01 Outubro 2015

NICARÁGUA

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A avidez de poder de Daniel Ortega não tem limites. Ele controla todas as instituições, órgãos e entidades civis e militares do Estado e do Governo. Mantém ainda sob seu poder ou influência determinante quase todas as organizações sociais e sindicais. Ortega impede o acesso dos poucos meios de comunicação que permanecem livres e independentes às informações públicas, mantendo um embargo rigoroso sobre as informações. Em maio, Ortega tentou aumentar ainda mais significativamente o seu domínio sobre a mídia, com uma proposta de Lei sobre a Promoção e o Desenvolvimento da Rede Nacional de Serviços de Telecomunicações da Banda Larga que continha dispositivos que na prática se traduziriam no controle absoluto do Estado sobre o fluxo de informações na Internet. Isto seria alcançado via empresa estatal que seria o ponto de interconexão nacional que canalizaria todas as informações, além das informações de e-mails, conteúdos e nomes de usuários para o administrador da empresa. A oposição unânime dos partidos da oposição, de setores políticos democráticos, da sociedade civil e principalmente do COSEP, a cúpula da empresa privada que é a única com a qual o governo mantém uma espécie de consenso, fez com que Ortega voltasse atrás em sua iniciativa, que não é a primeira, já que em 2013 houve outra, de mudanças na Constituição, sob o pretexto de segurança nacional, e que também foi abandonada pelo governo. É importante mencionar estas iniciativas fracassadas porque demonstram que Ortega e seu governo não desistirão de seu intento de controlar as informações na Internet. O Governo mantém a limitação absoluta de todas as informações oficiais aos meios de comunicação que ele não controla. O Governo não cumpre a lei 621 (Lei de Acesso à Informação Pública), os websites das instituições do Estado estão desatualizados ou não disponíveis, ou cheios de propaganda política. A publicidade oficial é exclusiva para a mídia ligada ao governo, e nem sequer anúncios para prevenir ou orientar a população sobre epidemias ou emergências semelhantes são publicados na mídia independente. Em junho, Edison Lanza, o relator especial para a Liberdade de Imprensa da Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), criticou a política de controle direto e indireto, ou a neutralização de todos os meios de comunicação por meio de um duopólio na televisão, restando apenas um canal aberto independente, uma emissora independente importante de radiodifusão e um importante veículo impresso como resultado da política governamental de controlar todas as informações. As formas de censura indireta que o regime pratica de maneira sistemática são várias, quer por sentenças contra funcionários que ousam dar uma opinião ou impedindo que os jornalistas tenham acesso às informações, ou aos eventos públicos oficiais, ou pela expulsão do país de jornalistas e defensores estrangeiros de Direitos Humanos. Apresentamos a seguir os casos mais relevantes: No início de março, o médico e primeiro tenente do Exército da Nicarágua, Yader Montiel Meza, foi acusado criminalmente e condenado pela justiça militar, embora com a pena mínima, por fazer comentários críticos depois da repressão policial contra pessoas que protestavam através do Canal em El Tule (povoado na rota do canal) em 24 de dezembro do ano passado. Segundo denúncia da procuradoria militar, testemunhas do centro de saúde local assinalam que Montiel teria comentado que “estávamos como nos anos oitenta, na presença de um "Natal Vermelho”, já que ele estava manchado com o sangue de nossos irmãos camponeses, que estão defendendo seus direitos". O artigo do Código Militar que define o crime contra o decoro militar --segundo o qual se acusou e condenou o tenente Montiel-- não foi violado pelo tenente Yader Montiel Meza, pois este artigo não menciona a crítica. Além disso, o acusado não criticou uma operação militar e sim policial, não estava uniformizado e estava de licença quando fez os comentários, sem utilizar nenhum meio de comunicação. O Governo proibiu a entrada no país do cartunista francês Jules Berjeaut (“Jul”), que publica no Charlie Hebdo.  Jules fora convidado para um fórum que tinha como lema “Palavras em Liberdade” no encontro regional de escritores “América Central conta”, realizado entre 18 e 23 de maio. A proibição da entrada de “Jul” no país é um contrassenso, porque o mesmo presidente Ortega, em 8 de janeiro expressou ao Presidente da França a solidariedade do Estado nicaraguense perante o ato de barbárie cometido contra Charlie Hebdo. Nessa mesma data, o Governo expulsou da Nicarágua os advogados do Centro pela Justiça e o Direito Internacional (CEJIL, sua sigla em inglês) Luis Carlos Buob e Marta González, ambos maltratados, descredenciados e com seus celulares roubados antes de embarcados à força em um avião para expulsá-los da Nicarágua. Os advogados do CEJIL haviam acompanhado organizações nicaraguenses a uma audiência perante a CIDH em Washington, DC, em março deste ano, para expor as violações de seus direitos que podem envolver o projeto do canal interoceânico pela empresa concessionária chinesa HKND. O Poder Judiciário dominado pelo Executivo proíbe a entrada de jornalistas independentes nos julgamentos que por algum motivo não lhes convém que sejam divulgados, embora os jornalistas da mídia oficial sempre possam estar presentes. Em um desses julgamentos, o do empresário Milton Arcia, com grande repercussão na opinião pública, o porta-voz do Poder Judiciário, Roberto Larios, justificou sua atuação criticando a Associação de Jornalistas da Nicarágua (APN) como “uma tristemente célebre associação de jornalistas da Nicarágua que financia a família Chamorro e o diário La Prensa". A APN, por outro lado, apresentou uma queixa por injúrias e calúnias e pediu desculpas a Larios, mas este confirmou sua posição e disse que o que havia feito era mais uma crítica à Associação para que abandonasse “a política de subserviência” à "direita midiática do governo". A queixa não foi aceita pelo juiz que mandou arquivar definitivamente o caso. Todas as quartas-feiras grupos da oposição fazem plantão em frente à sede do Conselho Supremo Eleitoral exigindo eleições livres, fiscalização eleitoral, emissão de cédulas sem discriminação, de acordo com a mesma Lei Eleitoral. Em relação a esses plantões, o governo tomou diversas atitudes, algumas violentas, outras para dificultar ou impedir marchas, etc. Na quarta-feira 15 de julho o presidente Ortega enviou policiais para bloquear, intimidar e agredir as pessoas que participavam do protesto, vários deputados foram fortemente agredidos e detidos, apesar de sua imunidade. Os jornalistas que cobriam o evento não foram respeitados, Moisés Castillo gravava um vídeo quando foi agredido e detido e o outro jornalista que transmitia ao vivo teve seu celular confiscado e foi preso. Os dois jornalistas são da Rádio Corporación. Jorge Torres, fotógrafo de La Prensa, teve a lente de sua câmera quebrada a pauladas. Não é permitido que os jornalistas do La Prensa e demais meios de comunicação independentes entrem em eventos públicos oficiais. Esta política chegou ao ridículo de não permitir a presença de jornalistas independentes na inauguração de uma passarela de trânsito, nas comemorações das festas nacionais nas praças públicas, nem no local da batalha de São Jacinto na celebração do aniversário, a mais importante na guerra contra os Piratas. Em Jalapa, Nueva Segovia, a estação da Rádio Comunitária do Movimento de Mulheres Oyanka foi expropriada, seus equipamentos foram confiscados pela TELCOR sem aviso prévio, sob a alegação de operavam em outra frequência. O presidente da Câmara de Radiodifusão disse que não cabia um fechamento, mas uma orientação ou prazo para encontrar uma solução, já que estava autorizada na frequência 90.3 e operava em 90.5. O canal 7 de cabo local, transmitido na cidade de Matiguás, departamento de Matagalpa, foi fechado pela empresa de transmissão a cabo. O proprietário do canal alega que isto aconteceu porque criticou o prefeito, porém os proprietários da empresa de cabo local alegam que o canal não pagava a quota correspondente, motivo pelo qual houve o fechamento. Não foi possível obter comprovação independente.

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