A violência continua sendo a maior ameaça à liberdade de imprensa. No período que abrange este relatório, quatro profissionais da imprensa foram assassinados: Arturo Alba Medina, Jesús Piñuelas, Israel Vázquez e Jaime Castaño. Pablo Romero Chávez continua desaparecido.
É preocupante o aumento dos ataques à mídia e aos jornalistas pelo presidente Andrés Manuel López Obrador, num ambiente polarizado, com as eleições estando tão próximas e com uma pandemia que não se conseguiu controlar.
A falta de transparência no uso das verbas para publicidade oficial só fez facilitar uma distribuição discricionária a favor dos meios de comunicação que o governo considera seus aliados.
Arturo Alba Medina era apresentador do telejornal na Multimedios Televisión e foi morto a tiros em 30 de outubro de 2020 enquanto dirigia seu carro depois de sair do estúdio onde acabara de fazer uma reportagem sobre a corrupção e a criminalidade na polícia. Ele tinha 49 anos e dois filhos, e morava em Ciudad Juárez, em Chihuahua.
Jesús Alfonso Piñuelas, conhecido como "El Norris" e que era colaborador para vários meios de comunicação locais, foi assassinado a tiros no município de Cajeme, em Sonora, em 2 de novembro de 2020. Ele era fundador da Zarathustra Press e El Shock de la Noticia. Trabalhava para a Televisora del Pacífico e para a Agência ICE.
Una semana mais tarde, a Procuradoria-geral de Justiça do estado de Sonora, prendeu Francisco Bernardo "N", conhecido como "El Foca", que havia admitido sua culpa no assassinato.
Israel Vázquez Rangel, repórter do El Salmantino de Salamanca, Guanajuato, foi assassinado a tiros por dois homens em 9 de novembro de 2020, enquanto cobria a descoberta de uma bolsa plástica contendo restos humanos.
Jaime Daniel Castaño Zacarías, diretor do website PrensaLibreMx e funcionário da prefeitura de Jerez, Zacatecas, foi assassinado em 9 de dezembro. Homens armados não identificados o mataram pouco depois de ele tirar fotos de dois corpos abandonados na rua.Pablo Romero Chávez, que trabalha na editoria de polícia do jornal El Vigía e na unidade móvel da estação de rádio FM 105, desapareceu em 25 de março em Guaymas, Sonora. Depois de perder contato com o jornalista, sua família denunciou seu desaparecimento na Procuradoria-Geral de Justiça, que investiga o caso. Seus parentes disseram que o carro do jornalista foi deixado destrancado em frente à sua casa, que estava com a porta aberta.
Em meio a uma crise sanitária e econômica que se aprofunda cada vez mais, e diante dos reveses a seus grandes "projetos de transformação", o presidente López Obrador escolheu a mídia como o inimigo da vez. Utilizando o espaço público mais importante do país, numa apresentação matinal diária, transmitida pela televisão, pelo YouTube e outras redes sociais, ele ataca constantemente a mídia e os jornalistas com um discurso repleto de comentários depreciativos.
O presidente chega a exibir primeiras páginas de jornais em telas gigantes e corrige a linha editorial, enquanto aplaude outros veículos de mídia que apoiam suas declarações e ações. Alguns jornalistas reforçam o que o presidente quer dizer, inclusive indo contra os colegas que estão presentes. A isto se somam os ataques de exércitos de bots que criticam, ameaçam e insultam qualquer voz crítica.
A questão se tornou tão perigosa que em seu livro Un daño irreparável, a pesquisadora Laurie Ann Ximénez-Fyvie lembra-se de uma coletiva de imprensa em que uma jornalista do jornal Reforma questionou a estratégia contra a Covid do subsecretário de saúde, Hugo López Gattel. Ele evitou responder e ela insistiu. Antes de obter uma resposta clara, a jornalista começou a receber insultos em suas redes sociais a partir de contas classificadas como "bots".
A tese central do presidente e de seu gabinete é que a mídia é parte do neoliberalismo, que pratica um jornalismo colonizador, e o presidente utiliza rótulos simplistas como a imprensa "fifi" [imprensa conservadora]. Para ele, não há críticos de boa-fé, mas sim opiniões maliciosas que têm como objetivo manchar o trabalho de seu governo e de sua pessoa.
No entanto, ele afirma que não exercerá censura alguma nem encorajará a demissão de jornalistas porque acredita em um regime de liberdade. E ele deixa de fora de seus ataques os poucos meios de comunicação que considera leais, o jornal de esquerda La Jornada e a TV Azteca, que faz parte de outra empresa aliada na distribuição de subsídios ao povo, que são o eixo central de sua política social.
O jornal El Universal, um dos jornais que mais tem recebido insultos do presidente, publicou uma série de entrevistas com profissionais da imprensa de todo o espectro político sobre a relação entre a presidência e a mídia. As críticas predominam, e mesmo os entrevistados que mais apoiam o presidente sugeriram que ele moderasse suas expressões e ataques.
Em 13 de novembro de 2020, a SIP expressou preocupação com o fechamento de uma clínica de saúde de propriedade da empresa que publica o jornal mexicano El Debate, em aparente retaliação à linha editorial do jornal. O fechamento da clínica Mi Salud, de propriedade das Empresas El Debate, foi visto por políticos de diferentes partidos e por funcionários da prefeitura de Ahome, no estado de Sinaloa, como uma medida deliberada para prejudicar o jornal.
Em fevereiro, o senador Ricardo Monreal, do partido Morena, anunciou um projeto de lei preocupante para regular as redes sociais. Ele fez o anúncio através das plataformas digitais. A iniciativa visava reformar a Lei Federal de Telecomunicações e Radiodifusão e propunha, entre outras coisas, a criação da figura das "autorizações para serviços de redes sociais", estabelecia a definição de redes sociais relevantes para aqueles com um milhão ou mais de assinantes ou usuários, e previa um sistema de penalidades e multas sobre o conteúdo que os usuários postassem nas plataformas. O projeto de lei causou controvérsia por causa de sua ameaça à liberdade de expressão e foi retirado.
O capítulo do México da organização Artigo 19 apresentou seu relatório em março, concluindo que "dois anos após o início do governo do Presidente Andrés Manuel López Obrador, persistem a dinâmica de estigmatização da imprensa, a censura, as violações dos direitos humanos e o enfraquecimento ou abandono das instituições criadas para contrabalançar o poder".
Intitulado "Distorção: o discurso contra a realidade", o relatório deixa claro que em 2020 o governo manteve sua política de desinformação, numa tentativa de controle e censura na internet, e foram registrados 692 ataques a jornalistas.
O Departamento de Estado dos EUA apresentou seu relatório sobre violações de direitos humanos que inclui a jornalista Sanjuana Martinez, diretora da agência noticiosa estatal Notimex, por ter tentado silenciar jornalistas, de acordo com as observações da Artigo 19.
López Obrador criticou os Estados Unidos por se meterem nesse assunto e descreveu a Artigo 19 como "uma organização apoiada por estrangeiros, todas as pessoas que têm a ver com o Artigo 19 pertencem ao movimento conservador que é contra nós". O jornal La Jornada publicou uma matéria de destaque intitulada "Financiada pelos Estados Unidos, a Artigo 19 alimentou o golpe de Estado contra o México".
Em matéria de publicidade oficial, continuam a falta de clareza e a falta de critérios transparentes para a alocação de verbas. O compromisso de regular as publicações, levando em conta a penetração e a circulação da mídia, não passou de uma declaração.
Devido a este fato, o jornal Reforma publicou que, em dois anos, o La Jornada beneficiou-se de mais de 440 milhões de pesos em publicidade, "além de ter recebido contratos milionários do governo da Cidade do México e da prefeitura para sua subsidiária 'Imprenta de Medios'".
Para 2020, o governo federal aprovou 2.452 milhões de pesos, quase metade do orçamento aprovado para 2019 (4.165 milhões de pesos), e 1.248.779.648 pesos foram utilizados em 2020, ao passo que, em 2019, foram gastos 3.245.595.820.