09 Maio 2013
Discurso do presidente da SIP Jaime Mantilla
Colegas, amigos, senhoras e senhores
É extremamente gratificante chegar pela terceira vez a esta bela cidade de Puebla, Puebla de los Ángeles, Patrimônio da Humanidade. Mais gratificante ainda é que esta reunião coincida com o 19o aniversário da Declaração de Chapultepec, adotada por governos, magistrados, tribunais e cidadãos de todos os países da América, como referência e guia para a defesa de um dos principais direitos humanos, o direito à livre expressão. O primeiro princípio deste documento afirma: Não existem pessoas nem sociedades livres sem liberdade de expressão e de imprensa. O seu exercício não é uma concessão das autoridades; é um direito inalienável do povo.
Este princípio gera os outros 9 que, firmados em 11 de março de 1994 no Castillo de Chapultepec, converteram-se em um símbolo das batalhas libertárias deste grande país.
Além disso, Puebla tem muita importância para a cultura e os jornais da América Latina: Por iniciativa da UNESCO, sob o auspício de várias empresas preocupadas com a cultura e com a colaboração de vários dos nossos jornais das Américas, no início dos anos 90 se desenvolveu o projeto Periolibros. Foi nesta cidade de Puebla que nos reunimos para armar esta iniciativa que, sem dúvida, teve um imenso impacto cultural no continente. Publicaram-se mais de 100 fascículos de narrativa dos melhores escritores e artes gráficas de renomados artistas de nossa América.
Uma parte importante de nossa visita, além dos seminários e debates que compartilhamos, será o nosso aprofundamento no imenso acervo cultural desta região preponderante da história mexicana. Sua história, suas lendas, e suas tradições nos guiarão nesta aventura.
Nesta que é a quinta ocasião deste século em que a SIP realiza sua Assembleia no México, podemos afirmar que, com mais de 70 anos de luta permanente na defesa e promoção da liberdade da imprensa, a organização se mantém firme, unida, cheia de grandes desafios, mas sobretudo com a capacidade de olhar o hemisfério com olhos críticos e livres que nos permitem mostrar ao mundo os grandes problemas que sofre a liberdade de expressão e de imprensa, além dos desafios que devemos vencer na defesa deste direito inalienável e fundamental para a existência da democracia.
Passaram-se cinco meses desde que nos reunimos em São Paulo. Um período em que se mobilizou um trabalho duro e intenso tanto em direção à parte externa como à parte interna de nossa organização.
No entanto, desejo começar com palavras que se concentram no país anfitrião e nos grandes problemas que o México vive para manter a livre expressão dos seus e defender a liberdade dos jornalistas e da imprensa como mecanismo básico de sustentação democrática. Infelizmente, o México é agora a nação com maiores problemas de violência contra os jornalistas no hemisfério ocidental.
Aqui nós trabalhamos pela segurança dos jornalistas, denunciando cada vez que perdemos um dos nossos. No último ano, sete colegas foram mortos pela violência e outros quatro sequestrados sem se conhecer seu paradeiro. Há poucos dias, lamentamos o assassinato de outro colega. Estes números, que se referem a seres humanos com nomes e sobrenomes, não são normais e não deveriam existir. A violência e a falta de monitoramento e punição por estes fatos, além da dor das vítimas e seus parentes, é o principal fator de indução da autocensura. Este tema é, há muitos anos, um assunto da maior importância para os membros da SIP.
Nossa organização é, sem dúvida, a instituição jornalística internacional que denuncia mais intensamente a impunidade e clama pela resolução destas ocorrências violentas. A SIP registrou a constância de seu trabalho em vários documentos tão importantes como as declarações de Tijuana em 2002, Hermosillo em 2005, Nuevo Laredo em 2006, México em 2008, Durango em 2010 e mais recentemente, a de Puebla em 2011. Declarações que tiveram entre suas táticas e propostas a federalização dos crimes contra os jornalistas, a proteção e assistência para as mídias e comunicadores em situações de risco; a urgência de incentivar o trabalho conjunto e a solidariedade entre a mídia e jornalistas para enfrentar a violência; a não prescrição dos crimes, o agravamento das penas para quem comete estes crimes e a criação de unidades especiais para investigar os assassinatos, entre outras sugestões.
Em 2004, realizamos uma conferência com a Corte Suprema de Justiça e efetuamos cerca de 20 missões internacionais ao país nos últimos 17 anos. Tivemos reuniões com os últimos três presidentes constitucionais em oito ocasiões, solicitando o seu comprometimento nesta luta e hoje repetimos esta convocação perante o presidente Enrique Peña Nieto.
Aplaudimos dois fatos de grande relevância ocorridos no ano passado: A reforma constitucional para a federalização dos crimes contra a liberdade de expressão e a sanção da lei para a proteção dos comunicadores. Confiamos que a efetiva e profunda aplicação destas duas medidas contribua para um combate intenso à violência.
O México é um exemplo de nossa luta e a SIP continuará monitorando o desenvolvimento das liberdades nesta grande nação de Juárez, Morelos e Hidalgo.
Tentarei resumir em poucas palavras as ações que, durante a minha presidência, realizamos neste curto período:
Em dezembro passado, cumprindo o compromisso assumido na Assembleia Geral de São Paulo, a SIP enviou uma missão internacional à Argentina onde encontrou obstáculos graves que atentam contra o livre exercício do jornalismo. A delegação permaneceu três dias em Buenos Aires e entrevistou quase cem personalidades vinculadas a diversos setores da sociedade. Ouviram-se denúncias de campanhas de descrédito desencadeadas pelos detentores do poder, discriminação na distribuição da publicidade oficial, aplicação seletiva da lei da mídia, desrespeito do Poder Executivo ao Poder Judiciário. Devemos tomar conhecimento e analisar o grave conflito entre o governo Cristina Kirschner e o Grupo Clarín, cujo destino no contexto da realidade argentina vai muito além dos interesses econômicos da empresa. Tem a ver com a própria vigência da liberdade de expressão e informação nesse país, como se apresenta atualmente ao se eliminar as programações de publicidades em várias empresas, nas mídias que não apoiam o governo Cristina Kirschner.
No início deste ano também visitamos Bogotá onde, com o apoio do diário El Tiempo, participamos de uma cerimônia muito interessante presidida pelo presidente da Colômbia, Juan Manuel Santos, quando mais de 50 governadores e prefeitos de tendências políticas diferentes assinaram a Declaração de Chapultepec. Esperamos que esta iniciativa, em continuação à que se realizou na Venezuela, se projete nos próximos meses e anos nos demais países da América para que se compreenda a importância da liberdade de expressão, imprensa e informação, como elemento de sustentação da democracia.
Como corolário deste importante evento, a SIP, com o apoio de El Tiempo, realizou a reunião O Estado da Liberdade da Imprensa na América Latina na Universidade dos Andes, em Bogotá. A excelente presença de professores e alunos, interessantíssimos diálogos entre o reitor da universidade Pablo Navas e os palestrantes Omar Rincón, Éteban Rétrepo Saldarriaga, Ricardo Ávila, Nora Sanín, entre outros, motivaram várias intervenções dos presentes. Quero dar um agradecimento especial ao Presidente Santos, ao Roberto Pombo e à Casa Editorial El Tiempo que proporcionou estas atividades necessárias e bem-sucedidas.
Em janeiro, a SIP também participou em Paris na reunião semestral do Comitê Coordenador de Organizações de Liberdade da Imprensa, cujo objetivo é unificar critérios, avaliar a situação da liberdade da imprensa e propor ações conjuntas em nível mundial.
Meses antes, participamos em uma reunião da ONU na Áustria, que elaborou um plano de ação mundial para garantir a segurança dos jornalistas e reduzir a impunidade.
Quero agora me referir à situação na OEA e aos perigos que a Relatoria de Liberdade de Expressão enfrenta.
Está programada para o próximo 22 de março uma reunião extraordinária da OEA para concluir o processo de reformas da Comissão Interamericana de Direitos Humanos. Nessa data, serão analisadas as propostas do chamado processo de fortalecimento do sistema interamericano de direitos humanos iniciado em 2012 pela OEA e comandado pela Venezuela e Equador, cujos governos pretendem enfraquecer e cercear a autonomia da entidade, em especial da Relatoria para a Liberdade de Expressão, por seus relatórios anuais que, principalmente e embora não somente nestes países, incomodaram os líderes em exercício. Nossos olhos e ações estarão voltados, como sempre aconteceu, para oferecer o nosso apoio à Relatoria.
Para reforçar a posição dos países da ALBA, o chanceler equatoriano Ricardo Patiño, convocou mais de 20 de seus colegas da América, em 8 de março em Guayaquil
..(A morte de Chávez pode mudar o programa
) Consideramos que a única forma de salvar o sistema interamericano do profundo corte das atribuições que possui a favor da liberdade, é pela ampla difusão do problema nos diários associados por meio de uma campanha imediata e abrangente para manter a Relatoria e a Comissão de Direitos Humanos sem cortes nem limitações nos seus procedimentos.
Colegas, amigos, senhoras e senhores
A SIP observa permanentemente a Venezuela, Argentina, Bolívia e Equador nesses últimos meses, devido a uma série de problemas que a imprensa destes países enfrenta pela liberdade. Já comentamos sobre a Argentina. No Equador, a atitude presidencial permanente contra a imprensa independente, a submissão da imprensa governamental como ferramenta de promoção e ataque a quem não pensa como o mandatário, a campanha eleitoral que primou pela publicidade e promoção do candidato-presidente em detrimento dos demais candidatos, criaram um ambiente péssimo para o livre exercício do jornalismo. Apesar do mandato legal e constitucional que obriga o governo e entidades que recebem fundos estatais a mostrar transparência em suas relações, não somente estas obrigações não são cumpridas como elas são abertamente ignoradas, a ponto de o presidente proibir seus ministros e principais executivos públicos de falar com a imprensa independente. Ao mesmo tempo, houve várias irregularidades na campanha em que o presidente Correa saiu vitorioso, fortaleceram a opção eleitoral pelo governo. Finalmente Correa alcançou 57% dos votos e 42% votos padrão, pois não são contabilizados os votos nulos e em branco que alcançaram 8% nem as ausências, que não têm números definitivos.
A SIP, como sempre, buscando o diálogo e o acordo, solicitou uma entrevista com o presidente reeleito para conversar sobre o futuro da liberdade de expressão no Equador. Até a elaboração deste informativo, não havíamos recebido nenhuma resposta à nossa proposta, o que confirma a aversão do governante ao diálogo e ao debate, bases vitais para a manutenção da liberdade de expressão, imprensa e informação. Em declarações sucintas aos meios governamentais e aos jornalistas estrangeiros, insistiu em sua ideia de terminar com as vozes dissidentes e as mídias que entregam suas análises e opiniões sem se ajustarem às visões do governo. Mais detalhes do que passa nesse país, poderão encontrar no relatório que o vice-presidente da Comissão de Liberdade da Imprensa para o Equador apresentou nesta reunião.
Neste informativo não se pode ignorar Cuba, onde continua o total desrespeito aos direitos à liberdade individual, de imprensa e de expressão, além das ações de repressão contra jornalistas independentes e opositores que, em 2012, se refletiram em mais de 1.800 detenções breves, segundo dados da Comissão Cubana de Direitos Humanos e Reconciliação Nacional. Esta Presidência decidiu procurar uma pessoa que, vivendo neste ambiente, pudesse nos representar e dar sua visão da realidade vivida na ilha. Contatamos Yoani Sánchez e, em diálogos curtos, ela aceitou ser a nossa vice-presidente regional. Damos as boas-vindas a ela.
A Comissão Cubana de Direitos Humanos denunciou ainda que, em janeiro deste ano, registraram-se pelo menos 364 prisões arbitrárias por motivos políticos, além de 504 em fevereiro; um aumento de atos de repúdio contra opositores, as ações de vandalismo contra as residências de dissidentes e inquietantes agressões físicas executadas por indivíduos desconhecidos vestidos como civis; tudo sob um verdadeiro manto de impunidade, tema que a vice-presidente regional para Cuba, que hoje nos acompanha, ilustrou com muitos detalhes e emoção.
Acho necessário mencionar rapidamente alguns temas internos. Nossa instituição, senhores delegados, mantém grande presença em todos os assuntos relacionados às liberdades e à livre expressão, especialmente. Não só no hemisfério, mas também em nível mundial. Tivemos que fazer alguns ajustes para continuar o apoio financeiro que estas funções precisam e quero agradecer do fundo do meu coração todos os jornais que responderam positivamente à nossa campanha de doação de espaço publicitário em prol da SIP. O montante de páginas arrecadadas até o mês passado, a comercializar em prol da organização, supera as expectativas e consideramos que este ano, mantendo uma forte campanha de promoção, superaremos um milhão de dólares em depósitos.
Aproveitando esta reunião, temos o prazer de entregar a vocês uma nova publicação da nossa Sociedade, um esforço importante do nosso Diretor Executivo, Julio Muñoz, que insistiu muito em levá-lo adiante. O livro pelos 70 anos da SIP: Oradores Convidados, que coleciona 64 intervenções magistrais dos principais oradores que participaram em nossas Assembleias neste período. Nas 296 páginas da obra, desfilam estadistas, prêmios Nobel, escritores, acadêmicos, empresários, historiadores e diplomatas. Incluem-se entre os políticos mais antigos Alberto Lleras Camargo, ex-presidente da Colômbia, fundador da OEA; o presidente John F Kennedy, em sua última apresentação pública antes de ser assassinado em Dallas em 1963; Henry Kissinger e Felipe González. Temos certeza de que esta contribuição da SIP terá um enorme valor transcendental na nossa América.
A administração da SIP desenvolve um projeto para modificar e dar muito mais valor ao sistema de conexão com os associados via redes sociais. Nesta reunião, apresentou-se o primeiro resultado para que os sócios possam participar mais ativamente dentro da organização. Seminários, biblioteca, diálogos, consultas, arquivos e demais mecanismos de união já estão prontos para um intercâmbio completo por meio da tecnologia. Esta solução nos permite, além disso, compartilhar nossos conhecimentos e história com jovens alunos, professores e cidadãos em geral. A SIP poderá ensinar ao mundo o seu trabalho de mais de 70 anos em defesa da liberdade.
O trabalho interno foi árduo em todas as comissões. Claudio Paolillo deu o tom e uma contribuição muito especial à importante Comissão de Liberdade da Imprensa e Informação, colocando em pauta uma das críticas que mais se escutava: a nossa desconexão com os jornalistas. Tenho certeza de que agora ninguém mais vai falar nisso. E, em outras comissões, o trabalho de María Elvira Domínguez na Comissão de Desenvolvimento Estratégico foi complexo, porém frutífero, e nos ajuda a ver o futuro com uma perspectiva muito melhor. Como María Elvira informou, a Comissão de Desenvolvimento Estratégico é possivelmente a comissão que realizou o maior número de reuniões, reflexões e propostas, para entrar totalmente na reforma estrutural de nossa organização e ajustá-la às demandas desta época.
Não posso deixar de mencionar o papel de Ed Seaton na Comissão de Assuntos Internacionais, de Jorge Canahuati em Chapultepec, de Miguel Henrique Otero em Arrecadação de Fundos, de Asdrúbal Aguijar em Assuntos Legais, de Francisco Miró Quéada em Prêmios. Todos eles lideraram as suas comissões com responsabilidade e trabalho constante.
É preciso que os demais encarregados de comissões, seus vice-presidentes e membros se empenhem mais profundamente no cumprimento das obrigações que aceitaram.
A administração da SIP, liderada por Julio Muñoz, foi um apoio importante para continuarmos nestes tempos de turbulência. Julio e sua equipe, apesar da ausência de Ricardo Trotti e de algumas baixas ocorridas, conseguiram otimizar seus trabalhos de modo muito positivo.
Tentei enfrentar positivamente a redução do apoio nos Estados Unidos e Canadá. Foram sugeridas algumas opções para criar serviços e contatos interessantes para os parceiros norte-americanos, permitindo que utilizem as ofertas da SIP para compreender e se projetarem na América Latina. Acho que a imprensa norte-americana e a sociedade deste grande país deverão em breve aprender a ver com mais atenção e paixão tudo que acontece ao sul de suas fronteiras. A SIP pode ser o mecanismo adequado para esse processo educacional. Estamos reunindo opiniões para poder orientar esta missão da melhor forma possível.
Com uma visão semelhante, embora diferente, achamos que devemos orientar nossos esforços para os parceiros no Brasil. A SIP deve se integrar e integrar de forma muito mais sólida aqueles meios de comunicação que representam possivelmente o maior espaço de difusão das liberdades em nosso hemisfério. O Brasil, os Estados Unidos e o Canadá são objetivos primordiais para o desenvolvimento e fortalecimento da SIP no hemisfério ocidental.
Senhor Presidente do México, senhores delegados. Puebla nos acolheu com grande amizade e delicadeza. Meu agradecimento ao Comitê Anfitrião presidido por Armando Prida e a todos os colegas mexicanos que sofreram na defesa das liberdades básicas da democracia. O trabalho da SIP continuará como o pilar vital para esta defesa. Para isso, contamos com o apoio de todos vocês.
Ao Sr. Presidente do México, lhe desejamos muito sucesso, permitindo a liberdade dos cidadãos, que lamentavelmente em alguns países da nossa América, aqueles que receberam o decisivo mandato cidadão tentam violar. A liberdade, Sr. Presidente, estimados colegas, se conquista e se defende com dedicação e esforço da cidadania, mas isso exige uma imprensa livre, plural e independente. É isso que defendemos.
Muito obrigado.