Peru

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Este período, marcado por uma campanha política prolongada e turbulenta, um clima crescente de intolerância frente à fiscalização da imprensa, evidenciado pelo assassinato de três jornalistas em um espaço de apenas três meses, nos deixa um balanço negativo em matéria de defesa das liberdades de expressão e de imprensa. No período a partir de abril e ora encerrado, nas semanas após a cerimônia de mudança de comando no governo, em fins de julho e no dia em que o candidato Ollanta Humala Tasso, eleito no segundo turno eleitoral, assumiu a presidência, a imprensa ficou entre duas frentes. Por um lado, registrou-se um vertiginoso aumento de casos de hostilidade violenta, ameaças de morte, agressões físicas e verbais, perseguição judicial e intimidação contra jornalistas e meios de comunicação em diversas regiões do país. Durante este período e fora do contexto eleitoral, três jornalistas foram assassinados, enquanto a impunidade nos casos de crimes contra jornalistas se mantém inalterada. Em 3 de maio, Julio Castillo Narváez, apresentador do noticiário Ollantay, transmitido pela rádio Ollantay na cidade de Virú, no departamento de La Liberdad, faleceu assim que dispararam tiros contra ele enquanto almoçava em um restaurante local. Castillo Narváez era um crítico contumaz da gestão das autoridades locais, provinciais e regionais. Segundo relatos, recebia amaças de morte, tanto veladas como explícitas, que recrudesceram nestes últimos dias, com base na divulgação de denúncias de irregularidades supostamente cometidas no âmbito do governo regional de La Liberdad e do perigo decorrente da proliferação de delinquentes comuns na região. Em 6 de setembro, Pedro Alonso Flores Silva, diretor do programa informativo Visión Agraria, transmitido pelo canal 6 em Casma, região de Ancash, foi assassinado por um homem encapuzado que lhe deu dois tiros, ocasionando-lhe ferimentos graves. Ele faleceu na manhã de quinta-feira, 8 de setembro. Em 17 de setembro, cerca de vinte policiais capturaram na cidade de Casma o delinquente conhecido como “El Viejo”, que planejou o crime. Este indivíduo contratou um bandido identificado como Emilio Siriaco Agreda, de vinte e um anos, para intimidar Flores Silva. Mas, ao que parece, ele se excedeu e o matou. Em 14 de setembro, José Luis Oquendo Reyes, dirigente sindical de construção civil e apresentador do programa Sin Fronteras, transmitido pela estação de televisão BTV Canal 45, foi assassinado por três desconhecidos em Urbanización Rosedal. O jornalista morreu em decorrência dos ferimentos que comprometeram seus órgãos internos antes de receber atendimento médico. O Juizado de Investigação Preliminar do distrito de Pueblo Nuevo determinou a prisão preventiva de Teobaldo Gilberto Fajardo Ormeño, conforme pedido formulado pelo Ministério Público, por ser um dos supostos responsáveis pela morte do jornalista. Por outro lado, em maio, ocorreram dois casos indicativos da intolerância durante o processo eleitoral. Em 6 de maio, Jaime de Althaus, apresentador do programa La Hora N, transmitido pelo Canal N, foi agredido ao se preparar para sair, quando quase uma centena de participantes de manifestação convocada pelas redes sociais, simpatizantes do partido nacionalista Gana Perú de apoio ao candidato Ollanta Humala, cercou o seu carro, impedindo-o de se deslocar. Apesar da aparente participação de seus seguidores, o partido político Gana Perú condenou o ato. Dias depois, em 11 de maio, o jornalista denunciou que foi vítima de ameaças de morte por telefone. Nesse mesmo dia, César Lévano, jornalista e Arturo Belaúnde, diretor e presidente do conselho diretor do diário La Primera, denunciaram que um desconhecido entregou no jornal duas coroas de flores, com tarjas assinadas –falsamente-- pelo Conselho da Imprensa Peruana e pelo IPYS- Instituto de Imprensa e Sociedade. O diário La Primera atribuiu o fato à tentativa de lhe ensinar uma lição pela linha editorial de apoio à candidatura presidencial de Ollanta Humala. A atuação inusitada e antagônica de muitos meios de comunicação e jornalistas em relação à agenda eleitoral também contribuiu para a polarização da sociedade. Alguns meios foram acusados de desinformar o público no afã de favorecer um candidato e de manter uma cobertura eleitoral parcial. Na verdade, vários jornalistas denunciaram que foram censurados, pressionados e demitidos dos seus meios de comunicação por se negarem a tomar partido do candidato escolhido pelos diretores e proprietários dos seus locais de trabalho. Entre os casos mencionados, figura a denúncia de demissão da produtora geral de notícias, Patricia Montero, e do produtor do noticiário “De 6 a 9”, José Jara, os dois do Canal N. Os representantes da empresa do referido canal de notícias a cabo informaram que suas demissões foram resultado de mudanças na produção do canal. Foram justificadas pela nomeação de Fabricio Torres de Águila como diretor jornalístico do Canal N. Depois disso, teve início uma polêmica quanto à renovação do contrato da jornalista Rosa Maria Palacios, apresentadora do “Prensa Libre”, um dos programas políticos mais antigos do país e transmitido pela América Televisión. Vários setores jornalísticos opinaram que na prática isso constituía uma censura a um jornalista. Porta-vozes do canal informaram que diante do vencimento do contrato de Palacios, havia-se optado pela reestruturação da programação do canal. Registramos também diversos casos nas províncias. Entre estes, as denúncias de pressões e censuras que levaram à demissão no trabalho dos apresentadores dos noticiários transmitidos pela rádio Líder em Arequipa, Federico Rosado, Jesús Coa e Jorge Álvarez; em Huancayo, do repórter da revista dominical Parada 4, transmitida peal filial da América TV José Alberto Soriano, assim como de Yuri Castro Sánchez, comentarista do programa Réplica, no departamento de La Libertad. Os diretores da rádio Diplomat o convidaram a se retirar temporariamente do programa. Finalmente, na região de Huánuco, o jornalista Elvis Italo Guillermo alertou ser objeto de ameaças de morte depois do cancelamento de seu programa no canal 4 JSV, e Walter Altamirano Vásquez denunciou que seu programa Palabra Viva, da rádio La Caribeña, na província de Jaén, departamento de Cajamarca, foi cancelado por razões políticas. Em julho, também chamou atenção a interpretação irracional que diversos Tribunais Eleitorais Especiais deram à legislação eleitoral sobre a divulgação de pesquisas e a publicação das fichas técnicas de cada pesquisa, aprovada pelo Tribunal Eleitoral Nacional em dezembro de 2010. Vale lembrar o ocorrido nos processos eleitorais passados, quando a mídia resolveu publicar um resumo integral de cada pesquisa em suas edições impressas e as extensas fichas técnicas em seus portais eletrônicos. Por isso, surgiu uma grande preocupação quando pelo menos dez diários, como La Razón, Gestión, Correo, El Comercio, Peru 21, Trome, La Nación, Expreso, La República, Extra, El Popular e Del País, foram citados pela Polícia Nacional do Peru e notificados pelo Ministério Público por denúncias relacionadas a infrações ao regulamento eleitoral. Entre estas, o caso de La Razón, que merece atenção especial. Embora a publicação da ficha técnica não configure delito penal, o seu diretor Uri Ben Schmuel foi denunciado por delito de desacato à autoridade, conforme disposições do artigo 368 do Código Penal. Com base em gestões perante a presidência do JNE realizadas pelo Conselho da Imprensa Peruana, a autoridade eleitoral aceitou validar a publicação da ficha técnica em datas posteriores ao limite máximo estabelecido e, segundo informações, ainda faltavam poucos casos para serem resolvidos. Esta situação evidencia que o regulamento eleitoral exige revisão e reformulação. Chamou atenção a condenação à prisão, suspensa por dois anos, do diretor do diário Perú 21, Sr. Fritz Dubois, e de sua correspondente na cidade de Arequipa, por uma de suas colunas de opinião, ao se referir à suposta conduta indevida de uma candidata ao congresso nas eleições de 2011. O jornalista Paul Garay Ramírez, diretor e apresentador do programa Polémica da Visión 47 TV e do programa La Voz do Pueblo da rádio La Exitosa, foi processado pelo procurador geral de Pucallpa, Dr. Agustín López Cruz, que o acusou de difamação, entre novembro e dezembro de 2010, usando frases injuriosas como: “Ouvi dizer que os procuradores gerais das províncias vêm para Pucallpa atrás de grana”, e também o chamou de “anão erótico” ou “pessoa indesejável”. Conforme sentença de 19 de abril de 2011, Jesús Morote Mescua, juiz do 2o Tribunal Penal da Província de Coronel Portillo condenou o jornalista Garay Ramírez a três anos de pena de privação efetiva de liberdade e ao pagamento de 3.500 soles de indenização como reparação civil. Esta sentença contradiz a jurisprudência peruana que, em casos de condenação por difamação em primeira instância, estabelecem-se sentenças de prisão suspensas, ou não efetivas nem com privação de liberdade. Desde então ele se encontra preso. Em 11 de julho foi transferido de Pucallpa para a Penitenciária de Potracancha, no departamento de Huánuco a pedido do diretor da Penitenciária de Pucallpa, sob o argumento de que não existiam condições de segurança. Finalmente, por ordem da 3ª Câmara Penal para Réus de Lima, ele foi transferido em 13 de julho para a Penitenciária Castro Castro, situada na cidade de Lima, para servir de testemunha no julgamento do ex-prefeito do Município Provincial de Coronel Portillo, Luis Valdez Villacorta, pelo assassinato do jornalista Alberto Rivera Fernández em 2004, na cidade de Pucallpa. Em 15 de julho, Paul Garay testemunhou e continua preso até agora na Penitenciária Castro Castro. Em abril, durante o fórum dos Candidatos Presidenciais e a Liberdade de Expressão no Peru, organizado pelo IPYS e o Conselho da Imprensa, Ollanta Humala afirmou que “em momento algum” propôs mover ações judiciais contra algum meio de comunicação: “Minha conduta nestes casos é a de não processar, apesar de ter sido vítima destas atitudes que vocês chamam de “demolidoras””. Esclareceu que “embora o Presidente, em casos extremos, pudesse recorrer ao Poder Judiciário, entendemos que não seria o mais adequado já que seu poder é maior do que o da mídia ou da pessoa que o critica”. Do mesmo modo, o então candidato do partido Gana Perú falou a respeito da distribuição de licenças para a mídia eletrônica, um tema que se destacou fortemente no debate. “O papel do Estado na transição da televisão analógica para digital é o de assegurar uma divisão equitativa das novas frequências e a transparência, precisão e clareza na distribuição de frequências para evitar o partidarismo e a politização. (...) Todo procedimento e decisão a respeito da concessão de licenças deverá ser supervisionado por um órgão regulador independente, que destaque a participação dos governos regionais, da sociedade civil, dos jornalistas, dos proprietários dos meios e do Estado.”

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