Registrou-se um alto nível de liberdade de imprensa neste país. O setor de mídia atravessa, como em boa parte do mundo, as vicissitudes de uma mudança de paradigma tecnológico e econômico que exige novas respostas para sustentar o papel institucional da imprensa no debate da coisa pública e no monitoramento dos atos do governo.
A mídia enfrenta estes desafios dentro de um clima de respeito à diversidade de opiniões e de exercício da crítica. Existem, apesar de tudo, mostras de intolerância, questões pendentes e fenômenos novos para que continuemos alertas.
O monitoramento do Foro de Jornalismo Argentino e os relatórios sobre liberdade de imprensa da Associação de Entidades Jornalísticas Argentinas registraram mais de 60 agressões, ameaças ou constrangimentos contra jornalistas ou contra a mídia ao longo deste ano. São os seguintes os casos mais preocupantes:
Em abril, o Secretário de Comunicação da província de Jujuy ameaçou uma produtora da Rádio Universidad de suspensão da pauta oficial de publicidade por seu viés jornalístico.
No final desse mês, o fotógrafo da Associação de Trabalhadores do Estado Jorge Riquelme recebeu um ferimento na cabeça gerado por alguns policiais da província durante a cobertura de uma manifestação em frente à residência da governadora da província de Santa Cruz.
Em maio, José Allende, dirigente de entidade de classe e deputado provincial por Entre Ríos, ameaçou de morte o jornalista Martín Carbone, por suas denúncias ao ministro de Saúde da sua província.
Em junho, jornalistas do Canal 12, da Rádio Mitre e da Rádio Continental foram agredidos e ameaçados por sindicalistas da Unión Tranviarios del Automotor, durante a cobertura de paralisação de atividades na cidade de Córdoba.
No mesmo mês, o radiojornalista Alejandro García denunciou atos de intimidação pública com armas de fogo por policial do Comando de Patrulhas da localidade de Gonnet, em Buenos Aires, por suas denúncias sobre a ação da polícia.
Em julho, jornalistas da Crónica TV e de La Nación apanharam das forças policiais durante a cobertura do despejo de uma fábrica da empresa Pepsico, na localidade de Florida, na província de Buenos Aires.
Em agosto, um coquetel Molotov foi arremessado contra um carro de reportagem do diário Jornada, da província de Chubut. O episódio estava supostamente relacionado a protestos do grupo mapuche RAM, que protagonizou diversos atos de violência no Sul e na capital argentina. O Grupo Jornada sofreu diversos ataques deste grupo nos últimos meses, como o corte dos cabos de sustentação da antena da sua estação de rádio e pichações com ameaças na fachada da sua sede.
Em 3 de outubro, o deputado nacional Axel Kicillof alegou que a mídia privada vive da extorsão contra os políticos. "A informação é um bem público e por isso deveria beneficiar apenas o Estado porque é o único que pode publicar informações objetivas", declarou.
Em 30 de setembro, em marchas realizadas em diversos pontos do país pelo desaparecimento do jovem Santiago Maldonado, foram agredidos jornalistas da América, Crónica TV, C5N, TN, Clarín e de meios de comunicação locais da província de Río Negro.
Por causa da repetição de atos de violência contra jornalistas, a Adepa promoveu a inclusão dos trabalhadores da imprensa em projeto de lei que estabelece o agravamento de penas para quem atentar contra as suas vidas. Embora certos setores exibam níveis preocupantes de intolerância, a sociedade realizou há uma semana eleições legislativas precedidas por campanhas políticas que se desenvolveram, em termos gerais, dentro de um quadro de convivência cívica e com níveis elevados de liberdade de expressão.
As intimidações e ataques do narcotráfico constituem um fenômeno em ascensão no país. Em 12 de outubro, parentes dos integrantes da quadrilha de narcotraficantes de Rosário denominada Los Monos interromperam a apresentação de um livro de investigação jornalística relacionado às ações dessa organização.
Mas foi no final de julho que ocorreu um dos maiores atentados contra jornalistas dentre todos os registrados nas duas últimas décadas após o assassinato de José
Luis Cabezas. O jornalista Jesús Báez do Nacimento, dono da rádio FM Carretera 101, sediada em San Antonio, na província de Misiones, na fronteira com o Brasil, recebeu quatro tiros no abdômen e em um de seus braços, com o claro propósito de matá-lo. Há muitos indícios sugerindo que o ataque está relacionado a setores do narcotráfico local e às denúncias feitas por Báez na sua emissora de rádio. Báez conseguiu recuperar-se e entrou no programa de proteção de jornalistas implementado há um ano pelo Ministério de Segurança Nacional com a assessoria de organizações que reúnem jornalistas e empresas jornalísticas. Este programa foi ativado em 2017 para proteger jornalistas em diversas oportunidades.
Dois diários portenhos publicaram uma convocação firmada por um grupo de jornalistas em solidariedade a seu colega Horacio Verbitsky contra eventuais represálias governamentais por suas notícias publicadas no matutino Página/12. Outros colegas expressaram sua discordância quanto a estas manifestações, destacando que a denúncia se baseou em versões não traduzidas em ações comprovadas que afetassem a liberdade de expressão.
Em termos de publicidade oficial, a autorregulação do Poder Executivo na distribuição desses recursos, com base em pautas publicitárias objetivas, foi um passo relevante para evitar seu uso para discriminação e propaganda, como também para se ter maior transparência. Mas ainda falta a promulgação de lei regulando adequadamente a sua distribuição.
A Lei de Acesso à Informação Pública, promulgada no ano passado, foi uma das conquistas institucionais da nova gestão governamental e um grande passo na
agenda da liberdade de expressão. Mesmo assim, houve modificações recentes e substanciais na legislação, através do decreto de regulação correspondente. O órgão responsável pela aplicação perde, como estava previsto na norma jurídica, o poder de definir a sua estrutura organicamente, ficando esta atribuição sob o comando da Chefia de Gabinete da Nação. Por outro lado, a colocação em funcionamento do órgão depende da autoridade orçamentária da Chefia de Gabinete. Tratam-se de reformas em uma lei estratégica para a transparência e dinâmica institucional que deveriam ser debatidas no âmbito do legislativo com a amplitude e profundidade intrínsecas a uma legislação desta importância.
As promulgações de leis similares continuam questões pendentes na maioria das províncias argentinas.