Ocorreram nesse período vários incidentes que agravam e agravarão a situação da liberdade de imprensa, como os seguintes: agressões contra meios de comunicação e jornalistas, restrições de divisas para produtos importados para a produção de jornais, a criação de um órgão oficial de censura, a saída do Sistema Interamericano de Direitos Humanos desde 10 de setembro, e o pedido do presidente Nicolás Maduro perante a Assembleia Nacional de uma Lei Habilitante que lhe permita governar por decreto por 12 meses, com o objetivo de atacar a corrupção e resolver a situação econômica que assola o país.
Nesse semestre, ocorreram também várias transferências de propriedade e compra e venda de meios de comunicação nacionais e regionais. Ainda que, na maioria dos casos, não tenha havido muita mudança na sua política editorial, foi palpável o impacto nas suas audiências. Um caso emblemático é o da Globovisión, em que vários programas informativos e de opinião foram suspensos. Houve cortes também na programação dos meios do governo, e programas que tinham um importante público deixaram de ser transmitidos.
Neste período, registrou-se também um aumento das ações judiciais contra os meios de comunicação privados, o que foi considerado por várias organizações como um sério ataque à liberdade de expressão.
Em 1º de agosto, o jornalista Leocenis García, editor do grupo 6to Poder, foi acusado e detido após acusações do presidente da Comissão de Meios da Assembleia Nacional, Julio Chávez, de suposta lavagem de dinheiro. Antes disso, a sua conta e as contas bancárias do jornal haviam sido congeladas. Em 5 de agosto, e como resultado do congelamento dos bens, o diretor do jornal, Alberto Rodríguez, anunciou o fechamento formal da empresa. García continua preso no Departamento de Inteligência Militar.
Em 8 de agosto, os jornais El Nacional e Tal Cual foram multados com 1 por cento da sua receita do ano de 2009 por publicar e reproduzir – respectivamente – uma imagem da situação deplorável do necrotério de Bello Monte, em Caracas. O tribunal estabeleceu também que o El Nacional não poderá publicar imagens de conteúdo violento, armas, assaltos, cadáveres ensanguentados e nus.
Dias antes, em 27 de julho, de forma surpreendente, e a pedido da Procuradoria-Geral, as autoridades judiciais acordaram a proibição de alienar ou tributar bens e congelar as contas bancárias pessoais do diretor do El Nacional, Miguel Henrique Otero.
O jornal Correo del Caroní e seu presidente e editor, David Natera Febres, foram proibidos de publicar informações sobre o empresário de mineração Yamal Mustafá por “difamação e injúria” e “perdas e danos”, e receberam multa de 20 milhões de bolívares.
O tribunal aprovou o embargo do Correo del Caroní e David Natera e estabeleceu uma fiança de 46 milhões de bolívares.
Em 10 de outubro, o Procurador-Geral ordenou uma investigação contra o jornal 2001, “por criar um clima de apreensão na sociedade”, referindo-se ao abastecimento de gasolina no país. Explicou que aplicará “sanções fortes” contra o jornal por publicar na primeira página uma “manchete falsa” e que, na sua opinião, desestabiliza a paz nacional.
Os pesquisadores Marcelino Bisbal e Andrés Cañizález concordam que o controle dos meios de comunicação não se mede apenas pelo número de meios em poder do Estado. A aplicação de medidas administrativas, judiciais e econômicas é um mecanismo de dominação.
Bisbal e Cañizalez afirmaram que a política de comunicações do governo é sufocar a crítica através de ações judiciais e ataques econômicos. Várias leis e procedimentos jurídicos impostos pelo Executivo têm como objetivo “gerar mecanismos de autocensura e intimidação, tanto nos meios quanto nos seus profissionais de comunicação”.
O Instituto de Imprensa e Sociedade na Venezuela (IPYS) publicou outro estudo que coincide com a avaliação dos pesquisadores. O texto também menciona o jornal La Mañana, no estado de Falcón, onde se denunciou censura a determinados conteúdos pelos órgãos judiciais.
O IPYS menciona também as ações contra os jornalistas Horacio Contreras, locutor e diretor da Studio 102.7 FM, e Leonardo León, locutor da ULA 107.7 FM e correspondente do jornal El Nacional em Mérida, acusados de difamação, assim como intimação ao jornalista e locutor Nelson Bocaranda a comparecer a um tribunal.
A SIP também exigiu do governo a libertação imediata de Vïctor Manuel García Hidalgo, editor e diretor do portal de notícias “Informe Cifras”, preso desde março. García Hidalgo está na penitenciária Yare III, para pessoas processadas por crimes comuns.
Um problema grave para os jornais é a falta de divisas para adquirir o papel, tinta e outros insumos nos jornais, como peças sobressalentes, equipamentos e maquinarias.
Em agosto, cinco jornais regionais saíram de circulação por falta de papel. No interior, mais de 40 jornais em circulação estão sendo afetados e 25 dizem estar passando por dificuldades. Isso levou os jornais de menor porte a manter apenas suas edições online, a reduzir suas páginas ou sua tiragem, e até mesmo fazer sua publicação em dias alternados.
Devido ao controle cambial (desde 2003), houve uma redução na capacidade de compra das importadoras de papel e outros insumos para as prensas, como pranchas de impressão e tinta.
Belkys Blomdell, diretora do jornal El Caribazo (Nueva Esparta), disse que seu jornal, com tiragem de 15.000 a 25.000 exemplares, “emagreceu”, passando de 32 a 16 páginas no último ano. O mesmo aconteceu com o jornal Los Llanos, que passou de 28 a 20 páginas.
Os jornais pró-governo, como Vea, afirmam estar passando pelas mesmas dificuldades. Pedem que se agilizem os trâmites e que se instale uma fábrica de papel no país.
Em 1º de outubro, o jornal El Impulso do estado de Lara, um dos mais antigos do país, deu início a uma versão mais reduzida da sua edição, e agora é impresso em preto e branco. Informou que tem comprado a preços muito altos os insumos disponíveis dentro do país, qualificando de “calvário” o processo de obter os recursos para se manter em circulação.
Forçado pela falta de papel, pranchas e outros materiais caros e de difícil importação atualmente, o Antorcha, jornal de maior circulação em Anzoátegui anunciou que vai fechar suas portas depois de 59 anos. Outros jornais que deixaram de ser publicados são: El Sol de Maturín, do estado de Monagas; Versión Final, do estado de Zulia; El Caribazo, La Hora e El Caribe, estado de Nueva Esparta; Los Llanos e El Espacio, no estado de Barinas.
Alguns dias atrás, donos de jornais da região foram convidados a participar da Comissão de Meios de Comunicação da Assembleia Nacional, para discutir alguns problemas, entre eles a falta de papel.
O presidente e editor do jornal El Nacional, Miguel Henrique Otero, reclamou porque a Assembleia havia aprovado, dias antes, a liberação de quantias multimilionárias para os meios pró-governo, para a compra de papel.
Disse que “o irônico é que a Assembleia Nacional aprovou na semana passada uma quantia multimilionária (de divisas) para alguns jornais pró-governo, que são realmente do governo. Esse dinheiro destina-se à importação direta do papel para esses jornais, que são absolutamente oficiais.”
O governo criou em 7 de outubro o Centro Estratégico de Segurança e Proteção da Pátria (Cesppa), o que significa que poderá declarar de caráter reservado, confidencial ou de divulgação limitada qualquer informação, fato ou circunstância que considere estratégicos para preservar a segurança nacional e prever e neutralizar possíveis ameaças de inimigos internos e externos.
O artigo 3 afirma que o novo órgão “solicitará, organizará, integrará e avaliará as informações de interesse para o nível estratégico do país, associadas às atividades inimigas internas ou externas, provenientes de todos os órgãos de segurança e inteligência do Estado e outras entidades públicas e privadas, de acordo com o que for exigido pelo Departamento Político-Militar da Revolução Bolivariana”.
O decreto é quase idêntico ao publicado no Diário Oficial em 1º de junho de 2010, que criou o Centro Situacional de Estudos da Nação (Cesna).
Os considerandos dos dois decretos são iguais e as diferenças nos artigos se limitam à subordinação do órgão ao Ministério de Despacho da Presidência e Acompanhamento da Gestão do Governo (em vez do Ministério de Relações Interiores e Justiça, ao qual era subordinado o Cesna), e a incorporação de termos como desestabilização e inimigos internos e externos.
O artigo nove estabelece a possibilidade de censura nos mesmos termos. O desconhecimento das garantias constitucionais para o exercício da liberdade de expressão e o direito à informação foram a base da impugnação do Cesna perante o Tribunal Supremo de Justiça pelo Colégio Nacional de Jornalistas, o Sindicato Nacional de Profissionais da Imprensa e a ONG Espacio Público.
Na ação movida perante o TSJ, argumentou-se que o artigo 57 da Constituição impede censura de funcionários públicos quanto a informações sobre assuntos sob sua responsabilidade. E que o artigo 143 estabelece que as restrições às informações por razões de segurança nacional devem estar expressamente definidas em uma lei formal emanada da Assembleia Nacional, a qual não existe; de modo que não seria suficiente um decreto-lei promulgado mediante poderes especiais concedidos ao chefe do Estado.
Fatos relevantes nesse período:
Em 8 de março, a imprensa estrangeira protestou contra agressões à jornalista Andrea Rengifo, da RCN Televisión.
Em 22 de março, a caricaturista do jornal El Universal, Rayma Suprani, denunciou perante a Procuradoria-Geral ter sido vítima de ameaças.
Em 2 de abril, a Conatel iniciou um procedimento administrativo sancionatório contra a Globovisión “pela suposta interferência causada no discurso” em cadeia de rádio e televisão de Nicolás Maduro, que ocupa a presidência.
Em 6 de abril, o cinegrafista da Globovisión, Héctor Sánchez, denunciou violência em uma reunião do Minci (Ministério do Poder Popular para a Comunicação). Ele teve de fugir do local por medo de ser agredido.
Em 16 de abril, o presidente eleito, Nicolás Maduro, exortou os meios de comunicação a definir “com quem estão”, ao fazer alusão ao seu projeto político de “paz e progresso”, ou o liderado por Henrique Capriles.
Em 16 de abril, funcionários da Polícia de San Francisco, no estado de Zulia, detiveram uma equipe de repórteres do jornal La Verdad que cobria protestos de eleitores com panelas, e que exigiam a recontagem dos votos das eleições presidenciais.
Em 17 de abril, 150 homens pessoas motorizadas e vestidas com camisetas vermelhas lançaram bombas molotov contra o jornal La Región¸ e gritaram slogans pró-governo. Grupos armados ameaçaram queimar os jornalistas vivos.
Em 23 de abril, Miguel H. Otero denunciou outra tentativa de invadir o El Nacional na sede de El Silencio.
Em 2 de maio, a ONG Espacio Público, o Colégio Nacional de Jornalistas (CNP), o Sindicato Nacional de Profissionais da Imprensa (SNTP) e o Círculo de Repórteres Gráficos registraram 248 denúncias de violações à liberdade de imprensa na Venezuela durante 2012.
Em 9 de maio, a Comissão Interamericana de Direitos Humanos enviou à Corte Interamericana de Direitos Humanos o caso da Radio Caracas Televisión (RCTV), emissora venezuelana.
Em 9 de maio, o deputado Edgar Zambrano propôs aos seus pares oficialistas a modificação do Regulamento de Interior e Debates, para restituir o acesso dos meios de comunicação à Assembleia Nacional.
Em 15 de maio, o presidente Maduro criticou duramente o El Universal e seu proprietário por estarem “se esbaldando” com o problema da insegurança. Classificou sua primeira página como “asquerosa” e ordenou que Ernesto Villegas, ministro de Comunicação e Informação, o intimasse a comparecer a uma reunião.
Em 19 de maio, o ministro para a Comunicação e Informação, Ernesto Villegas, disse que os meios de comunicação que compõem o Sistema Bolivariano de Comunicação e Informação (Sibci) devem estar preparados para enfrentar a “guerra midiática”.
Em 20 de maio, o presidente Maduro reuniu-se com a diretoria do canal privado Venevisión (VV), presidida pelo empresário Gustavo Cisneros, para tentar “mudar” o modelo de televisão na Venezuela.
Em 24 de maio, o presidente da Comissão de Meios da Assembleia Nacional, Julio Chávez (Psuv – Lara), disse que só a ANTV poderá transmitir as sessões do Parlamento, para evitar que as atividades legislativas sejam “vítimas do sensacionalismo, da imprensa marrom e do jornalismo pouco ético e pouco sério”.
Em 27 de maio, um explosivo foi lançado em frente à sede do Panorama de um carro em movimento, mas não causou vítimas, feridos nem danos materiais. O incidente ocorreu às 8h40.
Em 28 de maio, a SIP condenou o atentado contra a sede do jornal Panorama.
Em 28 de maio, Rafael Poleo foi detido na Itália. O jornalista garante que o incidente é parte de uma perseguição contra ele.
Em 29 de maio, a diretoria da Atel TV exigiu que a Conatel restituísse seu sinal.
Em 31 de maio, condenou-se a censura imposta pela presidente do CNE, Tibisay Lucena, contra o jornalista Eugenio Martínez, do El Universal.
Em 28 de junho, o presidente Maduro afirmou que a direita venezuelana destruiu o exercício do jornalismo mediante mentiras e manipulações ao não dizer a verdade nem ser objetiva.
Em 4 de julho, a Procuradoria-Geral intimou o jornalista Nelson Bocaranda, acusado de envolvimento em incidentes de violência ocorridos em 14 de abril, a comparecer à justiça.
Em 11 de julho, a Sala Constitucional declarou improcedente o recurso de anulação movido por Marcel Granier, Oswaldo Quintana C. e a RCTV, C.A., contra o artigo 192 da Lei Orgânica de Telecomunicações.
Em 22 de julho, o jornalista Juan José Farías, da editoria de polícia do jornal La Verdad no estado de Zulia, denunciou à Procuradoria ter recebido várias ameaças no exercício do jornalismo por parte de órgãos de segurança e grupos criminosos que atuam na região.
Em 26 de julho, pediu-se a investigação de Leocenis García por suposta fraude e evasão fiscal e lavagem de dinheiro.
Em 27 de julho, a procuradora-geral, Luisa Ortega Díaz, solicitou o congelamento das contas de Miguel Henrique Otero e mandado de prisão contra o jornalista Alfredo Peña.
Em 1º de agosto, Leocenis García, do grupo editorial 6to Poder, foi acusado e detido em uma base militar por suposta lavagem de dinheiro.
Em 16 de agosto, o presidente Maduro denunciou uma “operação de manipulação pública”: “A imprensa burguesa esconde a corrupção”.
Em 20 de agosto, a Globovisión estreou uma nova programação depois da saída do famoso jornalista Leopoldo Castillo, que por 12 anos apresentou o programa “Aló Ciudadano”, espaço emblemático do canal, que fazia críticas ao governo.
Em 29 de agosto, o canal regional Global TV foi retirado subitamente do ar pelas operadoras de televisão por assinatura.
Em 4 de setembro, o jornal Versión Final, com sede na cidade de Maracaibo, foi adquirido por novos proprietários do estado de Zuila.
Em 19 de setembro, a SIP reiterou ao governo da Venezuela seu pedido de garantias jurídicas e devido processo legal em favor do jornalista e editor Leocenis García, que continua preso em uma base militar desde que foi detido em 30 de julho passado.
Em 25 de setembro, o presidente Maduro disse que comprar o jornal El Nacional “é como comprar ácido muriático e tomá-lo como café da manhã todos os dias”.
Em 30 de setembro, o presidente Maduro pediu ao Poder Judiciário e à Procuradoria-Geral que avaliassem as “medidas especiais” que concedam ao Poder Executivo poderes para poder “castigar essa guerra psicológica que exerce a imprensa escrita, a televisão e o rádio” pelas informações difundidas sobre a falta de abastecimento de alimentos na Venezuela.
Madrid, Espanha