BRASIL
O exercício da liberdade de imprensa foi afetado pelo aumento das pressões e atos de violência contra jornais e jornalistas e pela total impunidade para os crimes contra jornalistas.
Oito assassinatos continuam sem punição. Em 1995, ocorreram quatro crimes e outros quatro nos últimos doze meses, todos ligados à atividade profissional. No caso de Zaqueu de Oliveira, a partir da investigação da SIP e da ANJ-Brasi!, a justiça mineira passou a utilizar todos os recursos legais disponíveis para acelerar o andamento do processo.
Ainda existe a possibilidade de a Assembléia Nacional aprovar uma nova lei de imprensa coercitiva.
Durante o período eleitoral, a imprensa enfrentou momentos de tensão e teve dificuldades para trabalhar. Os candidatos e os partidos políticos recorreram inúmeras vezes à justiça para exercer o direito de resposta e, em várias ocasiões, juízes decretaram apreensão de jornais, com base na Lei Eleitoral.
Eis os principais fatos desse período:
13 de agosto - O delegado da 15' Divisão Regional de Polícia do Interior apresentou relatório segundo o qual as investigações técnico-científicas não oferecem conclusões comprobatórias da autoria do assassinato do jornalista Manoel Leal de Oliveira, que ocorreu em 14 de janeiro de 1998. Leal era dono do semanário A Região, em Itabuna, Bahia, e denunciava sistematicamente várias pessoas infiuentes da região, especialmente Fernando Gomes, prefeito da cidade.
Em julho, dois policiais encarregados do caso estenderam a investigação do assassinato de José Carlos Mesquita a Buriti, no estado de Rondônia. Sete meses depois, não se têm informações sobre as investigações e o crime continua impune. Mesquita, comentarista de rádio, de 39 anos, apresentador
do programa "Espaço Aberto" da TV Ouro Verde, na cidade de Ouro Preto do Oeste, a 350 km de Porto Velho, norte do país, foi assassinado com três tiros em frente à sede da emissora. O comentarista era proprietário da emissora na qual apresentava o programa de denúncias.
20 de abril - O técnico de futebol Luiz Felipe Scolari, da Sociedade Esportiva Palmeiras, de São Paulo (capital), agrediu com um soco o repórter Gilvan Ribeiro, do jornal Diário Popular, de São Paulo, ao final de um treino.
22 de abril - Repórteres que faziam a cobertura diária das atividades do time do Palmeiras foram ameaçados e agredidos no Centro de Treinamento da Barra Funda, localizado no bairro de mesmo nome, em São Paulo.
18 de julho - O escritório do Instituto Gazeta-Dados/Fonte, de Cuiabá, estado de Mato Grosso, foi invadido, vasculhado e furtado. Os arrombadores levaram cinco caixas contendo 3.598 formulários da última pesquisa eleitoral para governador do Estado, mas nenhum equipamento eletrônico nem computadores
e impressoras que estavam no local foram levados. O Instituto Gazeta Dados/Fonte integra o Grupo Gazeta de Comunicação e, segundo denúncia publicada em editorial do jornal A Gazeta,
também de Cuiabá, todas as empresas do grupo têm sofrido sistemáticas agressões desde que começou a campanha eleitoral no país.
22 de julho - O jornalista Efrém Ribeiro, do jornal Meio Norte, de Teresina (capital do estado do Piauí), foi agredido pelo ajudante-de-ordens do vice-governador do Piauí, Osmar Araújo, o capitão Moisés, da Polícia Militar.
29 de julho - Durante conflito, no Rio de Janeiro, entre um grupo de manifestantes contrários à venda da Telebrás (Telecomunicações do Brasil S/A) e a Polícia Militar, nove jornalistas resultaram feridos.
12 de maio - O radialista Hélcio de Castro Araújo, da rádio comunitária FM Maratoã, de Barras, município do estado do Piauí, denunciou que recebeu ameaças de morte por meio de telefonemas anônimos e também pessoalmente.
23 de maio - O Tribunal Regional (TRE) concedeu liminar em habeas corpus impetrado pelo advogado Ademar Gomes em favor de Otílio Claudino de Araújo Júnior, diretor de redação e proprietário do jornal Realidade Cidade, do município de Presidente Prudente, estado de São Paulo. A liminar permite
que Araújo Júnior responda em liberdade à sentença condenatória prolatada por um juiz eleitoral, condenando-o a quatro meses e 15 dias de detenção por crime de imprensa pela publicação, em
1996, de fatos desabonadores contra o ex-prefeito da cidade de Santo Anastácio, Roberto Volte.
30 de julho - O jornalista Juca Kfouri, da Folha de São Paulo, foi absolvido por unanimidade - voto de três desembargadores - na 7' Câmara Criminal do Rio de Janeiro. Kfouri tinha sido processado por calúnia, injúria e difamação pelo presidente da Confederação Brasileira de Futebol, Ricardo Teixeira.
6 de agosto - O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Nelson Jobim, pediu a revisão da ação de inconstitucionalidade, apresentada pelo procurador-geral da República, contra parte do Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei n'8.069/90). A ação atende a pedido da Associação Nacional de Jornais
- AJN Brasil, que é contra a apreensão de jornais em qualquer circunstância.
O procurador questiona o parágrafo 2'do artigo 247 do Estatuto, que prevê a suspensão, por até dois dias, da programação de emissoras de rádio ou TV e da publicação de jornais que divulgarem o nome ou a imagem de menores envolvidos em delitos. O pedido de revisão foi feito após o voto do relator, Ilmar GaIvão, para quem a punição estabelecida na lei é uma forma de censura à liberdade de informação jornalística, prevista no parágrafo l' do artigo 220 da Constituição Federal do Brasil.
12 de agosto - A deputada federal Marta Suplicy (PT - Partido dos Trabalhadores) pediu, na Câmara dos Deputados, a instalação de uma comissão permanente para estudar, pesquisar e monitorar a programação de televisão no Brasil. A idéia é fiscalizar o cumprimento do artigo 221 da Constituição Federal, que obriga as redes de TV a darem prioridade a programas educativos, artísticos e culturais. A deputada considera um erro achar que o "controle social" dos meios de comunicação signifique uma
volta à censura.
29 de agosto - O Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que, em casos de processo por dano moral contra a imprensa, as multas deverão ser aplicadas com base na Constituição Federal e não na Lei da Imprensa, que prevê uma quantia muito menor.
O Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro condenou o Jornal do Brasil a pagar uma indenização de 500 salários mínimos (R$65 mil) a Ester Kosovski, ex-presidente do Conselho Federal de Narcóticos, por uma reportagem em que esta é acusada de tráfico e uso de drogas.
O Jornal do Brasil pretendia que a condenação fosse baseada na Lei de Imprensa, que fixa indenizações entre dois e vinte salários mínimos (R$260,00 e R$2.600,00). 1' de setembro - O Partido dos Trabalhadores pediu direito de resposta ao jornal Folha de São Paulo por reportagem publicada no dia 26 de agosto, segundo a qual Luiz Inácio Lula da Silva, candidato à
presidência da República, não teria registrado em cartório a venda do de terreno recebido por herança de sua mulher, Marisa, e seus dez irmãos. Para os advogados do jornal, ao entrar na vida pública, o candidato "abre mão, voluntariamente, de uma parcela de sua vida íntima", podendo esta ser assunto
de interesse público.
No dia 2 de setembro, o ministro-auxiliar do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), Luiz Carlos Madeira, concedeu O direito de resposta contra a Folha de São Paulo argumentando que "a liberdade de imprensa não é absoluta. Basta que a publicação seja injuriosa, caluniosa ou difamatória".
2 de setembro - O ministro-auxiliar do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), Vicente Cernicchiaro, suspendeu a veiculação de direito de resposta do candidato Luiz Inácio Lula da Silva ao noticiário da Rede Bandeirantes de Televisão. A emissora solicitou a suspensão sob argumento de que a fita enviada por
Lula continha propaganda eleitoral de sua candidatura e ofensas à emissora. Lula ajuizou oito pedidos de direito de resposta contra a Bandeirantes. Quatro foram concedidos.
9 de setembro - O Tribunal Regional Eleitoral (TRE) do estado de Sergipe tirou do ar por 72 horas a rádio Liberdade AM, de propriedade do ex-prefeito José Almeida Lima, que era candidato ao Senado Federal pelo PDT. O Tribunal Regional Eleitoral entendeu que a emissora estava difundindo opiniões favoráveis a José Lima e contrárias aos seus adversários fora do horário eleitoral gratuito, o que é proibido pela Lei 9.504/98. A emissora foi multada em R$I,1 milhão.
Na semana anterior, o mesmo TRE havia aplicado uma multa de R$480 mil contra a Rádio Jornal AM, de propriedade do ex-governador e candidato ao governo do estado de Sergipe pelo PFL, João Alves Filho, também por difusão de opiniões favoráveis a Alves Filho.
11 de setembro - O Sistema Brasileiro de Televisão (SBI) foi obrigado a veicular durante dois dias inserções comerciais do candidato à presidência da República, Luiz Inácio Lula da Silva, do Partido dos Trabalhadores, PT, que a emissora deixou de levar ao ar, desrespeitando a planilha de exibição da
propaganda estabelecida pela Justiça Eleitoral.
30 de setembro: A TV Caburaí, retransmissora da TV Bandeirantes, em Boa Vista, estado de Roraima, foi tirada do ar por determinação do juiz eleitoral Humberto Teixeira. Agentes da Polícia Federal prenderam o operador de master Valdo de Oliveira, único funcionário da emissora que estava trabalhando,
e que foi libertado após pagar fiança.
3 de outubro - A Justiça Eleitoral condenou o Sistema Brasileiro de Televisão (SBI) a suspender sua programação normal por 24 horas e a pagar uma multa equivalente a R$193.200. A alegação em juízo foi de que o apresentador Carlos Massa, conhecido como "Ratinho", teria violado o artigo 45 da Lei Eleitoral ao "difundir opinião contrária" à candidatura de Mário Covas, fazendo campanha a favor do candidato do PPB, Paulo Maluf, "enaltecendo sua proposta para segurança pública do Estado".
4 de outubro - No estado do Piauí, duas emissoras de televisão - Meio Norte, retransmissora do SBT, e Itapecuru, da CNT - foram lacradas por 24 horas pela Justiça Eleitoral no dia das eleições, sob a alegação de que teriam desrespeitado a Lei que regulou as eleições deste ano.
12 de outubro - O juiz Ingo Sarlet acatou solicitação do promotor de Justiça, Vanderlei Willig, e determinou a apreensão do Jornal do Povo, de Cachoeira do Sul, estado do Rio Grande do Sul. Segundo o juiz, a edição continha matéria sobre reunião dos líderes regionais de uma coligação partidária considerada como espaço privilegiado para um dos candidatos ao governo do estado.
13 de outubro - O jornal Gazeta Mercantil foi vítima de uma tentativa de imposição de censura prévia no suplemento que circulou no Rio Grande do Sul, no dia 20 de setembro deste ano, data comemorativa daquele estado. O suplemento traçava um perfil da economia estadual, destacando seu crescimento competitivo. A publicação foi acusada, porém, de fazer propaganda eleitoral, mesmo que não contivesse nomes, fotos ou referência a candidatos ao governo do estado.
14 de outubro - A juíza Carmency Rosa Maria Alves de Oliveira, auxiliar do Tribunal Regional Eleitoral na fiscalização da campanha eleitoral de 1998 do estado de Goiás, aplicou multas de meio milhão de reais por abuso na propaganda eleitoral no prazo de uma semana.
Três emissoras de rádio do estado de Goiás sofreram penas pecuniárias aplicadas pela Justiça Eleitoral por infrações cometidas na programação ainda durante o processo para o primeiro turno das eleições.
21 de outubro - A Justiça Eleitoral negou liminar pedida pelo candidato ao governo do estado de São Paulo, Paulo Maluf (PPB), para impedir a divulgação de pesquisas de intenção de voto do instituto Datafolha, ligado ao jornal Folha de São Paulo, da capital.
24 de outubro - Dois jornais de Porto Alegre, capital do Rio Grande do Sul- Zero Hora e Correio do Povo - tiveram as edições desse dia apreendidas por determinação do Tribunal Regional Eleitoral (TRE).
Além do Comeio do Povo e de Zero Hora, também foram apreendidos os exemplares de edições desta data do Tornai do Comércio e o caderno regional da Gazeta Mercantil.
O TRE-RS mandou apreender o primeiro caderno dos 160.000 exemplares distribuídos pelo jornal Zero Hora. A exemplo do Correio do Povo, Zero Hora teve que publicar no restante da edição - cerca de 40.000 exemplares - o direito de resposta da Frente Popular.
A liminar foi concedida pelo juiz eleitoral auxiliar Carlos Roberto Caníbal, do Tribunal Regional Eleitoral, proibindo a veiculação do anúncio na edição dominical. (O anúncio, mandado publicar pelo PSDB, manifestava o apoio do presidente Fernando Henrique Cardoso ao governador licenciado Antonio
Britto.) A seguir, uma nova decisão determinou a inclusão de direito de resposta da Frente Popular, suspenso no final da noite, por outra liminar concedida pelo Tribunal Superior Eleitoral.
Os dirigentes da ANJ-Brasil manifestaram ainda que "a liberdade de expressão é um dos valores maiores do Estado de Direito, e não pode voltar a ser restringida, a que título e por quem for".
Parte da edição do jornal Meio Norte, de Teresina (capital do estado do Piauí), foi apreendida por determinação do juiz eleitoral Sebastião Martins por ter reproduzido matéria publicada na edição nº 1517 da revista semanal IstoÉ. No entendimento da Justiça Eleitoral, a reportagem poderia interferir no pleito porque criticava um dos candidatos.
Os exemplares da revista IstoÉ destinados ao Piauí foram apreendidos no aeroporto de Teresina por determinação do juiz eleitoral Manoel Soares, atendendo à representação feita pelo governador.
25 de outubro - A edição desta data do Tornai Agora, de Divinópolis, município do estado de Minas Gerais, foi apreendida por determinação da juíza Neide da Silva Martins, da 102' Zona Eleitoral da Comarca de Divinópolis (MG). O caso está nas mãos do Procurador Geral da República Geraldo Brindeiro.
A Associação Nacional de Jornais (ANJ-Brasil) emitiu Nota de Protesto por considerar a apreensão de jornais um ato atentatório à livre circulação de publicações e uma afronta à liberdade de imprensa, garantida pela Constituição Federal.
Madrid, Espanha