Estados Unidos

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78 Assembleia Geral

27 – 30 de outubro de 2022

Madri, Espanha

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Os últimos seis meses foram marcados pela morte do jornalista investigativo Jeff German, assassinado por motivos relacionados ao seu trabalho. Foi um acontecimento trágico, porém raro no país. De modo geral, as prisões e agressões a jornalistas diminuíram este ano, em comparação com 2021 e 2020. O presidente Joseph R. Biden está prestes a completar metade do seu mandato, e as organizações da mídia notam uma queda na retórica contra a imprensa. No entanto, a mídia noticiosa ainda é alvo de muitas ações por difamação e enfrenta dificuldades para obter acesso a informações públicas em tempo hábil. Mais estados estão promulgando proteções legais contra ações judiciais infundadas para silenciar repórteres, e legisladores federais também estão considerando a possibilidade de tais medidas.

Em 3 de setembro de 2022, Jeff German, veterano jornalista investigativo, foi esfaqueado e morreu em frente à sua casa; um funcionário público local é acusado de matá-lo. German, repórter do Las Vegas Review-Journal, publicou um artigo detalhando as denúncias de má gestão e assédio no local de trabalho envolvendo Robert Telles, o suposto assassino. Posteriormente, Telles perdeu sua candidatura à reeleição. Ele é acusado de assassinar German e está preso sem direito a fiança. O assassinato alarmou jornalistas e defensores da liberdade de imprensa de todo o país. German é o nono jornalista radicado nos Estados Unidos a ser assassinado no exercício de sua profissão nas três últimas décadas.

Trinta jornalistas foram agredidos enquanto realizavam seu trabalho em 2022, até a data. Em 2021, 145 jornalistas foram agredidos fisicamente. Embora essas estatísticas revelem uma diminuição em relação a 2020, quando 630 jornalistas sofreram esse tipo de agressão, elas são muito mais altas do que nos anos anteriores. Algumas dessas agressões ocorreram enquanto os jornalistas cobriam protestos, inclusive os relacionados com a controversa decisão da Suprema Corte que anulou a decisão sobre o direito ao aborto de Roe v. Wade e contra a companhia elétrica privada de Porto Rico.

Os tribunais supervisionam as ações criminais daqueles que agridem jornalistas, inclusive apoiadores do ex-presidente Donald J. Trump, que, em 6 de janeiro de 2021, invadiram o prédio do Capitólio numa violenta tentativa de reverter os resultados das eleições presidenciais de 2020. Os jornalistas no local foram ameaçados e atacados naquele dia, e houve pelo menos nove denúncias de agressão física, de acordo com o U.S. Press Freedom Tracker. A primeira pessoa acusada de atacar um profissional da mídia se declarou culpada em setembro de 2022 das acusações de crimes graves de agressão e enfrenta uma possível pena de prisão entre 33 e 41 meses. Cerca de dez outros manifestantes foram acusados de agredir jornalistas ou destruir seus equipamentos.

Até o momento, o U.S. Press Freedom Tracker registrou 11 prisões ou detenções de jornalistas em 2022, contra 59 em 2021, 144 em 2020 e apenas nove em 2019. Todas as prisões de 2022 ocorreram nos últimos seis meses, principalmente em protestos após a revogação de Roe v. Wade pela Suprema Corte.

Durante a presidência de Biden, a retórica da Casa Branca contra a imprensa enfraqueceu-se. Ainda assim, políticos e candidatos às eleições de meio de mandato, as chamadas midterms, de 2022 continuaram fazendo declarações preocupantes sobre a mídia.

A Suprema Corte recusou-se a ouvir um caso que exigia a revisão da história decisão de New York Times v. Sullivan, 376 U.S. 254 (1964), que impôs os limites da Primeira Emenda às leis estaduais de difamação. Em 2021, dois juízes criticaram a mídia e a proteção de Sullivan.

Nos tribunais, organizações da mídia enfrentam ações judiciais movidas por causa de suas reportagens. Por exemplo, no início de outubro, Trump processou a CNN por difamação, alegando que a rede havia feito uma "campanha de difamação" contra ele, e pediu US$ 475 milhões de indenização. Processos semelhantes foram arquivados, mas ações desse tipo continuam sendo caras e demoradas para as organizações de mídia. A CNN também enfrenta uma longa ação por difamação movida pelo advogado Alan Dershowitz e relacionada à sua cobertura do primeiro julgamento do impeachment de Trump.

A frequência das ações por difamação ilustra a importância das chamadas leis "anti-SLAPP" que se referem a "ações judiciais estratégicas contra a participação pública". Essas leis permitem que jornalistas e outras pessoas consigam rapidamente que ações judiciais infundadas cujo objetivo seja silenciá-los sejam consideradas improcedentes. Trinta e dois estados e o Distrito de Columbia possuem atualmente leis anti-SLAPP, e três deles reforçaram recentemente leis mais antigas para cobrir uma gama mais ampla de expressões. Alguns tribunais federais diminuíram o alcance das leis estaduais anti-SLAPP ao afirmar que algumas partes não se aplicam nos tribunais federais, ao passo que outros discordam e aplicam suas proteções. Em setembro de 2022, uma lei federal anti-SLAPP foi apresentada ao Congresso.

No governo Biden, os jornalistas têm tido dificuldades de acesso ao presidente e a seus funcionários de alto escalão. Biden concedeu apenas 23 entrevistas à imprensa entre janeiro de 2021 e abril de 2022, em comparação com as 95 de Trump durante o mesmo período após assumir o cargo em janeiro de 2017, e às 187 de Obama durante o mesmo período. Em junho de 2022, cerca de 70 jornalistas escreveram uma carta ao secretário de imprensa da Casa Branca para solicitar o fim de uma política que limita a participação da imprensa em certos eventos da Casa Branca.

Em outubro de 2022, a Suprema Corte reabriu suas sustentações orais ao público pela primeira vez desde que fechou devido à pandemia da COVID-19, em março de 2020. O tribunal continuará transmitindo áudio ao vivo das sustentações orais, o que começou a ser feito durante a pandemia. Além disso, o órgão de notícias jurídicas Courthouse News Service teve várias vitórias em ações que buscam acesso em tempo hábil a ações civis movidas recentemente nos tribunais estaduais.

Em nível estadual e local, o promotor de justiça da Filadélfia expulsou um jornalista freelancer de uma coletiva de imprensa. Além disso, a mídia foi impedida de participar das reuniões dos tribunais de Tennessee e do Conselho Escolar de Iowa. Jornalistas que cobriam o trágico tiroteio em uma escola em Uvalde, Texas, foram ameaçados de prisão, impedidos de participar de reuniões governamentais e assediados.

O acesso à informação pública continua sendo uma preocupação. Em março de 2022, o procurador-geral dos EUA, Merrick Garland, emitiu um memorando apresentando diretrizes para o cumprimento da Lei de Liberdade de Informação (FOIA), que rege o acesso às informações das agências federais. Embora elas sejam em geral a favor da divulgação, grupos a favor de um governo aberto as criticaram por encorajar uma reforma, em vez de exigi-la. Por exemplo, em uma ação em que se pedia acesso a dados de ensaios clínicos, um tribunal federal de apelação rejeitou a tentativa do governo de reter as informações apenas por serem confidenciais e concluiu que as emendas da FOIA de 2016 exigiam que o governo demonstrasse que a divulgação também causaria danos. Além disso, um grupo de pesquisa do estado de Washington processou o Departamento de Segurança Nacional e a Polícia de Imigração e Alfândega por não responderem a mais de uma dúzia de solicitações nos termos da FOIA nos últimos três anos, inclusive deletando pedidos do sistema sem explicação.

Em nível federal, o possível julgamento de Julian Assange, fundador do WikiLeaks, por autoridades dos Estados Unidos continua preocupando os defensores da liberdade de imprensa. Eles pediram repetidamente ao governo de Biden que suspenda os esforços de extradição por temerem que tal julgamento comprometeria a liberdade de imprensa.

Em 2019, o governo Trump obteve uma denúncia do grande júri federal contra Assange nos termos da Lei de Espionagem que incluía três acusações baseadas exclusivamente na publicação on-line de segredos do governo. Essa foi a primeira vez que o governo federal obteve uma denúncia com base em tal teoria, e isso criou um precedente arrepiante para os jornalistas que cobrem assuntos do governo, pois a Lei de Espionagem não contém exceções para a divulgação de informações dignas de notícia para ou por membros da imprensa. Entretanto, em dezembro de 2021, um tribunal do Reino Unido decidiu que o governo dos EUA poderia prosseguir com a extradição de Assange e dar seguimento à ação. O governo britânico aprovou sua extradição em junho de 2022 e Assange impetrou um recurso em agosto.
Até o momento, o Departamento de Justiça não moveu nenhuma ação por vazamentos de informação, no governo Biden, e o número de repórteres intimados diminuiu no ano passado. Em julho de 2021, o Departamento de Justiça reforçou suas pautas internas para proibir principalmente os promotores de confiscar informações de fontes e materiais de jornalistas em investigações federais. Em maio de 2022, soube-se que o Departamento de Justiça dos EUA havia emitido secretamente uma intimação a um repórter do The Guardian para obter acesso aos dados do seu telefone em fevereiro de 2021. Em 19 de setembro de 2022, a Câmara dos Deputados dos Estados Unidos aprovou por unanimidade um projeto de lei para evitar que os jornalistas sejam obrigados a revelar informações protegidas, inclusive fontes confidenciais. O projeto de lei foi enviado ao Senado, que também deve aprová-lo para que o presidente o sancione.

A CNN conseguiu revogar uma intimação para entrega de filmagens não editadas de uma entrevista com um policial sobre os acontecimentos de 6 de janeiro. Um jornal recebeu uma citação de um grande júri da Geórgia que investigava a possível interferência criminosa de Trump nas eleições de 2020 e optou por obedecê-la, mas também postou on-line a gravação de áudio solicitada. E o Las Vegas Review-Journal está tentando impedir que a polícia vasculhe os dispositivos eletrônicos do repórter Jeff German, que foi assassinado, para proteger a coleta confidencial de notícias e os dados da fonte de informações.

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