Haverá uma concentração de todos os ataques que o governo do Equador perpetrou durante quatro anos contra a liberdade de expressão na consulta e no referendo que o presidente Rafael Correa convocou para 7 de maio próximo.
Apoiado na popularidade que alcançou com uma promoção abusiva do seu governo personalista, populista e fazedor de benesses, abusando da mídia que o governo utiliza agora depois da desapropriação de seus antigos donos, Correa pretende concretizar a criação de uma entidade reguladora e controladora dos conteúdos da mídia e prejudicar os donos e dirigentes das empresas de comunicação com a proibição de possuírem qualquer outra atividade econômica fora do setor de comunicações, supostamente para evitar conflito de interesses.
Esta consulta serviria também para concretizar um desejo presidencial antigo de atentar contra a independência dos poderes no Estado, pois o mesmo Presidente anunciou que esta consulta é para dar um tapa na justiça. A consulta prevê a reestruturação de todos os tribunais do país pelo presidente.
Em 15 de fevereiro, a reunião plenária do Tribunal Constitucional aprovou com poucas modificações as dez perguntas do referendo e da consulta popular, apresentadas pelo presidente Rafael Correa. Duas dessas perguntas dizem respeito à criação de um Conselho de Regulação capaz de regulamentar a difusão de conteúdos na mídia e estabelecer critérios de responsabilização posterior; e à proibição de que as empresas de comunicação privadas, seus diretores e acionistas principais detenham participação acionária fora do âmbito do setor de comunicações.
Previamente, em 17 de janeiro, foram divulgadas duas das dez perguntas para consulta popular e referendo enviadas ao Tribunal, estabelecendo, em sua quarta pergunta, que com a finalidade de evitar excessos nos meios de comunicação, se anuncie uma lei que crie um Conselho de Regulação que regulamente a difusão de conteúdos na televisão, rádio e publicações da imprensa escrita, que contenham mensagens de violência, explicitamente sexuais ou discriminatórias; e que estabeleça os critérios de responsabilização posterior dos comunicadores. A terceira pergunta da seção Emendas Constitucionais estabelece para o referendo que, com a finalidade de evitar conflito de interesses... se proíba que as empresas de comunicação privadas de caráter nacional, seus diretores e acionistas principais, sejam donos ou tenham participação acionária fora do âmbito financeiro ou de comunicações, respectivamente.
Dias depois da aprovação das perguntas, Correa afirmou que a criação da entidade reguladora da mídia por consulta popular é para que a imprensa não se converta no Tribunal Supremo deste país. Seguidamente criticou as apresentadoras de TV por opinar sobre a constitucionalidade das perguntas da consulta, alegando que agora estas garotinhas bonitinhas viraram especialistas em direito constitucional. Qualquer reacionária bonitinha, porque apresenta notícias, então já se converteu em especialista na constituição. Isto é uma amostra da corrupção e da falta de profissionalismo da nossa imprensa.
Durante a campanha eleitoral pela consulta, Correa encabeça o aparato estatal de agressões constantes contra jornalistas. Indiciou os jornalistas Juan Carlos Calderón e Christian Zurita por supostos danos morais. O motivo foi a publicação do livro El Gran Hermano, que revelou os contratos que Fabricio Correa, seu irmão, firmou com o governo equatoriano. Estes contratos seriam de aproximadamente 700 milhões de dólares, segundo a comissão investigadora nomeada pelo próprio Presidente.
Correa exige dos jornalistas uma indenização de 10 milhões de dólares por ter sido submetido a uma grande humilhação, um grave constrangimento social, moral e desprestígio, que lhe causou grande sofrimento, angústia e dor. Dias depois Correa disse que se os jornalistas pedissem perdão, ele retiraria o processo, o que os comunicadores rejeitaram.
Correa também recorreu à justiça para que Emilio Palacio, colunista de El Universo, seja punido por uma coluna de opinião em que se refere ao dia 30 de setembro, e estendeu a ação judicial por suposta coparticipação à empresa editora e aos três dirigentes principais deste diário: os irmãos Carlos, César e Nicolás Pérez, para os quais pede não somente três anos de prisão por injúria caluniosa, como também sentença condenando o pagamento a ele [o presidente] de um total de 80 milhões de dólares para corrigir o suposto dano moral. Recorreu também à ameaça de ação judicial contra Marcos Sovenis, um cidadão que o chamou de fascista. Antes da ameaça de ação judicial pelo presidente, Sovenis sofreu espancamentos na cabeça, costas, pescoço, abdômen (com danos no fígado e nos rins) pela escolta de Correa.
Neste ambiente de perseguição a pensamentos divergentes e à liberdade de expressão da mídia e cidadãos, na segunda metade de 2010 aumentou também o número de presos que se autodenominam como políticos, e dos que o governo acusa de ações conspiratórias. O coronel da Polícia César Carrión está preso há meses, acusado de assassinato, depois que deu à CNN a sua versão do ocorrido no hospital da Polícia em 30 de setembro, quando a polícia se amotinou e terminou o resgate do presidente com o uso de armas. Em 20 de outubro, o mandatário rejeitou e desmentiu o que Carrión disse à CNN.
Fidel Araujo, dirigente do partido de oposição Sociedad Patriótica, é mais um dos alvos dos ataques de Correa por não estar no lugar onde se organizou a rebelião policial. É acusado de planejá-la, sem a apresentação de provas significativas. Há também um grupo numeroso de policiais da ativa na prisão.
Em 17 de dezembro, a revista Vanguardia, que critica o regime, foi objeto de uma invasão policial agressiva e seus bens foram confiscados. O governo reclamava o pagamento do aluguel do local de propriedade do Estado que ela ocupava em Quito, mas a revista insistia que nada devia. Os computadores foram retirados com todas as informações que continham e ainda não foram devolvidos.
Outros fatos relevantes em ordem cronológica:
Em 8 de novembro de 2010, o jornalista Wilson Cabrera, dono de La Voz da Esmeralda Oriental Canela, de Macas, província de Morona Santiago, denunciou que o Conselho Nacional de Telecomunicações (Conatel) lhe negou a renovação da frequência de transmissão. Isto se deve, garantiu Cabrera, a represálias pelas críticas que faz em sua coluna 'Primera Plana'.
Em 13 de novembro, o diário El Comercio de Quito denunciou uma campanha de desmoralização contra ele. A mídia sob controle estatal, disse El Comercio, reproduziu nota sobre a suposta evasão fiscal do jornal, quando o fato ainda estava em fase de investigação e sem nenhuma confirmação da fonte.
Em 16 de novembro, os escritórios do diário El Universo na cidade de Quito foram invadidos por indivíduos desconhecidos que arrombaram uma das portas de acesso ao edifício.
Em 19 de novembro, a ministra da Política, Doris Soliz, solicitou informações (cópias de cheques e faturas) sobre os contratos de publicidade firmados entre o diário El Universo e o ativista oposicionista Carlos Vera, que liderou um pedido de revogação do mandato presidencial. A solicitação não tinha base jurídica por ser um contrato privado.
Em 23 de novembro, o jornalista desportivo Rómulo Barcos recebeu ameaça de morte durante a marcha contra a insegurança, realizada na cidade de Guayaquil. O comunicador, cujo único filho foi assassinado por delinquentes em 20 de novembro, esteve entre os organizadores da mobilização.
Em 26 de novembro, Juan Alcívar, correspondente do diário La Hora e jornalista da rádio El Nuevo Sol, foi agredido fisicamente, insultado e ameaçado de morte supostamente por Ronald Lara Heras, primo do prefeito, e outros três indivíduos na localidade de La Concordia, situada a 318 quilômetros de Quito.
Em 21 de novembro, Emilio Palacio, colunista do diário El Universo, denunciou através de sua coluna que Gutemberg Vera, advogado de vários funcionários do governo, foi ao escritório do procurador geral para exigir que investiguem Palacio pelo delito de conspiração para adulterar documentos públicos.
Em 2 de dezembro, Guido Manolo Campaña, jornalista do diário El Universo, foi sequestrado enquanto investigava na província de Esmeraldas a adulteração de identidade por um jogador de futebol. Ele ficou detido durante seis horas, quando o amarraram, agrediram e ameaçaram. Antes de libertá-lo, lhe avisaram que o matariam e fariam atentados contra a sua família se levasse a investigação a público. As informações foram publicadas e não houve represálias, nem investigações fiscais e policiais da ocorrência.
Em 3 de dezembro, o membro da oposição na Assembleia, Galo Lara, acusou três supostos funcionários da Presidência da República de perseguição e conseguiu que a Polícia os detivesse. Fernando Alvarado, secretário de Comunicação do governo, foi à delegacia para defendê-los e garantiu que eles eram três jornalistas da Gama TV, canal confiscado pelo Estado.
Em 17 de dezembro, um relatório da ONG Human Rights Watch questionou a intenção do governo de Rafael Correa de controlar minuciosamente as atividades das organizações não governamentais, assim como de dissolver aquelas que façam proselitismo político. As organizações internacionais interessadas em realizar atividades no Equador também estariam sujeitas a este controle.
No mês de dezembro, e em duas ocasiões consecutivas, se descumpriu a ordem do Primeiro Juiz de Garantias Penais de Guayas, Ángel Rubio, para que o pessoal da revista Vanguardia pudesse obter o back-up das informações jornalísticas contidas nos discos rígidos dos 25 computadores confiscados.
Em 20 de dezembro, o site ecuadorinmediato.com lamentou as expressões consideradas ofensivas contra o portal feitas pelo coronel Lucio Gutiérrez sobre a publicação de mensagem eletrônica do Wikileaks, mencionando que ele se reuniu com o embaixador dos Estados Unidos na Colômbia.
Em 21 de dezembro, Fabricio Lapo, correspondente do canal Ecuavisa e Miguel Lituma, redator do jornal Opinión da localidade de Machala, denunciaram que a Chefatura de Polícia local proibiu que os comunicadores cobrissem esta fonte, em represália por haver publicado dados que classificou como confidenciais.
Em 30 de dezembro, Enrique Arosemena, gerente geral do Equador TV, canal criado pelo governo de Rafael Correa, denunciou que foi ameaçado através de chamada telefônica em que lhe disseram não se meta mais com Pablo Guerrero, pessoa acusada de ter invadido as instalações da emissora de televisão, em 30 de setembro passado.
Em 3 de janeiro de 2011, Elizabeth Cárdenas, juíza adjunta do Primeiro Tribunal do Trabalho, rejeitou a Ação de Proteção apresentada por Wilson Cabrera, jornalista e dono da rádio La Voz da Esmeralda Oriental Canela, depois que o Conselho Nacional de Telecomunicações (Conatel) determinou à Superintendência de Telecomunicações (Supertel) o fechamento da emissora que funciona na cidade amazônica de Macas.
Em 31 de janeiro, o governo interrompeu pela terceira vez o programa 'Los Desayunos de 24 Horas', da Teleamazonas, por questionar as opiniões e comentários expressos pela apresentadora María Josefa Coronel ou algum de seus convidados. Na primeira ocasião, em 18 de janeiro, questionou o modo pelo qual María Josefa comentou a avaliação da gestão presidencial. Na segunda vez, em 25 de janeiro, classificou-a com protagonista política de oposição, apresentando em seguida mulheres de condição humilde opinando contra a apresentadora.
Em 2 de fevereiro, José Acacho, ex-diretor da rádio La Voz de Arutam e dirigente da Federación Shuar, foi detido pelo processo em existência contra ele, acusado de sabotagem e terrorismo, supostamente por incitar protestos através da emissora, durante a greve amazônica de 30 de setembro de 2009, quando morreu o professor Bosco Wisum.
Em 7 de fevereiro, o diário El Universo denunciou em suas páginas a proibição de acesso a informações públicas depois que dois cartórios de Quito se negaram a entregar uma cópia da declaração juramentada dos bens do ministro das Relações Exteriores Ricardo Patiño, que também já foi ministro de outras áreas no governo de Rafael Correa.
Em 10 de fevereiro, a equipe jornalística do canal Telemar, da cidade de Esmeraldas, foi agredido pelo agente fiscal Jhonny Bedoya e um policial, que tentaram arrancar a câmera de vídeo e impedir que se gravassem imagens, durante uma operação policial. O fiscal exigiu que o material fosse apagado e ordenou que os policiais tomassem a câmera, dizendo que ela estava confiscada.
No mesmo dia, o programa de comentários 'Contacto Directo', da Ecuavisa, foi interrompido durante quase dez minutos, por mensagem governamental criticando o ex-presidente Lucio Gutiérrez, que fora convidado no dia anterior para participar deste mesmo programa.
Em 15 de fevereiro, o noticiário da rádio Quito foi interrompido durante quinze minutos por uma cadeia governamental dedicada a criticar, questionar e desacreditar a entrevista realizada no dia anterior por Miguel Rivadeneira, jornalista e diretor da estação de rádio, com o coordenador da superintendência que investigou os contratos do irmão do presidente, Fabricio Correa, com o Estado.
Em 16 de fevereiro, uma mensagem governamental interrompeu por quase dez minutos o programa de comentários da rádio Democracia apresentado por Gonzalo Rosero, desacreditando o deputado da oposição Galo Lara, que fora entrevistado no dia anterior neste noticiário.
Em 20 de fevereiro, o secretário de Comunicação, Fernando Alvarado, também chamou de sicários de tinta o diário El Universo e seu colunista Emilio Palacio, a revista Vanguardia, José Hernández, subdiretor do diário Expreso, e a Associação Equatoriana de Editores de Jornais. Alvarado disse que são sicários de tinta e comerciantes de informações porque assassinam a verdade por interesses comerciais.
Em 21 de fevereiro, o secretário de Comunicação, Fernando Alvarado, denunciou perante a Superintendência de Telecomunicações que a emissora de televisão Ecuavisa cometeu uma infração pela superposição de mensagem gráfica com o texto 'Cadeia do governo', durante a transmissão de uma cadeia governamental.
Nesse mesmo dia, Ángel Benalcázar, jornalista do canal Megavisión de Esmeraldas, e o fotógrafo Lizandro Loor foram ameaçados e impedidos de realizar a cobertura de evento no Município de Quinindé, onde se explicava a socialização do funcionamento de uma subestação elétrica.
Em 26 de fevereiro, o presidente Correa chamou o diário El Universo de conspirador, irresponsável e acusou-o de semear discórdia por, supostamente, empreender campanha para indispor os membros da Polícia contra o governo, depois de publicar o que o mandatário classificou de boatos e declarações fora do contexto sobre mudanças futuras que o Executivo fará na estrutura policial. O chefe de Estado reiterou as expressões contra a imprensa e chamou-a de corrupta, sensacionalista e manipuladora.
Sete dias depois, em 5 de março, o presidente Correa, durante sua transmissão aos sábados, anunciou que processará judicialmente qualquer pessoa que pretenda insultá-lo e confirmou sua disputa judicial com Marcos Sovenis, porque chamá-lo de fascista é um delito e criticou a imprensa por dizer que atentou contra um cidadão por expressar seu pensamento.
Em 2 de março, foi ao ar uma segunda rede de comunicações governamental para questionar o programa 'Contacto Directo' da Ecuavisa. A primeira rede de 28 de fevereiro, como esta, se destinou a questionar o jornalista Alfredo Pinoargote, dizendo que ele fez comentários sem nenhuma lógica.
Em 5 de março, o primeiro mandatário também dedicou uma parte da transmissão cidadã dos sábados para criticar Pinoargote com um vídeo de conteúdo semelhante ao das duas redes governamentais. Correa insinuou que Pinoargote é um mensageiro dos poderes locais e até questionou o seu nível de inteligência: Este Pinoargote tem inteligência média. Ele se acha inteligente; não é nem idiota nem inteligente, mas por sua má fé já está ficando até grosseiro..., disse o mandatário, se referindo à entrevista do comunicador com prefeito de Guayaquil, Jaime Nebot.
Nesse mesmo sábado, o presidente Correa voltou a estigmatizar o trabalho dos meios de comunicação privados e acusou-os de manipuladores, medíocres, corruptos, conspiradores, sicários de tinta e golpistas. Criticou a decisão do Conselho Nacional Eleitoral (CNE) de proibi-lo de fazer campanha em suas transmissões aos sábados e afirmou que a medida responde às pressões da imprensa corrupta porque tem medo do que o presidente diz. Qualificou de mentirosos e manipuladores os artigos dos diários El Comercio e La Hora e da revista Vanguardia, sobre o nível baixo de audiência das suas transmissões aos sábados.
O presidente Correa acusou o diário El Comercio de incitar o assassinato do general Eloy Alfaro com um artigo publicado em 11 de janeiro de 1912, e afirmou que a mídia sempre foi assim, semeadora de ódio, cúmplice de assassinato e depois se escandaliza hipocritamente em nome da liberdade de expressão.
Depois chamou o diário Hoy de golpista por uma caricatura indicando que Correa está cansado da Marinha e aproveitou para acusar mais uma vez a mídia de estar por trás do que aconteceu em 30 de setembro.
E apesar de Correa se apresentar como cidadão em todas as suas demandas, a título pessoal, em 28 de março de 2011, o governo dedicou uma rede nacional de televisão para questionar e criticar os jornalistas investivos Juan Carlos Calderón e Christian Zurita, autores do livro El Gran Hermano, que revela contratos firmados entre Fabricio Correa, irmão do presidente, e o governo.
Durante a transmissão, que durou cerca de seis minutos, afirmou que os autores do livro mentem e não conseguem provar suas afirmações, em relação a uma citação onde dizia que Rafael Correa conhecia de fato estes contratos.
Madrid, Espanha