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Relatório à Reunião de Meio de Ano

Março 2020

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Os últimos seis meses foram marcados por um crescente aumento dos ataques virtuais aos jornalistas e empresas jornalísticas, com lamentável consolidação de um quadro contrário à liberdade de imprensa nas redes sociais que vem se formando nos últimos anos. Levantamento feito por pela empresa Bites, de monitoramento de dados digitais, mostra que em 2019 a mídia profissional sofreu quase 11 mil ataques diários pelas redes sociais, o que representa 7 agressões por minuto.

São postagens com palavras de baixo calão ou com expressões que tentam desacreditar o trabalho da imprensa, e que foram produzidas por perfis e sites com viés ideológico. Ao longo de todo ano de 2019, a soma dos ataques resultou em cerca de 4 milhões de postagens negativas contra a imprensa, o equivalente a 10% de tudo o que foi produzido nesse período sobre a área de comunicação profissional.

Embora os ataques virtuais ao jornalismo profissional se originem em todo o espectro político do país, é evidente a maior preponderância das postagens vindas a partir da direita. A atuação do presidente Jair Bolsonaro e seus seguidores se destaca nessa ofensiva. Além das redes sociais, o presidente se utiliza frequentemente de pronunciamentos e entrevista para desqualificar jornalistas e empresas jornalísticas.

O presidente adotou o hábito de, saindo da residência oficial do Palácio da Alvorada, se dirigir aos jornalistas para acusá-los e provocá-los. Nessas ocasiões, o comportamento do presidente estimula seus apoiadores - que se postam diariamente no local - a também agredir verbalmente os jornalistas.

O chefe do governo trata como inimigos a serem destruídos os veículos de comunicação que publicam reportagens ou análises negativas de sua administração. Em diversas oportunidades, o presidente Bolsonaro recomendou a setores empresariais que não façam investimentos publicitários nesses veículos de comunicação, assim como sugeriu aos cidadãos que não subscrevam publicações jornalísticas que considera inimigas.

Em paralelo a essa ofensiva oficial contra imprensa, seguem no país os casos de violência física aos jornalistas, estimulados pela ineficiência das autoridades policiais e do Poder Judiciário na identificação e punição dos culpados.

Outros fatos relevantes:

Em 21 de novembro, jornalistas foram hostilizados por militantes e apoiadores do presidente Bolsonaro no primeiro evento do partido Aliança pelo Brasil, em Brasília, com xingamentos de "lixo", "esquerdistas" e "raça imunda.

No dia 9 de janeiro, a Polícia Militar de São Paulo impediu o trabalho do repórter Arthur Stabile, do site Ponte Jornalismo, e do repórter fotográfico Lucas Martins, do site Jornalistas Livres, quando estes registravam agressões aos manifestantes do Movimento Passe-Livre (MPL), na Praça da Sé, centro da capital paulista; que na ocasião o repórter fotográfico Daniel Teixeira, do jornal O Estado de S.Paulo, levou um golpe de cassetete nas costelas.

Em 21 de janeiro, o Ministério Público Federal (MPF) apresentou uma denúncia contra o jornalista Glenn Greenwald por associação criminosa para invasão de equipamentos de comunicação e interceptação ilegal de comunicações. Em repúdio, em 24 de janeiro, entidades nacionais e internacionais enviaram uma carta aberta às autoridades brasileiras, caracterizando a denúncia como "abuso de poder".

Em 18 de fevereiro, o presidente Bolsonaro disse insultos de cunho sexual contra a repórter da Folha de S.Paulo, Patrícia Campos Mello, ao reproduzir informações de um depoimento na CPI das Fake News.

A jornalista Vera Magalhães, da TV Cultura e do Estado de S. Paulo, foi vítima de doxxing (exposição de dados pessoais) e da criação de um perfil falso em uma rede social, depois de ter revelado em 25 de fevereiro no site BR Político, que o presidente Bolsonaro disparou mensagens de apoio a um ato contra o Congresso Nacional por meio de seu WhatsApp privado.

Em 6 de março, 17 entidades da sociedade civil brasileira denunciaram o governo Bolsonaro na 175ª audiência temática da Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), realizada no Haiti, por violações sistemáticas à liberdade de expressão no país, ataques à imprensa, censura às liberdades artística e cultural, sufocamento dos espaços de participação social e acesso à informação pública.

Em 16 de março, o Ministério Público Federal (MPF) denunciou seis pessoas pelo assassinato do jornalista Vladimir Herzog há 45 anos. Herzog, diretor de jornalismo da TV Cultura e responsável pelo telejornal "Hora da Notícia", foi preso, interrogado, torturado e assassinado por agentes da ditadura militar em 25 de outubro de 1975.

O MPF denunciou o chefe de comando da 2ª Seção do Estado-Maior do II Exército, José Barros Paes; o comandante do DOI-Codi , Audir Santos Maciel; e o ex-agente da unidade Altair Casadei. Também foram denunciados os médicos legistas Harry Shibata e Arildo de Toledo, e o promotor de Justiça Militar Durval Moura Araújo.

A Corte Interamericana de Direitos Humanos condenou o Brasil por negligência em investigar e julgar o caso em março de 2018.

O informe sobre a violência contra jornalistas mulheres no Brasil realizado pela Abraji identificou 20 ataques contra as comunicadoras entre janeiro de 2019 e fevereiro de 2020, incluindo ofensas misóginas e machistas, descredibilização do trabalho e exposição de informações pessoais; que dos 17 casos registrados em 2019, 13 foram perpetrados por deputados federais e estaduais, ministros e o próprio presidente Bolsonaro e, até fevereiro de 2020, houve três ataques perpetrados por políticos.

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