Bolívia

Aa
$.-
O governo cerceou a liberdade de imprensa com a promulgação da Lei de Luta Contra o Racismo e Toda Forma de Discriminação, contendo dois artigos que violam aquele direito. O jornalismo e os meios de comunicação vivem acossados por juízes e membros do ministério público, e em um clima de agressões físicas e verbais de setores governamentais e organizações sociais. Em documento divulgado em 16 de novembro passado, as organizações mais importantes do jornalismo (Associação Nacional de Imprensa, Associação Nacional de Jornalistas, Associação Boliviana de Radioemissoras e Confederação Sindical de Trabalhadores da Imprensa da Bolívia) denunciaram que a liberdade de expressão ficou enfraquecida com a lei contra o racismo. Estabelece penas de até cinco anos de prisão e suspensão das licenças de funcionamento da mídia, se esta incorrer em racismo ou discriminação, segundo seus artigos 16 e 23. As organizações rejeitaram o convite da representante da Organização das Nações Unidas (ONU) na Bolívia, Yoriko Yasukawa, para participar da regulação da lei considerando que se pretendia o aval das mesmas. O Governo promulgou o Regulamento em 5 de janeiro. Mantém as sanções contra os jornalistas, esclarece que a suspensão das licenças para a mídia será de 150 a 360 dias e obriga os jornais a publicarem gratuitamente até uma página mensal com informações educativas contra o racismo e discriminação. A emissora de rádio deverá dedicar no mínimo 40 minutos por mês e a televisão 20 minutos a mensagens educativas em horários nobres. Ainda não se registrou nenhum processo judicial por não estar em funcionamento o comitê que controlará os supostos delitos. Não se descarta a possibilidade de que as sanções possam ser aplicadas a infrações ao regulamento cometidas a partir de 5 de janeiro de 2011. As organizações jornalísticas, em uma tentativa de reverter os artigos 16 e 23 dessa lei, coletaram assinaturas da população de todo o país e apresentaram ao Legislativo em 30 de novembro de 2010 um pedido constitucional de Iniciativa Legislativa Cidadã para restaurar a liberdade de expressão. O presidente do Congresso e vice-presidente do país, Álvaro García, respondeu que não se poderia considerar uma iniciativa semelhante porque não havia nenhuma lei regulando o direito à Iniciativa Legislativa Cidadã. O presidente Evo Morales acusou de “racistas” as pessoas que apoiaram os jornalistas com as suas assinaturas para a eliminação do artigo 16 e a modificação do artigo 23 da lei antirracismo e declarou em 23 de novembro de 2010 que a principal oposição ao seu governo provém dos meios de comunicação. Em 6 de janeiro, um dos jornalistas mais críticos do governo, Humberto Vacaflor, foi acusado de “mentiroso” pelo presidente Morales. Em 10 de fevereiro, o jornalista Carlos Valverde denunciou ser vítima de discriminação na distribuição da publicidade oficial, uma prática comum do governo central e dos governos dos departamentos e municípios. As agressões físicas contra jornalistas recrudesceram em Cochabamba, onde foram agredidos após marchas e manifestações por parte de motoristas e ocupantes de terrenos. A perseguição judicial e do ministério público aos jornalistas e à mídia se converteu em outra forma de intimidação. Em 18 de janeiro, o jornalista de TV, John Arandia, recebeu intimação do procurador geral Marcelo Sosa para revelar a fonte que lhe entregou um vídeo sobre o suspeito suborno governamental de suposta testemunha chave de um caso de terrorismo. Em 9 de fevereiro, o general José Antonio Ágreda Mendívil, segundo comandante do Exército, iniciou um processo contra o juiz Omar Dorado porque indeferiu uma sentença de julgamento ordinário por desacato contra o diário El Deber por falta de competência pelo fato de a Lei de Imprensa continuar em vigor. O militar pleiteava uma indenização elevada por uma história em quadrinhos cômica que o acusavam de envolvimento em irregularidades na administração de fundos, mesmo sem haver menção de nomes. Em 11 de março, o jornalista Mario Caro Martínez foi acusado pelo Ministério Público de desacato do secretário de meio ambiente do governo do departamento de Potosí, Felipe Castro, por haver denunciado sua destituição em gestão anterior por suposto assédio sexual. Em 15 de março, o novo comandante da polícia boliviana, Ciro Farfán, abriu um processo na justiça ordinária contra a jornalista Amalia Pando por permitir que em seu programa de rádio uma terceira pessoa acusasse o policial de abuso do poder. As frequentes alusões s ao jornalismo pelo presidente Morales e seus ministros de governo, Sacha Llorenti e da economia, Luis Arce, alegando que o jornalismo é responsável pela geração de conflitos, elevação dos preços de produtos de primeira necessidade e escassez de alimentos, foi interpretada pela Associação Nacional de Imprensa (ANP) como uma campanha para desacreditar o jornalismo. Observa-se com preocupação que um projeto de Lei de Acesso às Informações Públicas, apresentado em agosto de 2010 à Câmara de Deputados pelo Ministério de Transparência e Luta Contra a Corrupção, não consta da agenda de apreciação pelo parlamento neste ano. Apesar dos reiterados pedidos públicos da ANP e da SIP, as autoridades nada fizeram para esclarecer o assassinato do jornalista Carlos Quispe Quispe, ocorrido em 29 de março de 2008, em decorrência de um espancamento recebido na localidade de Pucarani no altiplano. Uma multidão do partido do governo Movimiento Al Socialismo (MAS), dissidente do prefeito deste povoado, entrou na rádio da Prefeitura e golpeou o jornalista que morreu quatro dias depois, em um hospital de La Paz.

Compartilhar

0