Brasil

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78 Assembleia Geral

27 – 30 de outubro de 2022

Madri, Espanha

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A situação da liberdade de imprensa prossegue crítica, tendo se agravado no período que antecedeu o primeiro turno das eleições gerais de 2 de outubro, sobretudo no ambiente digital. Segundo Repórteres sem Fronteiras (RSF), entre o início da campanha, em 16 de agosto, foram registrados 2,8 milhões de posts com conteúdos ofensivos a jornalistas, 86% dos ataques foram dirigidos a profissionais mulheres. Ainda de acordo com a RSF, a maioria dessas publicações hostis tem como origem o presidente Jair Bolsonaro, seus aliados políticos, sua família e seus apoiadores.

Alguns ataques transpuseram o ambiente das redes sociais e se reproduziram de forma presencial. Durante a campanha o principal alvo do Presidente e de seus aliados foi a jornalista Vera Magalhães, colunista do jornal O Globo, da rádio CBN e apresentadora da TV Cultura. No primeiro debate entre candidatos à Presidência, em 28 de agosto pela emissora de televisão Band, o presidente atacou a jornalista, logo depois de ela fazer uma pergunta sobre vacinas ao candidato Ciro Gomes (PDT). "Vera, não podia esperar outra coisa de você. (...) Você é uma vergonha para o jornalismo", disse Bolsonaro.

Em 13 de setembro, o deputado estadual Douglas Garcia (Republicanos), aliado do Presidente, repetiu a prática e tentou intimidar Vera Magalhães ao fim do debate para o Governo de São Paulo, promovido pela TV Cultura em parceria com o UOL e a Folha de S.Paulo. Filmando a jornalista com seu celular, o parlamentar repetiu a frase de Bolsonaro: "Você é uma vergonha para o jornalismo". Também questionou o valor do salário da profissional.

Prosseguem também as agressões físicas aos jornalistas, geralmente por inconformismo com o papel fiscalizador e investigativo do jornalismo. Em 21 de setembro, os repórteres Bruno Motta e Alexandre Perassoli, da TV Centro América, afiliada da TV Globo no Mato Grosso, foram ameaçados e agredidos por um produtor rural enquanto faziam uma reportagem sobre incêndios em produções de algodão.

O ataque aos profissionais de Mato Grosso é apenas uma entre as centenas de violações à liberdade de imprensa que a Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji) identificou em 2022. Do total de alertas coletados no ano (353), 81 são casos graves, que envolvem violência física, destruição de equipamentos, ameaças e assassinatos. O número representa um aumento de 32,7% em relação ao mesmo período de 2021 (61).

O caso mais emblemático de violência é o assassinato do britânico Dom Phillips, colaborador do jornal The Guardian, morto ao lado do indigenista Bruno Pereira em 5 de junho, no Amazonas. Trabalhavam na busca de informações sobre pesca, caça e garimpo ilegais. Os corpos só foram encontrados dez dias depois, em uma das margens do rio Itaquaí. É importante registrar que, a princípio, o caso não deve ficar impune, uma vez que o Ministério Público Federal (MPF) identificou e denunciou três pessoas sob acusação de duplo homicídio qualificado e ocultação de cadáver. A Justiça Federal do Amazonas aceitou a denúncia, e o réus estão presos enquanto aguardam julgamento. Também está preso o suposto mandante do crime. As investigações prosseguem.

Nos últimos seis meses, também foram registrados casos de censura judicial. Um dos casos mais flagrantes, em setembro, foi a decisão do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios que determinou ao portal UOL a retirada do ar de duas matérias e postagens em suas redes sociais com menção a reportagens sobre o uso de dinheiro vivo em 51 dos 107 imóveis comprados pela família Bolsonaro nos últimos 30 anos. A decisão foi derrubada logo em seguida pelo ministro André Mendonça, do Supremo Tribunal Federal (STF). O mesmo ocorreu em caso envolvendo o jornal O Estado de S.Paulo. O ministro Luiz Fux, do STF, derrubou censura imposta pelo Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul que proibia o jornal paulista de veicular reportagem sobre um clube de tiro. Mesmo que o STF tenha anulado as duas sentenças, é preocupante que juízes de instâncias primárias desrespeitem o princípio constitucional, mesmo depois de vários anos com seguidas decisões da mais alta corte do país contra a censura judicial.

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