Relatório do presidente da Comissão contra a Impunidade Juan Francisco Ealy Ortiz Domingo, 14 de outubro de 2007 Assembléia Geral da SIP Miami, Flórida
A violência contra os jornalistas continua nas Américas e por isso não podemos comemorar os resultados da nossa paciente e perseverante luta contra a impunidade.
Infelizmente, nesse último semestre, a violência deixou de luto meios de comunicação e redações em vários países. Foram assassinados nove jornalistas: Salvador Sánchez, de El Salvador; Javier Darío Arroyave, da Colômbia; Alberto Palma, do Paraguai; Chauncey Bailey, dos Estados Unidos; Alix Joseph, do Haiti; Luiz Carlos Barbon, do Brasil; Miguel Pérez Julia, do Peru; e Saúl Martínez Ortega e Amado Ramírez, do México. Dois jornalistas mexicanos, Gamaliel López e Gerardo Paredes, estão desaparecidos desde maio. Nesse período, informamos também que Mateo Cortés Martínez, Agustín López, e Flor Vásquez López, vendedores do jornal El Imparcial del Itsmo, de Oaxaca, foram assassinados supostamente por membros do crime organizado em represália por publicações do jornal que distribuíam.
Convido todos vocês a um minuto de silêncio em homenagem às vítimas, em solidariedade às suas famílias e como pedido aos governos para que esses crimes sejam solucionados.
Apesar dessa sensação de frustração que nos assola cada vez que um jornalista é abatido no exercício da sua profissão e da autocensura que essa violência cria, devemos também mencionar alguns aspectos positivos.
O mais importante é que a América Latina é a região do mundo onde se notou a maior queda na impunidade, segundo um relatório do Comitê de Proteção aos Jornalistas. É verdade! Há doze anos, quando iniciamos o nosso projeto, podíamos contar nos dedos os assassinos que tinham ido para a prisão. Hoje, entretanto, 82 pessoas estão cumprindo ou cumprirão suas penas na prisão.
Nesse sentido, entre as notícias mais importantes e que a SIP destacou, estão as seguintes: no Brasil, um tribunal do estado de Mato Grosso do Sul condenou o autor intelectual do assassinato do jornalista paraguaio Samuel Román, que já começou a cumprir pena de 17 anos e nove meses de prisão. O Brasil é o país com o maior número de condenados, 31 de um total de 15 casos.
Enquanto isso, na Argentina, a Suprema Corte de Justiça da província de Buenos Aires revogou a libertação dos assassinos do fotógrafo José Luiz Cabezas que tinham sido beneficiados em 2003 por uma lei que reduzia seus anos de prisão. Esperamos que essa sentença seja mantida e que os assassinos voltem para a prisão.
Outro fato positivo ocorreu no Peru onde, no início de outubro, a Sala Penal Nacional de Lima sentenciou a 15 e 17 anos de prisão dois militares peruanos por sua participação, como instigador e autor material no assassinato em 1988 do jornalista Hugo Bustíos Saavedra.
Em contrapartida, na Colômbia, lamentamos a libertação do autor material do assassinato de Orlando Sierra, ocorrido em 2002, cujo caso retomamos no ano passado no documentário “A Batalha do Silêncio”. O assassino cumpriu cinco dos 29 anos de prisão aos quais foi condenado. Foram utilizados vários recursos criminais previstos por lei, apesar de o Código Penal da Colômbia agravar as penas para assassinos de jornalistas.
Foi também importante a confirmação do projeto de lei sobre federalização dos crimes contra a liberdade de expressão no meu país, México. Por iniciativa do Poder Executivo, este projeto modificará o artigo 50 da Lei Orgânica do Poder Judiciário Federal para que a Procuradoria-Geral da República possa assumir os casos dos jornalistas que sejam agredidos por exercer sua profissão. Essa foi uma promessa feita pelo presidente Felipe Calderón, e podemos dizer que se for aprovada no Congresso isso significará a realização de um antigo desejo da SIP, já que pedimos essa medida desde 1997, inclusive solicitando que fosse tomada ao ex-presidente Ernesto Zedillo, depois das nossas investigações sobre os crimes, ainda impunes, em Baja California e Chihuahua, de Héctor Félix Miranda e Víctor Manuel Oropeza, respectivamente.
Como vocês se lembram, conversamos com o governo mexicano sobre esses dois casos através do sistema interamericano de direitos humanos, e apesar de termos realizado várias reuniões, ainda não obtivemos resultados concretos. Estamos aguardando, e esperamos que a nova administração aceite sua responsabilidade e cumpra as recomendações feitas pela Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) sobre a reabertura dos casos, a investigação sobre a possível negligência nos processos judiciais e a reparação dos dois casos.
Devemos ressaltar que iniciamos outro processo de resolução com o Brasil para o caso do jornalista Manuel Leal de Oliveira, assassinado em Itabuna em 1998. Para isso, nos reunimos há alguns dias em Washington, DC, na sede da CIDH, com representantes do governo do Brasil e chegamos a um acordo para a realização de vários encontros para o cumprimento das recomendações que esse órgão apresentou em dezembro passado no Brasil sobre esse caso. Os representantes se comprometeram a dar continuidade ao processo contra os autores intelectuais do crime.
Nesse mesmo sentido, estamos dando prosseguimento a um processo junto ao governo da Colômbia sobre o caso de Nelson Carvajal, assassinado em Pitalito, em 1998.
Quero destacar o trabalho dos jornalistas da Unidade de Resposta Rápida da SIP, que mesmo enfrentando possíveis situações de risco continuam fazendo seu trabalho, como é o caso de Diana Calderón. Tivemos de pedir ao governo colombiano que tomasse medidas de proteção para os investigadores por causa de ameaças contra eles.
Não posso deixar de mencionar que um dos projetos mais importantes deste ano foi a Conferência Hemisférica “Poder Judiciário, Imprensa e Impunidade”, que teve como anfitrião o nosso presidente Rafael Molina em Santo Domingo, sua cidade natal, em julho passado. Nessa ocasião, a SIP reuniu 24 magistrados, 12 deles presidentes de Cortes Supremas de Justiça das Américas.
Dessa reunião, da qual participaram também juízes, advogados, políticos, jornalistas e diretores de meios, nasceu uma Declaração de Princípios que apresenta precedentes importantes e que nos anima a continuar lutando por mecanismos e reformas legais como armas necessárias para combater a impunidade.
Para lutar contra a impunidade, foram discutidos na Conferência de forma positiva temas como a utilização de jurisdições especiais para os crimes contra a liberdade de expressão e contra os jornalistas ou a federalização, nos países pertinentes; aumento das penas; impedir a prescrição dos crimes; eliminar os benefícios de prisão; promover entre os poderes do estado o uso de instrumentos internacionais e interamericanos e, quando pertinente, recomendar a implementação de um novo modelo de processo penal. A Declaração, que considera a violência contra os administradores da justiça e os jornalistas, também foi importante para promover uma maior aproximação e conhecimento entre os participantes, assim como um entendimento mútuo e um diálogo sobre a cultura da legalidade e o valor da liberdade de expressão. Esta experiência de trabalhar com os juízes nos estimulou a dar continuidade à nossa própria estratégia para o período de 2008 – 2011, para o qual esperamos que a Fundação James L. e John S. Knight continue nos dando seu apoio, como o faz desde 1992. Aproveito, em nome da SIP e da Comissão que presido para agradecer ao presidente da Fundação, nosso amigo Alberto Ibargüen, por sua confiança e apoio ao nosso projeto.
Para este novo período que se iniciará em 2008, quero destacar que continuaremos aprofundando o nosso trabalho nas quatro grande áreas do projeto: defesa, investigação, promoção e treinamento. Enfatizaremos especialmente a cultura da legalidade para a qual fizemos reuniões, pelo menos no México, com ministros da Corte Suprema da Justiça, magistrados do Conselho da Magistratura e com acadêmicos.
Por último, quero agradecer aos membros da Comissão que presido, a todos aqueles que nos acompanharam nas atividades desse ano, e principalmente aos 384 jornais que mensalmente nos apóiam publicando a nossa campanha de anúncios que promove a participação do público geral e seus leitores, somando-os a essa luta.
Muito obrigado.