ESTADOS UNIDOS

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Mandados de busca e intimações a jornalistas têm sido uma das principais preocupações da mídia nos Estados Unidos durante muitos anos. Durante a presidência de Barack Obama aumentaram consideravelmente as ações judiciais relacionadas ao vazamento de segredos do governo à imprensa. O Departamento de Justiça emitiu várias intimações a jornalistas para descobrir a identidade de fontes confidenciais. Emitiu intimações também para obter registros telefônicos de jornalistas da agência de notícias Associated Press e, ao amparo da Lei de Espionagem, moveu ação contra o jornalista James Rosen, da Fox News, chamando-o de “co-conspirador” para poder obter seus e-mails. Mais recentemente, tentou obter o depoimento de James Risen, no julgamento de Jeffrey Sterling. Porém, acontecimentos recentes poderiam ser um sinal de mudança na forma como o Departamento de Justiça lida com a mídia. O procurador-geral Eric Holder e os advogados do governo finalmente decidiram não forçar Risen a depor. Além disso, o Departamento de Justiça participou de um amplo diálogo com representantes da mídia para revisar suas diretrizes internas referentes a intimações a meios de comunicação de modo a respeitar a liberdade de imprensa. Tom Wheeler, presidente da Comissão Federal de Comunicações (FCC), anunciou no início de fevereiro que a FCC iria votar uma nova proposta que se posicionava extremamente a favor da neutralidade da rede. “Essas regras claras e fortes proibirão a priorização mediante pagamento e o bloqueio e a redução da velocidade para acesso a serviços e conteúdo lícitos”, Wheeler escreveu em um editorial. Ele afirmou acreditar que a melhor forma de sustentar a Internet como uma plataforma para “inovação e expressão humana” é garantir a neutralidade da rede. Os defensores da neutralidade da rede temem que, sem regulamentação, os provedores de serviços de Internet, ou seja, as empresas que possuem os cabos para o tráfego da Internet, poderão cobrar taxas mais altas para algumas operadoras da web, excluir determinados conteúdos ou fornecer velocidades variadas para diferentes tipos de conteúdo. Em 26 de fevereiro, a FCC aprovou a política de neutralidade na rede por 3 votos a 2. Wheeler disse que a política garantirá “que ninguém, seja o governo ou empresas, controle o acesso livre e aberto à Internet”. Anteriormente, o Comitê de Repórteres (Reporters Committee for Freedom of the Press – RCFP) uniu-se a outros grupos da mídia para apresentar comentários sobre as regulamentações da FCC, insistindo na necessidade de manter-se uma Internet aberta. Considerando-se o grande volume no consumo de notícias online, qualquer política que permita que os provedores de serviços favoreçam determinados conteúdos colocará em risco os direitos da Primeira Emenda. A tentativa do Departamento de Justiça de obter o depoimento do jornalista James Risen em uma investigação sobre vazamento de informações foi encerrada. Depois de mais de quatro anos de combate à intimação que recebeu para o caso Jeffrey Sterling, o drama de Risen terminou quando o Departamento de Justiça anunciou, em dezembro de 2014, que não tentaria forçá-lo a depor e a revelar a identidade de uma fonte confidencial que forneceu detalhes de uma operação da CIA para o livro de Risen, State of War: The History of the CIA and the Bush Administration (Estado de Guerra: a História da CIA e da administração Bush). O Departamento de Justiça começou a investigar Sterling, ex-agente da CIA, em 2008, por ter supostamente fornecido informações a Risen. Sterling foi  acusado com base na Lei de Espionagem em 2010, e Risen foi intimado a depor para revelar se Sterling havia sido uma de suas fontes. Risen impugnou a intimação e o juiz Leonie Brinkema, do distrito leste da Virgínia, decidiu que seu privilégio de jornalista o eximia de depor. Em junho de 2014, a Suprema Corte rejeitou o recurso de Risen e o caso voltou para o juiz Brinkema. Em uma audiência em dezembro, os advogados do governo anunciaram que não obrigariam Risen a revelar a identidade da sua fonte. Risen foi intimado para uma audiência em janeiro de 2015 e deu respostas curtas a perguntas muito limitadas, tanto do governo quanto dos advogados de Sterling. Confirmou que tinha acordos de confidencialidade com algumas fontes e que havia falado com Sterling sobre um artigo de 2002 que citava seu nome. Não lhe perguntaram sobre os lugares e datas em que havia se comunicado com as fontes. Após essa audiência, ambas as partes anunciaram que não chamariam Risen para outros depoimentos no julgamento de Sterling. Três semanas mais tarde, Sterling foi condenado ao amparo da Lei de Espionagem e poderá cumprir pena máxima de décadas na prisão. Mesmo sem informações internas sobre as deliberações internas do Departamento de Justiça, pode-se especular que houve vários motivos par aa decisão de não forçar o depoimento de Risen. Houve uma rejeição generalizada da mídia e do público contra o governo e a ideia de que um jornalista seria forçado a ir para a prisão por honrar seu compromisso de confidencialidade. A pressão contribuiu para que o procurador-geral, Eric Holder, prometesse, em 2014, que nenhum jornalista iria para a prisão por fazer seu trabalho, apesar de ainda ser possível que Risen seja multado por desacato. Outra possível razão para o governo decidir não forçar o depoimento de Risen foi o fato de o juiz Brinkema haver previsto, e o que acabou acontecendo – que o governo podia provar seu caso contra Sterling mesmo sem o depoimento do jornalista. Analisando os e-mails e telefonemas de Sterling, assim como seu acesso a informações confidenciais, o Departamento de Justiça pôde montar um caso circunstancial identificando como a pessoa que passou as informações. Os recursos tecnológicos cada vez mais modernos que o Departamento de Justiça pode usar para investigar as comunicações de quem vaze informações fazem supor que o governo continuará usando esses recursos ao máximo, e pode ser que no futuro não precise mais dos depoimentos de jornalistas Apesar do resultado favorável para James Risen, o sucesso da acusação do caso de Sterling transmite uma mensagem preocupante para aqueles que possam fazer denúncias sobre o governo, e que poderão evitar falar com os jornalistas devido às fortes sanções previstas na Lei da Espionagem e à facilidade com que o governo pode usar a vigilância eletrônica para investigar os casos. Após as críticas a partes importantes das suas diretrizes para intimação de membros da mídia conforme revisadas em fevereiro de 2014, o Departamento de Justiça anunciou novas revisões em janeiro de 2015 que tratam dos aspectos preocupantes. As mudanças eliminam a expressão “atividades comuns de coleta de notícias”, e esclarecem outras seções para garantir que todos os registros sobre coleta de informações sejam cobertos e que as exceções para as proteções sejam o mais limitadas possível. O Comitê de Repórteres ajudou a coordenar o Grupo de Diálogo de Meios Noticiosos (News Media Dialogue Group), formado pelos principais líderes do setor noticioso, para se reunir com o Departamento de Justiça e discutir as preocupações da mídia. A revisão das diretrizes do Departamento de Justiça ocorreu depois das revelações, em maio de 2013, de que o Departamento havia obtido secretamente registros telefônicos e de e-mail de jornalistas da agência de notícias AP e da Fox News. O Comitê de Repórteres e uma coalizão de mais de 50 organizações noticiosas recomendaram a revisão das diretrizes, escritas originalmente em 1970 e revisadas pela última vez em 1980, para incluir intimações a terceiros sobre registros telefônicos. De acordo com as revisões do ano passado, tornou-se mais difícil para o Departamento de Justiça reter informações sobre intimações a terceiros. Além disso, de acordo com as revisões de 2014, o Departamento não poderá invocar a “exceção de suspeita” da Lei de Proteção de Privacidade, que lhe permite obter um mandado de busca para materiais que pertençam a um jornalista que seja suspeito de um crime – quando o jornalista estiver envolvido em atividades comuns de coleta de notícias e não for alvo de investigação criminal. A expressão “atividade comum de coleta de notícias” foi substituída por “atividades de coleta de notícias” nas últimas revisões devido às preocupações da mídia de que o termo “comum” fosse vago demais e pudesse ser usado  para não se fornecer proteção aos jornalistas que estivessem envolvidos no que o governo poderia subjetivamente considerar como um tipo de coleta de notícias que ele desaprovasse. A revisão das diretrizes coincidiu com a decisão de processar Jeffrey Sterling mesmo sem o depoimento de James Risen. A decisão final de não obrigar Risen a depor, associada à disposição do Departamento de Justiça de trabalhar com grupos de mídia para tornar as diretrizes melhores, poderá indicar que os jornalistas podem esperar menos ameaças de intimação no futuro. Por outro lado, as diretrizes são meramente voluntárias, não possuem força de lei e só funcionam para o Departamento de Justiça. Portanto, os jornalistas poderão ainda ser alvo de intimações de promotores estaduais, por exemplo. Mas essas medidas do governo são positivas e os jornalistas têm esperança de que as linhas de comunicação mantenham-se abertas para permitir que sejam discutidas também as preocupações futuras.  

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