PARAGUAI
O assassinato de um jornalista de rádio do interior do país, torturas aplicadas aparentemente por policiais a um jornalista brasileiro que realizava uma investigação na zona de fronteira, ameaças contra a imprensa e a sanção de uma lei restritiva à investigação jornalística por políticos e legisladores, são os fatos mais importantes que afetaram a liberdade de imprensa neste período.
Em ordem cronológica, destacamos os seguintes fatos.
Em 19 de outubro, a Câmara dos Deputados aprovou um projeto de lei de transparência administrativa e livre acesso à informação, apresentado pelo deputado Rafael Filizzola.
A norma aprovada obriga os três poderes do Estado, os governos departamentais e municipais, a controladoria geral da República e até empresas e particulares que administram serviços públicos, que divulguem todas as informações contidas em documentos escritos, incluindo-se declarações juramentadas de bens ou qualquer documento que se relacione com as suas respectivas atividades administrativas.
O projeto aprovado, entretanto, estabelece limitações no que se refere à intimidade das pessoas, à segurança do Estado, às reuniões secretas do Congresso e os estados financeiros dos contribuintes.
Em 30 de outubro, o juiz José González Macchi outorgou a desistência da ação contra o jornalista Jorge Villalba Digalo, do jornal Última Hora, no processo criminal ingressado pelo dirigente sindical Eduardo Pérez por suposta difamação e calúnia.
Em um trabalho de investigação sobre corrupção na estatal Banco Nacional de Trabalhadores (BNT), Villalba Digalo denunciou que a liquidação dos bens do banco foi realizada com a ineficácia da junta de vigilância da instituição, presidida pelo mencionado Pérez.
Em 3 de novembro, o juiz Carlos Ortiz Barrios condenou a cinco anos de prisão Agileo Miño Giret, político e ex-prefeito de Ciudad del Este, 330 km a leste de Assunção, por frustrado assassinato do jornalista Héctor Guerín, correspondente do jornal ABC Color.
Segundo os antecedentes do caso, Miño Giret foi detido em 2 de março de 1997 em um parque nas redondezas de Assunção, quando foi ao local para entregar a soma acordada (10 mil dólares) à pessoa encarregada do assassinato do jornalista e que, entretanto, denunciou o fato à vítima e à polícia.
Em 5 de novembro, o juiz José González Macchi concedeu a desistência de ação contra o diretor do jornal La Nación, Osvaldo Domínguez Dibb, em um processo por difamação e calúnia promovido por outro juiz, Esteban Chávez.
O jornal La Nación publicou várias notas em que indicava que no tribunal a cargo de Chávez foram cometidos atos de corrupção. Este magistrado foi removido mais tarde de seu cargo pelo Tribunal de Julgamento de Magistrados, precisamente por se comprovar irregularidades em sua administração.
Em 11 de dezembro, o juiz Alcides Corbetta concedeu a desistência de ação contra o diretor do ABC Color, Aldo Zuccolillo, na denúncia ingressada contra ele por Miguel Angel Britez, representante do Partido Colorado, do governo, acusando-o de delito eleitoral.
A acusação foi motivada pela publicação no citado jornal dos editoriais intitulados Votamos em Yoyito e Por que votamos em Yoyito em que o órgão de imprensa explicava o motivo de sua preferência por Julio César Yoyito Franco, candidato do Partido Radical Liberal Autêntico, de oposição, nas eleições para vice-presidente da República realizadas em 13 de agosto de 2000. A denúncia alegou que os artigos violaram a proibição de se realizar propaganda eleitoral 48 horas antes das eleições. O juiz Corbetta, porém, considerou que Zuccolillo não cometeu delito algum, pois nos artigos de seu jornal não fez outra coisa além de expressar sua opinião, direito consagrado na Constituição Nacional.
Assinala também que o espaço utilizado para isso não é pago e que o denunciado não participou das eleições como candidato nem foi representante de qualquer lista.
Em 19 de dezembro, o jornalista brasileiro Maury Konig, correspondente do jornal O Estado do Paraná, da cidade de Foz de Iguaçu, na fronteira com o Paraguai, denunciou que foi objeto de brutais torturas na localidade paraguaia de Mabaracayú, 350 quilômetros a leste de Assunção. Konig foi agredido brutalmente por três pessoas, uma das quais usando uniforme parecido aos dos policiais da Polícia Nacional do Paraguai.
O jornalista estava investigando em território paraguaio o recrutamento de menores brasileiros para prestar serviço militar obrigatório em delegacias policiais da região. Segundo a denúncia, as fotografias tiradas na delegacia de San Alberto, da mesma jurisdição, molestou as autoridades policiais.
Konig foi interceptado posteriormente por uma caminhonete da qual desceram três homens, que o submeteram a um brutal castigo com correntes e objetos afiados de madeira. O jornalista afirma que seus agressores são policiais.
Em 22 de dezembro, Benjamín Maciel, deputado de uma facção do Partido Colorado, do governo, defendeu a instauração de uma lei que regule a atividade da imprensa, em reação a investigações jornalísticas sobre possíveis atos de corrupção de alguns legisladores. A preocupação aumentou quando o próprio presidente da Câmara dos Deputados, Cándido Vera Bejarano, admitiu que toda atividade deve ser regulada, ao ser consultado sobre as expressões de seu colega.
Em 28 de dezembro, o Congresso paraguaio sancionou a lei que regulamenta a informação de caráter privado, considerada como de autoproteção para os funcionários públicos. Ela limita a possibilidade de investigação jornalística ao proibir a publicação de dados sobre a situação patrimonial e solvência econômica de pessoas físicas e jurídicas, salvo expressa autorização dos afetados. Editoriais de jornais e várias opinões consideram essa lei como uma autoproteção estabelecida por legisladores e políticos para evitar a investigação sobre a origem de seus bens.
Em 5 de janeiro, foi assassinado Salvador Medina, de 27 anos, presidente do conselho da rádio comunitária Ñemity, de Capiibary, 330 km a nordeste de Assunção. Era irmão de Pablo Medina, correspondente do jornal ABC Color em Curuguaty, local da mesma zona, e docente em uma instituição de ensino local.
Dois homens mascarados deram quatro tiros, um atingindo o jornalista de rádio no peito, que o matou. Os assassinos fugiram do lugar.
Familiares da vítima revelaram depois que Salvador recebia freqüentes ameaças por denúncias que fazia na emissora de rádio, como também por informações publicadas por seu irmão Pablo no ABC Color, supostamente com base em dados oferecidos pela vítima.
As denúncias referiam-se a uma família de delinqüentes que atuava na zona e a um roubo de madeira valiosa extraída de uma reserva florestal do lugar.
A polícia deteve posteriormente Milcíades Mailyn, de 20 anos, como o suposto autor material do assassinato, enquanto aumentava a suspeita de que o crime havia sido encomendado.
Também foram detidos um docente do local, Timoteo Cáceres, com quem o falecido havia tido alguns problemas, e Daniel Enciso Mailyn. Surgiu também a possibilidade de envolvimento político no assassinato, pois a polícia informou que a arma possivelmente utilizada para matar Salvador Medina encontra-se em poder de Luis Alberto Franco, filho de Justo Franco, uma autoridade do Partido Colorado, do governo, em Capiibary, o qual esteve foragido até sua prisão em 21 de fevereiro, ainda que a arma continue desaparecida. O promotor criminal Ramón Trinidad Zelaya, entretanto, incluiu o detido no processo, acusando-o como suposto participante em ato contra a vida.
Enquanto isso, outras pessoas suspeitas de participar no crime e cuja prisão foi decretada pela justiça continuam foragidas.
Os familiares do jornalista assassinado viram-se obrigados a abandonar momentaneamente o lugar devido a ameaças, pelo que se supõe que ele e os assassinos possivelmente tinham o apoio de pessoas poderosas da área.
Em 11 de janeiro, o repórter gráfico Oscar Florentín, do jornal Noticias, foi agredido com empurrões e um golpe por uma agente da Direção de Narcóticos (DINAR) da polícia regional de Ciudad del Este (330 km a leste de Assunção), quando fazia anotações gráficas de uma ostentosa intervenção de agentes policiais em uma moradia da área.
Em 8 de fevereiro, o promotor criminal Alejandro Nissen intimou por 48 horas a emissora de rádio 9.70 AM para que apresentasse uma série de relatórios sobre um programa de rádio chamado Polêmica del mediodía apresentado por Hermes Rafael Saguier, Alberto Vargas Peña e Adolfo Ferreiro, de oposição ao governo.
O promotor pediu para saber como os mesmos participam no referido programa e se são pessoas contratada pela rádio.
Também indagou a partir de que data esse programa era transmitido, o horário de transmissão e a freqüência utilizada e qualquer outro dado de interesse relacionado com a solicitação.
Em 20 de fevereiro, a advogada Rocío Fernández, representante legal da jornalista Elizabeth Palma, pediu 15 anos de prisão para um funcionário da Controladoria Geral da República, acusado de jogar o carro sobre ela quanto esta tentava entrevistar o titular dessa instituição, Daniel Fretes Ventre, acusado de numerosas irregularidades.
O incidente ocorreu em 17 de agosto de 2000, dia em que Fretes Ventre concluía sua administração no comando da Controladoria, e a pena foi solicitada para o motorista Calixto Arguello, acusado de atos de lesão corporal grave, omissão de prestação de auxílio e outros delitos contra Palma.
Em 23 de fevereiro, Felipe Sanabria, repórter gráfico do jornal Noticias, foi brutalmente agredido por um agente da FOPE (Força de Operações Especiais) da Polícia Nacional enquanto cobria uma manifestação de operários e agricultores.
Em 25 de fevereiro, José Espínola, correspondente do jornal La Nación em Ciudad del Este, 330 km a leste de Assunção, recebeu ameaças de morte por telefone depois de publicações sobre policiais processados por extorsão e torturas.
Em 5 de março, o juiz Antonio Ocampos ordenou que o jornal Noticias revelasse oficialmente o nome de seu diretor antes de ditar a sentença em um processo por difamação promovido contra a citada publicação.
A acusação foi feita por Richard Gómez que se sentiu afetado por um artigo no Noticias em 13 de maio de 1999, sob o título Richard Gómez é o terceiro pistoleiro no assassinato de Argaña, mencionando o magnicídio que custou a vida do vice-presidente Luis María Argaña em março do mesmo ano.
Gómez foi liberado do processo, e em seguida iniciou-se o processo contra o jornal.
Madrid, Espanha