Continuam em vigor no país a censura prévia e a autocensura da imprensa com a promulgação de duas leis que ameaçam o fechamento da mídia e a imposição de penas de prisão aos jornalistas infratores.
Tratam-se das leis da Luta Contra o Racismo e Toda Forma de Discriminação e do Regime Eleitoral, em vigor há um ano. Estas mudanças na legislação são muito questionadas por organizações jornalísticas bolivianas porque mantêm limitações à liberdade de imprensa.
A primeira estabelece que o meio de comunicação que autorizar e publicar ideias racistas e discriminatórias estará sujeito a sanções econômicas e de suspensão da licença de funcionamento e que o comunicador social ou proprietário de meio de comunicação que incorra nesses delitos será punido com penas entre um e cinco anos de cadeia, sem recurso a nenhum foro.
Esta interpretação dependerá do critério arbitrário de um comitê integrado unicamente por funcionários governamentais, o que põe em dúvida a sua imparcialidade e coloca a mídia e os jornalistas em risco de serem punidos por suas posições críticas ou favoráveis ao governo.
A segunda é a Lei de Regime Eleitoral, correspondente às eleições de membros do Órgão Judicial, que ocorrerão pela primeira vez em outubro deste ano.
Os candidatos não podem fazer propaganda, nem declarações aos meios de comunicação sobre qualquer assunto relacionado à sua candidatura ou de outros candidatos sob pena de desqualificação. Por sua vez, os meios de comunicação, sujeitos às sanções penais, estão proibidos de divulgar documentos diferentes dos produzidos pelo órgão eleitoral, a mencionar especificamente os candidatos de modo negativo ou positivo, a gerar espaços de opinião sobre os candidatos e a lhes ceder espaços para expressão da opinião, condução ou participação em qualquer programa.
Como consequência dessas duas leis, principalmente a da luta contra o racismo, muitos meios de comunicação optaram por eliminar das suas páginas eletrônicas os comentários sobre as suas informações, dando como motivo as sanções impostas pela lei. Outros advertem que os artigos dos seus leitores podem não ser publicados se forem constatadas frases potencialmente racistas ou discriminatórias.
Além de ignorar a lei de imprensa, as duas leis obrigam os jornalistas a praticarem autocensura, devendo a sua chefia exercer censura prévia para evitar possíveis deslizes nos artigos, com palavras eventualmente interpretadas como racistas e discriminatórias ou consideradas como violação da Lei de Regime Eleitoral.
Na Bolívia, vigora desde 1925 uma Lei de Imprensa que estabelece o julgamento dos delitos de imprensa por tribunais de imprensa criados pelos municípios, em que as penas são a retratação e multas econômicas. A mídia se vê obrigada a restringir o seu trabalho e a limitar as tarefas dos jornalistas.
Uma sondagem de opinião em um pequeno grupo de jornalistas, diretores e chefes de redação mostrou que 90 por cento deles admitem que a Lei de Luta Contra o Racismo e Toda Forma de Discriminação os obrigou a exercer autocensura ou censura prévia para evitar possíveis punições.
Os chamados órgãos legislativos e executivos ignoram os pedidos e recomendações de organismos internacionais, especialmente da Alta Comissária dos Direitos Humanos nas Nações Unidas, Navaneth Pilay, para não continuarem a emitir leis que afetem os direitos humanos e para revogarem todos os artigos de leis que atentam contra a liberdade de expressão.
O parlamento também demora excessivamente a apreciar a legislação de regulamentação da Lei de Iniciativa Cidadã que permitiria às organizações jornalísticas a apresentação de projeto para revogação dos artigos das duas leis indicadas, que afetam a liberdade de expressão, com base na rejeição pela cidadania expressa por cerca de 400.000 pessoas que, com as suas assinaturas, apoiaram esta luta pela liberdade de expressão ocorrida há um ano.
Este ano houve uma significativa redução das agressões físicas a jornalistas e meios de comunicação em relação aos anos anteriores. Apesar disso, as autoridades do governo continuam atribuindo grande parte da culpa de seus erros aos meios de comunicação. A mídia mente, a mídia distorce as declarações, a mídia não expressa exatamente o que foi dito, são as frases frequentes dos dirigentes políticos oficiais, especialmente quando as suas declarações geram reações adversas na população.
Segundo os registros da ANP, as agressões verbais e físicas, de janeiro a setembro de 2011, atingiram 131 jornalistas, dos quais só um era de mídia estatal, sendo os demais 130 da mídia independente.
Foram registradas também 40 agressões verbais e físicas contra meios de comunicação, sendo a maior delas a aquisição de toda a edição de 6 de julho do diário Sol de Pando pelo governo deste departamento amazônico para evitar o conhecimento das informações sobre supostos casos de corrupção do governador. O governo negou a denúncia feita pela pessoa que disse que a secretaria do governador lhe comprou os 2.000 exemplares desse dia e o diretor do jornal anunciou uma ação judicial contra a autoridade.
O governo descumpriu também seu compromisso de submeter a processo os policiais que agrediram a tiros jornalistas em setembro de 2009 na cidade de Santa Cruz e a procuradoria geral nada fez para esclarecer o assassinato do jornalista Carlos Quispe Quispe, morto por uma multidão de políticos pró-governamentais exaltados, em março de 2008, nesta localidade.
Madrid, Espanha