquerda brasileira detém os instrumentos para concretizar as ameaças embutidas no Plano Nacional de Direitos Humanos (PNDH) e nas “conclusões” da Conferência Nacional de Comunicação (Confecom) que o governo federal promoveu no fim do ano passado. Já há algum tempo, o governo petista ensaia algum tipo de controle social – o novo nome da censura - sobre a atividade jornalística para além dos controles judiciais já existentes. Em comício de campanha da candidata Dilma Rousseff que aconteceu em Campinas, no interior paulista, Lula fez severas criticas aos meios de comunicação e vociferou para os presentes que a população não precisa mais de formadores de opinião. “Nós somos a opinião pública.” A Associação Nacional dos Jornais (ANJ), a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e Associação Nacional dos Editores de Revistas (ANER) criticaram os excessos do presidente. O ataque do presidente coincidiu com uma série de reportagens a respeito de tráfico de influência e irregularidades praticadas por funcionários ligados à Casa Civil. "Existe uma revista que não lembro o nome dela (sic). Ela destila ódio e mentira", afirmou Lula, em referência indireta à revista Veja. Esses protestos não inibiram as entidades simpáticas ao PT. Dias depois, centrais sindicais, MST e PCdoB promoveram um “ato contra a mídia golpista” e de apoio à candidatura Dilma Rousseff a sucessão presidencial. O ato, que reuniu cerca de 400 pessoas, ocorreu na sede do Sindicato dos Jornalistas de São Paulo. Todas essas iniciativas legislativas são inconstitucionais, porque o Supremo Tribunal Federal brasileiro decidiu, em abril do ano passado, quando acabou com a Lei de Imprensa imposta pela ditadura militar de 1964, que “não é o Estado que fiscaliza a imprensa, e sim a imprensa quem fiscaliza o Estado”. Esses passos se constituem no retorno da censura à imprensa no Brasil. Os ataques à liberdade de expressão não se limitam, porém, a intenções, projetos ou ameaças. Em setembro, o desembargador José Liberato Costa Póvoa impôs, em decisão liminar, a censura prévia a 84 veículos de comunicação do Tocantins e de outros estados, que ficaram assim proibidos de divulgar qualquer notícia referente a um escândalo que atingia diretamente o governador e candidatado à reeleição Carlos Gaguim (PMDB-TO) e o procurador-geral do estado, Haroldo Rastoldo. Os dois foram citados em escutas telefônicas, promovidas pela Polícia Federal com autorização judicial, cujo objetivo foi lastrear a investigação sobre superfaturamento de preços na prestação de serviços de limpeza. Segundo matérias publicadas pelos jornais, a esposa do desembargador, Simone Cardoso da Silva Canedo Póvoa, foi nomeada para um cargo de assessora do Governo de Tocantins que garante mais R$ 3,6 mil mensais para a renda do casal Póvoa. O Tribunal de Justiça de Tocantins revogou a decisão do desembargador. A decisão do juiz de Palmas provocou o repúdio das entidades representativas dos veículos de imprensa. No Paraná, o candidato ao governo estadual, Beto Richa (PSDB), conseguiu proibir a divulgação dos resultados de cinco pesquisas de intenção de voto. Para a ANJ, a proibição é censura prévia. No Sul do Brasil, continua o calvário por que passa o jornal gaúcho Já e seu proprietário, o jornalista Elmar Bones, por conta de uma reportagem publicada há dez anos sob o título "Caso Rigotto – um golpe de US$ 65 milhões e duas mortes não esclarecidas". Isenta de comentários, mas recheada de informações, a matéria mereceu alguns dos mais importantes troféus regionais de jornalismo, como o Esso Regional e o ARI, da Associação Riograndense de Imprensa. Não obstante, o jornal foi condenado a pagar indenização civil incompatível com sua capacidade econômica e teve de fechar as portas. A reportagem contava o envolvimento de Lindomar Rigotto – irmão do então deputado estadual e depois governador Germano Rigotto – em uma licitação pública da Companhia Estadual Energia Elétrica. Indicado pelo irmão para a diretoria financeira da empresa, Lindomar acabou protagonizando o escândalo que resultou em uma CPI que indiciou ele, outras onze pessoas e onze empresas. Segundo o relatório final dessa Comissão, o esquema foi montado por Lindomar. "De tudo o que se apurou, tem-se como comprovada a prática de corrupção passiva e enriquecimento ilícito de Lindomar Vargas Rigotto", escreveu o relator da CPI, deputado Pepe Vargas (PT-RS). O Ministério da Cultura elabora um projeto de lei para ser enviado ao Congresso Nacional que prevê, entre outras coisas, que os direitos autorais dos textos jornalísticos cairão em domínio público tão logo eles tenham sido publicados pela primeira vez. Trata-se de uma contradição, já que o Brasil foi um dos signatários do primeiro acordo internacional em defesa da propriedade intelectual. Entre outros fatos relevantes, destacam-se os seguintes: Em 10 de julho de 2010, o radialista Rodrigo Santos, da Rádio Cidade, de Brusque (SC), foi agredido em represália por suas reportagens denunciando interferências indevidas na escalação de árbitros de futebol. A agressão foi praticada pelo filho do presidente da Federação Catarinense de Futebol e assessor da entidade, Delfim Peixoto Neto. A origem do ataque seria um vídeo, divulgado pelo radialista em seu blog na internet no qual um dirigente da FCF revelava que Peixoto Neto vinha interferindo na escolha das arbitragens. Devido aos socos e pontapés sofridos, Rodrigo Santos ficou desacordado e teve que ser conduzido a um hospital. Em 18 de setembro de 2010, o presidente Lula afirmou, durante comício de campanha, em Campinas, que “vamos derrotar alguns jornais e revistas que se comportam como partido político”. Em seguida, ainda referindo-se à imprensa, disse que “essa gente não me tolera”. Em nota, a ANJ lamentou que o presidente tenha esquecido suas próprias palavras, pronunciadas em 2006, ao assinar a declaração de Chapultepec, quando declarou textualmente: “… eu devo à liberdade de imprensa do meu País o fato de termos conseguido, em 20 anos, chegar à Presidência da República do Brasil. Perdi três eleições. Eu duvido que tenha um empresário de imprensa que, em algum momento, tenha me visto fazer uma reclamação ou culpando alguém porque eu perdi as eleições”. Em 18 de outubro de 2010, na cidade de Caicó (PB), o jornalista Francisco Gomes de Medeiros, de 46 anos, foi alvejado por tiros disparados por um suspeito a bordo de uma motocicleta quando estava sentado em frente à sua residência, no bairro Paraíba. Ferido gravemente, Francisco ainda foi levado a um hospital próximo, mas faleceu pouco depois. A polícia deteve um suspeito que confessou ter cometido o crime em represália a suas denúncias contra o narcotráfico. Popularmente conhecido como F. Gomes, o jornalista mantinha um blog na internet e era diretor do departamento de rádio-jornalismo da Radio Caicó AM, onde apresentava o programa policial “Comando Geral”. Em 30 de outubro, em Três Rios, Paraíba do Sul, Rio de Janeiro, o jornalista José Rubem Pontes de Souza, de 39 anos e diretor-presidente do Entre-Rios Jornal, foi baleado fatalmente no pescoço por um homem a bordo de um automóvel que fugiu em seguida. O ataque correu quando saía de uma festa em um bar. Souza foi levado a um hospital próximo ao local, onde faleceu. “Há mais de um ano persiste a censura judicial ao jornal O Estado de S. Paulo. A publicação está impedida de publicar informações, que possui, sobre a Operação Boi Barrica, pela qual a Polícia Federal brasileira investiga a atuação do empresário Fernando Sarney, filho de José Sarney, ex-presidente da República e atual presidente do senado Federal. O jornal foi proibido pelo Tribunal de Justiça do Distrito Federal, em 31 de julho do ano passado, de divulgar fatos relacionados à operação.”

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