Uma ampla variedade de questões, novas e antigas, afetou a mídia dos Estados Unidos este ano. As práticas emergentes da mídia social e digital levantaram um conjunto de novas problemáticas, desde a regulamentação da Internet até o jornalismo cidadão. Incidentes mais tradicionais, como agressões físicas a jornalistas e as iniciativas políticas para silenciar a mídia, também ocorreram.
O caso Wikileaks continua a dividir a comunidade da mídia. Em setembro, o site controvertido de denúncias divulgou sem censura todo o seu manancial de 251.287 mensagens eletrônicas vazadas, provenientes de embaixadas dos EUA, despertando a crítica de jornais e grupos jornalísticos.
O soldado do exército Bradley Manning, suspeito de fornecer os documentos classificados do governo publicados por WikiLeaks, está preso em Fort Leavenworth, Kansas. Ele enfrenta mais de uma dúzia de acusações e poderá ser condenado à prisão perpétua.
Oficiais do exército declaram que Manning é acusado de usar software não autorizado em computadores do governo para extrair informações classificadas, fazer o download ilegal dessas informações e transmiti-las para divulgação pública por quem o exército denomina de "inimigo". As peças de acusação não fazem nenhuma menção do WikiLeaks nem do seu fundador, Julian Assange.
Jornalistas que cobrem o movimento Ocupar Wall Street, mobilização de protesto contra o sistema financeiro e a ganância dos bancos, iniciado em 17 de setembro, denunciaram restrições de informações e detenções em outubro, principalmente em Nova York, onde o Departamento de Polícia considera jornalistas aqueles que possuem um passe de imprensa emitido pela polícia, o que gerou discussões em blogs independentes.
No início de outubro, Natasha Lennard, jornalista autônoma e colaboradora de um blog do The New York Times, foi detida durante várias horas por não possuir o passe concedido pela polícia, e o mesmo aconteceu com Kristen Gwynne, da revista digital AlterNet. Durante as manifestações, que se estenderam até Washington e outras cidades do país, John Farley, jornalista da revista MetroFocus, foi detido e libertado oito horas depois, ao passo que alguns outros jornalistas, inclusive Dick Brennan e Roy Isen, do canal Fox5, foram agredidos.
Depois do escândalo do hacking na News Corp, de Londres, no verão, os tradicionais oponentes da concentração da propriedade da mídia nos Estados Unidos questionam se devemos permitir que a News Corp mantenha suas 27 licenças de transmissão de TV e reivindicam regras que imponham a diversificação da propriedade da mídia.
O gabinete do governador da Flórida, Rick Scott, está sob pressão para retirar ou emendar uma medida que limite o acesso aos detalhes de assassinatos que, segundo grupos de defesa da liberdade de imprensa, sabotaria a capacidade de investigação da mídia e o direito do público de saber a verdade a respeito desses crimes. A nova lei, promulgada em 2 de junho e que proíbe a divulgação de fotos, vídeos ou gravações referentes a um assassinato, dificultou o relacionamento já tenso entre a mídia na Flórida e o gabinete do governador.
Organizações que representam as livrarias, bibliotecários, editores e autores manifestaram a sua frustração e decepção com a decisão do Congresso, em maio, de renovar por quatro anos a autorização das cláusulas da lei antiterrorista Patriot Act em vias de expirar, sem restaurar as salvaguardas de proteção da privacidade dos registros das bibliotecas e livrarias que foram eliminadas com a promulgação da Patriot Act em 2001.
A Patriot Act dá ao governo o direito de investigar sigilosamente os registros de qualquer pessoa considerada "relevante" em uma investigação sobre terrorismo. Por outro lado, o procurador geral Eric Holder prometeu que o governo limitaria voluntariamente suas buscas em bibliotecas e livrarias aos registros de pessoas que sejam realmente suspeitas de terrorismo e de pessoas que sejam conhecidas dos suspeitos.
O editor de um noticiário político sobre o Zimbábue, The Insider, fundado em 1990 e editado pelo jornalista veterano Charles Rukuni, reclama contra a desativação de seu website hospedado nos EUA, em decorrência de reclamações feitas por um crítico da sua publicação.
O site de Rukuni é um dos únicos veículos de comunicação para jornalismo investigativo naquele país. Rukuni disse que recebeu um e-mail da Powweb, que hospeda seu site nos EUA, declarando que se havia feito uma reclamação de direitos autorais referente a alguns artigos de Rukuni. A legislação dos EUA estabelece liberdade suficiente aos serviços de hospedagem, isentando-os de responsabilidade civil para que podem hospedar conteúdo sem autocensura. Mas o caso de Rukini sugere que os jornalistas on-line possam estar vulneráveis aos seus concorrentes ou críticos, que podem tirá-los do ar sem nenhuma sentença judicial e com base em acusações de violação de direito autoral.
James Risen, repórter do New York Times, recebeu em 23 de maio uma intimação do Departamento de Justiça para testemunhar em um julgamento de Jeffrey Sterling, um ex-agente da CIA, no caso de uma acusação criminal de divulgação de informações confidenciais aos jornalistas. É a quarta vez que recebe intimação.
O Departamento de Justiça disse que James Risen é testemunha no caso Sterling e tem obrigação de revelar suas fontes e informações ao júri. Se recusar, poderá ser preso por desacato ao tribunal.
As pessoas que apoiam Risen alegam que o caso expõe a necessidade de uma lei de proteção federal para defender os jornalistas de serem obrigados a revelar as suas fontes.
Três jornalistas americanos devem receber US$ 100.000 em decorrência de um acordo por suas prisões durante a Convenção Nacional Republicana em 2008. A jornalista Amy Goodman, apresentadora do programa de rádio sindicalizado "Democracy Now!", e os produtores Nicole Salazaar e Sharif Abdel Kouddous, junto com cerca de 40 ou 50 outros jornalistas e 800 participantes de protestos e espectadores, foram presos enquanto faziam a cobertura de protestos fora da convenção em St. Paul, Minnesota. Todas as acusações contra os jornalistas já foram retiradas, mas Amy Goodman e seus colegas moveram uma ação em 2010 sobre a alegada batida policial contra os jornalistas.
Como parte do acordo, as cidades gêmeas de St. Paul e Minneapolis concordaram em pagar um total de US$ 90.000 e o governo dos EUA pagará US$ 10.000, noticiou a Pioneer Press. As cidades gêmeas também desenvolverão uma política e treinamento para policiais visando evitar a infração dos direitos estabelecidos na primeira emenda da constituição americana a jornalistas que fazem a cobertura de protestos.
Três vereditos de culpado foram proferidos em 9 de junho no caso do assassinato de Chauncey Bailey, jornalista e editor do Oakland Post e que foi morto a tiros quando caminhava para o seu trabalho em 2 de agosto de 2007. Dois dos condenados receberam sentença de prisão perpétua sem direito à liberdade condicional, e o terceiro de 25 anos na cadeia.
Tony Overman, um fotojornalista no jornal The Olympian em Olympia, no Estado de Washington, teve seus pneus rasgados e dedo-duro pintado com spray na sua picape, em incidente aparentemente motivado por fotos de manifestantes anarquistas. As palavras dedo-duro Overman foram também grafitadas com spray no escritório do jornal, com danos de US$ 11.000 no prédio.
Os candidatos presidenciais republicanos Mitt Romney, Rick Perry, Jon Huntsman, Michele Bachmann e Herman Cain aderiram ao boicote da principal rede de TV de língua espanhola nos EUA, que foi organizado por legisladores do partido na Flórida como demonstração de solidariedade ao senador federal Marco Rubio. A controvérsia surgiu depois que o gabinete de Marco Rubio acusou a Univisión Networks, com sede em Miami, de pressioná-lo a participar de um programa para debater a questão da imigração nos Estados Unidos em troca de atenuar uma investigação jornalística relacionada ao seu cunhado, Orlando Cicilia, condenado em caso de tráfico de drogas de 1987.
A Univisión negou a acusação. A SIP criticou o boicote, chamando-o de uma ação impensada que prejudica o direito do público de ser devidamente informado. O presidente da SIP, Gonzalo Marroquín, declarou em uma carta enviada aos candidatos que estamos preocupados com os danos provocados por esta atitude no processo democrático que precisa basicamente de uma ampla gama de providências e informações. O presidente da SIP também criticou o pedido feito pelos candidatos do Partido Republicano de que a Univision demita o editor de notícias Isaac Lee como condição para comparecimento ao debate.
Três escritores chineses que passaram algum tempo na prisão por artigos publicados on-line estão processando a Cisco Systems Inc., empresa sediada na Califórnia que supostamente forneceu informações e tecnologia às autoridades chinesas, o que originou as detenções dos escritores. A Cisco rejeita categoricamente estas alegações. Os escritores, Du Daobin, Liu Xianbin e Zhou Yuanzhi são representados pelo escritório de advogados Ward & Ward, com sede em Washington. O processo foi apresentado em junho perante o Tribunal Federal Regional de Maryland contra a Cisco e diversos de seus executivos. Os três escritores sofreram perseguição por expressarem seus pontos de vista on-line. A ação judicial pretende provar que a Cisco está envolvida nesta perseguição, e afirma que documentos internos detalham o desenvolvimento e implantação, pela empresa, do sistema de censura Golden Shield (Escudo Dourado) para o Partido Comunista Chinês. Além de bloquear o conteúdo, o sistema fornece "os meios de identificação e localização imediata dos usuários da Internet", alega a ação judicial.
Os autores da ação reclamam também que há evidência de que a Cisco criou uma Equipe de Serviços Avançados dedicada ao treinamento de dirigentes do Partido Comunista Chinês, ensinando-os a usar os produtos da Cisco com esta finalidade.
No passado, outras empresas sediadas nos EUA enfrentaram críticas por cooperarem com o governo chinês, inclusive a Yahoo, Google e Microsoft. Em 2008, a Yahoo, Google e Microsoft juntaram-se a organizações de direitos humanos, professores e alunos universitários, e investidores para constituírem a Global Network Initiative (GNI - Iniciativa da Rede Global), adotando princípios para proteção da privacidade e liberdade de expressão on-line.
As novas regras dos Estados Unidos sobre a neutralidade da Internet, que a Comissão Federal de Comunicações dos EUA (FCC) aprovou em 21 de dezembro de 2010, foram finalmente publicadas no Federal Register (o diário oficial do governo federal dos EUA) em 23 de setembro, para entrada em vigor em 20 de novembro.
A FCC está reforçando diversos princípios de neutralidade da Internet. Ela declara, por exemplo, que pretende preservar a Internet como uma plataforma aberta para inovação, investimento, criação de empregos, crescimento econômico, livre concorrência e liberdade de expressão.
A FCC proibiu a filtragem de conteúdo legal, mas permite o bloqueio de websites ilegais e transmissões P2P (Peer-to-Peer). Os ISPs (Internet Service Providers provedores de serviços de Internet) não poderão fixar cobranças dos consumidores com base no uso da largura de banda e precisarão ser mais transparentes quanto às suas práticas de gerenciamento de rede. Os ISPs manterão o direito de aumentar a largura de banda disponível para as empresas que precisarem disso para enviar conteúdo que demande muita largura de banda. Os críticos da medida alegam que as novas regras deixam de garantir a neutralidade e universalidade da Internet porque favorecem os interesses comerciais dos que precisam de maior largura de banda.
Diversas operadoras de banda larga anunciaram que apresentarão na justiça contestações às regras da FCC, inclusive a Verizon, MetroPCS e a organização sem fins lucrativos Free Press.
Os americanos dedicam apenas uma pequena fração do seu tempo on-line às notícias em comparação com as redes sociais, e a próxima geração de usuários on-line vai recorrer à mídia social e à televisão para suas notícias.
Um relatório da Nielsen, "State of the Media: The Social Media Report" (O estado da mídia: relatório sobre a mídia social), descobriu que as pessoas nos EUA gastam 22,5% do seu tempo na Internet em redes sociais e blogs, e apenas 2,6% em notícias.
Madrid, Espanha