Desde que Daniel Ortega assumiu novamente o poder, em janeiro de 2007, e começou a restaurar a ditadura, aumentaram as restrições à liberdade de imprensa e os ataques à mídia e aos jornalistas independentes. A situação piorou quando o regime sufocou a rebelião autoconvocada em abril de 2018.
Agora, um ano e meio depois, a situação da liberdade de imprensa e a situação política do país pioraram. As eleições presidenciais e legislativas serão realizadas daqui a um ano, em novembro de 2021, mas não há sinais de que haverá lisura.
O estado de sítio se mantém. Encontros de mais de duas pessoas estão proibidos. Em todo o país, a polícia, que agora se denomina "polícia orteguista", coloca vigias diante da bandeira nacional, novo símbolo da rebelião cívica, e também a confisca de pessoas que a carregam. Os jornalistas são atacados e têm seus equipamentos roubados durante esses incidentes.
As ações judiciais são um novo método de repressão, e o governo quer aprovar três leis que afetam a liberdade de imprensa. Uma delas parece ter sido formulada para reprimir políticos e eliminar candidatos.
A lei de "Regulamentação dos Agentes Estrangeiros" pretende "controlar as operações financeiras e as atividades de associações, organizações nacionais ou estrangeiras para acabar com a interferência estrangeira nos assuntos internos da Nicarágua". Ela foi criada para impedir o financiamento dos partidos de oposição para as eleições de novembro de 2021 e prejudica também os meios de comunicação que recebem ajuda de diferentes fundações. A lei exige a especificação de "agente estrangeiro" e que sejam declaradas todas as doações, que deverão ser aprovadas pelo ministério do Interior.
Setenta deputados partidários do governo apresentaram um projeto de lei para uma Lei Especial de Crimes Cibernéticos, conhecida como Lei Mordaça. Ele foi criado tendo como objetivo a "preservação, investigação, julgamento e sanção dos crimes cometidos por meio das tecnologias e da comunicação contra pessoas físicas ou jurídicas, bem como para a proteção integral dos sistemas que utilizam essas tecnologias, seus conteúdos e qualquer um de seus componentes".
A lei prevê que "aqueles que, utilizando tecnologia da informação e da comunicação publicarem ou difundirem informações falsas e/ou distorcidas que causem alarme, medo ou ansiedade na população, num grupo ou setor da população ou família" poderão ser punidos com dois a quatro anos de prisão.
Essa iniciativa concede poder ao Instituto Nicaraguense de Telecomunicações e Correios (TELCOR) para ordenar que qualquer empresa, associação, meio de comunicação ou entidade mantenha "congelados" por até três meses, os bancos de dados dos seus sistemas de informação. Esses dados estarão disponíveis para a entidade reguladora, para a polícia e a procuradoria, que poderão apreender os equipamentos no caso de crimes cibernéticos.
Ortega aproveitou um feminicídio de duas meninas para propor a "prisão perpétua para crimes de ódio". Desde dezembro, Ortega perdoou mais de 22.000 presos comuns a pedido do Papa Francisco, embora o cardeal Brenes de Manágua tenha esclarecido que o pedido do papa dizia respeito a presos políticos. Muitos dos anistiados foram presos novamente e calcula-se que existam mais de 70 presos políticos acusados falsamente de crimes comuns.
A Comissão da Justiça e da Paz da Arquidiocese de Manágua anunciou que está tão preocupada quanto o povo nicaraguense com as ameaças à liberdade de imprensa e à integridade física das pessoas como decorrência de projetos de lei questionáveis que estão sendo propostos pelo regime.
O embargo de bens por inquéritos relativos a impostos de anos anteriores é o novo método usado para censurar a mídia e as empresas privadas, como acontece no caso do Canal 12. A juíza sandinista Silvia Chica Larios rejeitou todas as provas apresentadas pelos advogados do Canal 12 e ordenou que se mantivesse o embargo relativo a US$ 600.000 pedidos pela Direção-Geral da Receita (DGI). A entidade embargou quatro propriedades do Canal 12 num valor de US$ 1.200.000 referentes a uma suposta dívida fiscal de 2011 e 2012, de US$ 262.000, e que foi reduzida para US$ 24.000 por um tribunal administrativo.
Em 6 de outubro, o Canal 12 sofreu outro embargo, de US$ 200.000 e relativo a uma dívida fiscal de IVA de 2014-2015. O Canal 12 argumentou que não foram reconhecidos custos e despesas dedutíveis e contestou a decisão do juiz que rejeitou as provas.
O canal TV 100% Noticias também teve seus bens embargados pelo governo que está lhe cobrando um pagamento milionário. O canal continua fechado e seu proprietário não prevê sua reabertura.
O Confidencial também continua fechado e embargado pelo governo. Faz suas transmissões apenas pelas redes sociais porque está proibido de utilizar canais de TV aberta ou a cabo.
Em 22 de setembro, a jornalista e chefe de redação da rádio La Costeñísima, Kalúa Yakari Salazar, foi condenada pelo suposto crime de calúnia contra três ex-funcionários da prefeitura de El Rama, na costa sul do Caribe da Nicarágua. "Nós simplesmente abrimos o microfone a muitas pessoas que fazem suas denúncias, e é esse o nosso papel", declarou Salazar. As penas são de 150 a 300 dias-multa, calculadas de acordo com o salário da pessoa condenada, e podem ser pagas em prestações. Até agora, nenhuma sentença foi emitida.
Outro caso de intimidação dos jornalistas e da mídia ocorreu em 9 de junho, quando guardas de trânsito da polícia detiveram o diretor da Radio Darío, Anibal Toruño, durante uma blitz, e confiscaram sua picape, alegando que ele não tinha extintor de incêndios nem triângulos de advertência no carro. Em 25 de julho, a polícia de León fez um cerco à Radio Darío que durou nove horas. Ninguém podia sair nem entrar. Dias depois, uma patrulha postou-se em frente à rádio com uma unidade antimotim.
Em 24 de junho, o comandante-geral da polícia de Bluefields, na costa sul do Caribe, Luis Valle, agrediu a jornalista Suyén Sánchez, da Radio Única, e impediu que ela fizesse a cobertura de um evento.
Em 12 de julho, vários criminosos sabotaram a antena da rádio Corporación, de Tipitapa, próximo a Manágua. Os ladrões levaram as fitas de cobre que ficavam na base da antena.
Outros casos de ações judiciais por calúnia são o da jornalista Elsa Espinoza, foi processada por uma vizinha que a chamou de "jornalista golpista e grossa", e o do jornalista David Quintana, do Boletín Ecológico.
A Radio Estéreo Romance, de Carazo, anunciou em 4 de outubro que vai encerrar suas operações por falta de anúncios para se manter. Quinze jornalistas e outros funcionários ficaram desempregados. A diretora, Letzira Sevilla, que foi editora do El Nuevo Diario até seu fechamento, declarou que a asfixia econômica é uma forma de restringir a liberdade de imprensa.
Em 7 de outubro, o Parlamento Europeu (PE) condenou o projeto de lei sobre crimes cibernéticos e agentes estrangeiros que o governo defende. Em sua resolução, o PE pede que sejam impostas sanções ao presidente e ao vice-presidente e que se proteja a mídia independente. O PE ameaçou romper o tratado de livre comércio utilizando a cláusula de respeito à democracia.
Em 11 de outubro, durante uma reunião da Coalizão Nacional, em León, membros da oposição foram atacados a pedradas por forças orteguistas. A jornalista Verónica Chávez, esposa de Miguel Mora, do 100% Noticiais, sofreu ferimentos graves na cabeça e foi internada numa unidade de tratamento intensivo. A polícia multou os motoristas dos carros utilizados no protesto e cancelou suas carteiras de motorista.
Entre junho e outubro, o jornal La Prensa, único ainda em circulação, sofreu dois ataques de negação de serviço (DoS) que deixaram o portal fora de serviço por cerca de dois minutos e ocorreram duas tentativas de roubo de conteúdo.