A violência contra os jornalistas e contra a mídia, o aumento de leis e projetos de lei que tentam controlar a atividade jornalística, associados às pressões das autoridades e à falta de acesso às informações oficiais são os principais obstáculos ao exercício da liberdade de expressão no continente americano, de acordo com os relatórios dos países apresentados durante a 73ª Assembleia Geral da Sociedade Interamericana de Imprensa, realizada em Salt Lake City, Utah.
Um padrão de conduta envolvendo ataques à imprensa, realizados tanto pelo crime organizado quanto por membros e órgãos do governo parece ter se consolidado durante 2017. Esse padrão de assédio e perseguição se expressa em agressões físicas que em alguns casos culminam em assassinato ou tentativas de assassinato. Agressões desse tipo foram registradas na Bolívia, no Brasil, Colômbia, Cuba, Equador, El Salvador, Estados Unidos, Honduras, México, Paraguai, Peru, República Dominicana e Venezuela. Na Argentina, houve uma clara tentativa de assassinato de um jornalista. E no México e em Honduras infelizmente foram nove os jornalistas assassinados. Ocorreram sete assassinatos no México e dois em Honduras desde a última reunião da SIP, em abril passado. Os assassinatos são a expressão máxima da brutalidade que a censura pode atingir. Mas a perseguição aos profissionais da mídia não termina aí, considerando-se que depois que os crimes são cometidos os responsáveis gozam da mais absoluta impunidade. As investigações raramente resultam na sua captura, e mesmo nesse caso consegue-se apenas identificar os autores materiais, não quem planejou os crimes. O tempo passa e o crime prescreve, e assim os responsáveis pelos assassinatos conseguem o que queriam: silenciar um jornalista, enviar uma mensagem de ameaça e não receber punição alguma.
A perseguição à imprensa se manifesta também nas leis e projetos de leis que são debatidos em vários países do continente. Em muitos deles, as autoridades tentam interferir nos conteúdos de editoriais, como na Venezuela, El Salvador ou na Colômbia, onde uma decisão da Corte Constitucional exige que os meios de comunicação atualizem, por conta própria, quaisquer informações que publicarem na internet. No Equador, continua em vigor a estrutura legal herdada do governo anterior que criou um sistema processual e uma Superintendência de Comunicação que atuam contra a liberdade de imprensa. Em muitos países, como Barbados, ainda não se promulgou uma lei que garanta o acesso às fontes públicas de informação ou, mesmo nos casos em que leis desse tipo foram promulgadas, não foram decretados regulamentos para implementar as leis que se tornam assim apenas letra morta. Na Argentina, o poder Executivo é responsável por decretar regulamentos, ao passo que em Honduras, na Nicarágua e na República Dominicana, existem leis que impedem o acesso à informação ou simplesmente, apesar de haver uma lei de acesso, ela não é aplicada.
Por outro lado, os ataques à mídia recorrendo ao termo "fake news" ou "notícias falsas" parecem ganhar cada vez mais espaço na região. Essa investida contra o trabalho dos jornalistas por membros ou órgãos do governo pretende desacreditar o trabalho dos profissionais da mídia, especialmente quando se trata de matérias ou reportagens que não lhes sejam favoráveis. O risco desses ataques é terem como alvo justamente um dos pilares da democracia e, em casos específicos, como nos Estados Unidos, servirem para gerar desconfiança quanto aos profissionais da mídia e promover atitudes hostis contra eles. Nesse aspecto, deve-se notar que nos Estados Unidos, cuja Constituição prevê a defesa do trabalho da imprensa e o direito à livre expressão, foram registrados até agora neste ano 31 agressões físicas contra jornalistas. Mais de 30 repórteres foram detidos pela polícia enquanto realizavam seu trabalho. A mídia nos Estados Unidos, em geral, continua sendo assediada por uma forte retórica liderada pelo presidente Donald Trump.
A situação em Cuba não poderia ser pior. Às agressões contra os jornalistas somam-se agora agressões a seus parentes e a usuários das redes sociais. As restrições são provenientes da própria Constituição que exige que a imprensa esteja alinhada aos objetivos da revolução socialista e proíbe a propriedade privada dos meios de comunicação. Não é possível exercer o jornalismo legalmente sem ter pertencido, antes de ingressar na universidade, à União da Juventude Comunista. São punidos também aqueles que pedem informações sobre segredos de Estado, eliminando-se assim qualquer possibilidade de acesso a informações que deveriam ser públicas. O acesso à internet continua restrito e aqueles que se dedicam ao jornalismo são alvo de detenções arbitrárias e condenações totalmente inaceitáveis.
Na Venezuela, o regime de Nicolás Maduro multiplica os mecanismos de censura. Na verdade, só o fato de cobrir uma manifestação contra o governo pode ser classificado como terrorismo, sendo o jornalista julgado em tribunais militares. O fechamento de emissoras de rádio e TV continua, assim como as chamadas inspeções técnicas das emissoras. Várias redes de transmissão a cabo internacionais, como a CNN en Español, foram proibidas de operar devido às suas linhas editoriais. Os jornalistas estrangeiros são frequentemente proibidos de entrar no país sem motivo algum e os jornalistas venezuelanos sofrem agressões de civis armados e de uma Guarda Nacional bem equipada e disposta a utilizar a violência indiscriminadamente para controlar qualquer desordem. O confisco de equipamentos de trabalho é algo comum. Os jornalistas têm dificuldade também para difundir seu trabalho por falta de papel jornal ou devido ao fechamento das emissoras. E se conseguem publicá-lo, correm o risco de ser alvo de ações judiciais por motivos inexplicáveis.
Além desse padrão de enfraquecimento da liberdade de imprensa, foram registrados aspectos positivos, como sentenças contra os autores materiais dos assassinatos de jornalistas na Colômbia e na Guatemala, um clima de maior respeito à liberdade de expressão no Equador e a possibilidade quase certa de uma maior proteção do sigilo da fonte, no Canadá.