A situação da liberdade de imprensa prossegue preocupante em função da agressiva postura anti-jornalismo do governo de Jair Bolsonaro. O presidente, seus aliados políticos e seus apoiadores na população em geral seguem em permanente ataque ao livre exercício da atividade jornalística, com a perspectiva de que aumente muito o nível da agressividade nos próximos meses, tendo em vista as eleições gerais que acontecerão em outubro deste ano.
Dois exemplos recentes ilustram a postura contrária ao jornalismo que é uma das marcas do bolsonarismo: em discurso para um grupo de empresários brasileiros, o presidente pediu que eles não invistam publicidade nos jornais; e o deputado federal Eduardo Bolsonaro, filho do presidente, ironizou nas redes sociais o fato de uma conhecida jornalista brasileira, Míriam Leitão, ter sido torturada na época da ditadura militar.
São iniciativas como essas que estimulam nas redes sociais a violência contra jornalistas e o jornalismo, como mostra levantamento feito para a Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e Televisão (ABERT) pela BITES, empresa de análise de dados: nos últimos meses, a imprensa profissional tem sofrido em média quase 4 mil ataques virtuais por dia. As redes sociais são cada vez mais território hostil para a imprensa, com agressões morais, ofensas e xingamentos que buscam desacreditar jornalistas e empresas jornalísticas. Ocorrem ainda casos de hackeamento de dados de jornalistas e sua exposição pública.
Prosseguem também agressões físicas aos profissionais da imprensa, geralmente por inconformismo com o papel fiscalizador e investigativo do jornalismo. Nos últimos seis meses não há comprovação de nenhum assassinado de jornalista que tenha sido praticado em função da sua atividade jornalística.
Embora com menor frequência do que se registrou em períodos anteriores, continuaram nos últimos seis os casos de censura judicial, em evidente desrespeito ao que determina a constituição brasileira. Caso emblemático foi o da censura determinada pela Justiça do Amazonas a reportagens do jornal O Globo sobre inconsistências e suspeitas de fraude no tratamento sem eficácia contra Covid 19 feito por hospital daquele estado brasileiro. A Justiça do Amazonas determinou a retirada de textos sobre o assunto no site do jornal e ainda bloqueou R$ 1,8 milhão da Editora Globo. As decisões da Justiça do Amazonas acabaram sendo anuladas pelo Supremo Tribunal Federal, como tem acontecido nesses casos. Mas é preocupante que, mesmo depois de vários anos com seguidas decisões da mais alta corte do país contra a censura judicial, juízes estaduais ainda desrespeitem o princípio constitucional de contra qualquer tipo de censura.
Outros ataques contra jornalistas e mídia durante este período:
Organizações de defesa dos jornalistas e da liberdade de imprensa, tais como a Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji) e a Federação Nacional de Jornalistas (Fenaj), expressaram em diferentes reportagens que neste período houve ataques notáveis a jornalistas e aos meios de comunicação social, e que em 69% dos casos a agressão foi provocada por agentes estatais.
Em 31 de outubro ao menos cinco equipes de reportagem foram agredidas durante a cobertura de um dos passeios do presidente Jair Bolsonaro, em Roma, na Itália, onde esteve para participar da reunião do G20.
Em 28 de março, os jornalistas Daniel Camargos e Fernando Martinho, da agência Repórter Brasil, foram intimidados por dois policiais militares, um deles armado com uma metralhadora, enquanto aguardavam para ouvir o posicionamento da mineradora britânica Brazil Iron sobre a apuração de uma reportagem em Piatã (BA). A polícia foi chamada ao local pela empresa, e os policiais exigiram que os comunicadores mostrassem as imagens da reportagem.
Em 14 de abril, Gabriel Luiz, 28 anos, jornalista da TV Globo em Brasília, foi esfaqueado pelo menos 10 vezes em frente ao prédio onde mora. Ele foi internado em estado grave, submetido a várias cirurgias e apresenta quadro estável. Não se sabe se o ataque tem relação com seu trabalho como jornalista, mas organizações de mídia locais afirmaram que existe um clima de hostilidade e violência contra a mídia e os jornalistas, incitado por Bolsonaro e seus apoiadores.